No texto Against Zionism—and Anti-Zionism Too (Contra o sionismo e também contra o antissionismo), publicado pelo portal The New Republic, Eric Alterman procura criticar as duas únicas posições possíveis diante da questão palestina: o sionismo e o antissionismo. Isto é, entre a defesa da existência da ocupação militar de “Israel” e a defesa de que “Israel” não deveria existir, Alterman procura apresentar uma tese “em cima do muro”, supostamente imparcial, que, obviamente, apenas serve para perpetuar a opressão dos sionistas sobre o povo palestino.
Para confundir aqueles que procuram tomar uma posição sobre a questão, o autor procura apresentar o sionismo como algo difuso, com múltiplos significados:
“A questão é muito mais complicada do que parece, e não apenas porque os judeus são famosos por terem mais opiniões do que judeus. É complicado porque sempre existiram, e ainda hoje existem, inúmeras espécies de grupos que se autodenominam “sionistas”. Existem sionistas religiosos, ultra-religiosos e antirreligiosos, e sionistas evangélicos (e subconjuntos significativos de cada um). Existe o sionismo político do tipo que levou à criação do Estado, e o sionismo puramente cultural que não tinha interesse na criação de um Estado. Há sionistas que dizem querer viver em paz lado a lado com palestinianos em estados separados; sionistas que querem partilhar a terra com os palestinos; e sionistas que querem expulsar todos os palestinianos, não só da Cisjordânia e de Gaza, mas também de Israel propriamente dito. Todas estas distinções tendem a perder-se nos nossos debates cada vez mais furiosos devido ao facto de que, ao debater a questão do ‘sionismo’ versus ‘antissionismo’, o instinto de ambos os lados é quase sempre o de demonizar uma definição e defender a outra.”
É um argumento verdadeiramente idiota. Poderíamos argumentar, também, que existem vários tipos de bolsonarismo. Existe o bolsonarismo que expressa o antipetismo dos setores mais reacionários da classe média, existe o bolsonarismo que é a expressão dos interesses de um setor das Forças Armadas, existe o bolsonarismo que é a reação sincera de setores da própria classe trabalhadora à política identitária e existe o bolsonarismo que é simplesmente a expressão da insatisfação social com o regime, contra quem o ex-presidente Jair Bolsonaro, ainda que de maneira demagógica, promete lutar. Se levássemos em conta o que diz o autor, não poderíamos nos opor ao bolsonarismo, pois há “muitos bolsonarismos”.
Acontece que, independentemente da forma como o sionismo e o bolsonarismo são interpretados pelas pessoas, há algo de objetivo em cada uma das ideologias. Assim como no caso do bolsonarismo, o sionismo é fundamentalmente a forma que assume a opressão de uma força social sobre outra.
O bolsonarismo, apesar de todas as suas contradições, é, em sua essência, um movimento da burguesia contra o conjunto da população brasileira. E o que prova isso é sua dependência: sem o apoio da burguesia, o bolsonarismo não é capaz de se sustentar. Foi a burguesia que promoveu o bolsonarismo para que o golpe de 2016 saísse vitorioso. Foi por meio da campanha da Rede Globo e do financiamento da FIESP que o bolsonarismo conseguiu se tornar uma força importante.
Há menos de dois anos, isso foi mais uma vez comprovado. Diante da popularidade do atual presidente Lula, diversos setores da classe dominante se mobilizaram para viabilizar a vitória eleitoral de Bolsonaro em 2022, que acabou sendo derrotada pela ampla mobilização popular.
Com o sionismo, não é diferente. Pouco tem importância se alguém ache que os judeus merecem um Estado na Palestina, mas que esse Estado deveria viver em harmonia com os árabes. Pouco importa se alguém é sionista por questões religiosas. O que importa é que o sionismo, no sentido da defesa de que os judeus tenham um Estado próprio, é a expressão da necessidade do imperialismo de estabelecer um enclave militar no Oriente Médio. O sionismo é, portanto, a defesa de que, em nome de uma suposta pregação religiosa, um povo seja submetido a um apartheid social e a uma ocupação militar.
Colocado nesses termos, não há porque levar em consideração qualquer contradição entre os defensores do sionismo. Em essência, o sionismo é uma ideologia colonialista e pró-imperialista – e, portanto, deve ser combatida de maneira implacável.