Durante a Revolução Palestina de 1936, o imperialismo britânico, utilizando-se tanto de seu exército quando das milícias fascistas do sionismo, desmantelou toda a organização que o povo palestino havia criado para lutar contra o domínio dos ingleses e a invasão dos sionistas. Essa repressão de tipo fascista foi fundamental para a Nakba e para a fundação de “Israel”. Foi tão profunda que o povo palestino só conseguiu se reorganizar para resistir ao sionismo em 1959 (após anos de luta), com a fundação do Fatá.
Inicialmente, a Liga Árabe criou a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), uma coalizão de organizações, com a finalidade de arrefecer os ânimos na região. Contudo, com a Batalha de Caramé, quando guerrilheiros palestinos liderados por Yasser Arafat repeliram ataque israelense às posições do Fatá na Jordânia, o partido e seu líder passaram a encabeçar a resistência palestina, assumindo inclusive o comando da OLP. Arafat substituiu Ahmad Shukeiri em 1969. Sobre esse evento histórico, releia a matéria abaixo:
A Batalha de Caramé, quando o Fatá se torna um partido de massas
Ante o crescimento da resistência palestina, centrado em Arafat, no Fatá e em sua liderança sobre a OLP, o imperialismo então resolveu utilizar-se da monarquia jordaniana para destruir a resistência palestina, pois era uma ameaça direta a “Israel” e, consequentemente, ao controle imperialista sobre o Oriente Médio.
Para além da repressão específica à resistência palestina, a conjuntura geral era a da chamada “Guerra Fria Árabe”, uma época de conflito entre países árabes que durou entre 1952 e 1979, como parte da Guerra Fria. O nome serve para encobrir a realidade: afinal o conflito era basicamente o imperialismo impulsionando países árabes como a Jordânia, o Marrocos e a Arábia Saudita para combater o nacionalismo árabe, em especial o do Egito de Nasser, o palestino, o argelino e o iraniano.
Nessa conjuntura, em março de 1969, Hussein bin Talal, o então rei da Jordânia, visitou Richard Nixon, presidente dos EUA, para conversar a respeito da Resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU, com a finalidade de convencer “Israel” a aderir a ela. O objetivo era a devolução dos territórios ocupados pelo Estado sionista após a Guerra dos Seis Dias, em troca de uma paz formal. Na realidade, tratava-se de uma manobra para combater o crescimento da resistência palestina no território jordaniano, que ameaçava a monarquia reacionária, serviçal do imperialismo. Este objetivo foi inclusive declarado expresso pelo governo norte-americano, segundo o qual Hussein teria condições de liquidar os guerrilheiros palestinos em seu país uma vez que o conflito resultante da Guerra dos Seis Dias fosse resolvido em definitivo (Salibi, Kamal (15 December 1998). The Modern History of Jordan. p. 232. I.B. Tauris. ISBN 978-1-86064).
Em face disto, a Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP) e a Frente Democrática para a Libertação da Palestina (FDPLP) passaram a se opor à monarquia jordaniana, questionando sua legitimidade e clamando por sua derrubada. Em seu lugar, deveria ser erguido um governo revolucionário. Outras organizações também denunciaram a monarquia como serviçal do imperialismo, reacionária e ferramenta do sionismo: o As-Sa’iqa do Ba’ath sírio e a Frente de Libertação Árabe do Ba’ath iraquiano (Shlaim, Avi (2008). Lion of Jordan: The Life of King Hussein in War and Peace. p. 312. Vintage Books. ISBN 978-1-4000-7828-8.). O Fatá não endossou a posição das organizações palestinas de intervir no regime político de outros países árabes, mas, mesmo estando no comando da OLP, não pôde controlar as demais organizações, dada a falta de centralização.
Antes de pedir auxílio direto ao imperialismo e ao sionismo, a monarquia jordaniana tentou conter o crescimento da resistência palestina de várias formas. Uma das táticas utilizadas foi infiltrar pessoas nos movimentos guerrilheiros para realizar ações contra a população jordaniana, de forma a jogá-la contra as organizações da resistência. Contudo, isto não funcionou.
Em 1970, tentou por meio de leis retirar o poder militar das organizações, através do chamado Édito de Dez Pontos. Através dele, tentou restringir a atividade revolucionária da resistência, proibindo seus militantes de portar armas publicamente, armazenar munições nas aldeias e realizar manifestações e reuniões sem consentimento prévio do governo (Shlaim 2008 , pág. 313.). Não funcionou, ante a resistência dos grupos palestinos.
Então, no mês de fevereiro, o rei Hussein enviou mensagem a “Israel”, através da embaixada dos EUA em Telavive. A resposta do Estado sionista foi de que não atacaria a Jordânia se as tropas da monarquia fossem realocadas para reprimir os guerrilheiros palestinos.
Contudo, à medida que os meses se passavam, as organizações da resistência palestina seguiam crescendo e realizando ataques contra “Israel” a partir da Jordânia, o que levava o Estado sionista a atacar de volta, e a monarquia jordaniana a tentar acabar com a resistência.
O ápice do conflito foi no mês de setembro de 1970. Embora tenha se iniciado no dia 6 e durado até julho de 1971, a fase principal foi entre 16 e 27 de setembro de 1970.
A força da resistência era tamanha que as organizações palestinas chegaram a convocar greve geral contra a monarquia haxemita, assim como campanha de desobediência civil. Contudo, o estopim para a repressão generalizada, que resultou na expulsão da OLP, foi uma série de sequestros de aviões, realizados pela FPLP. Quanto isto ocorreu, o rei Hussein instituiu lei marcial, dando poderes irrestritos ao coronel paquistanês Muhammad Zia-ul-Haq para reprimir os guerrilheiros palestinos.
Nesses 11 dias nos quais duraram a fase principal do conflito, estima-se um número de mortos de 10 a 25 mil palestinos.
Dada a brutal repressão, realizada com o apoio do imperialismo e de “Israel”, as organizações palestinas, colocadas na defensiva, são forçadas a assinar um acordo de paz, mediado pelo governo de Egito, ainda sob o líder nacionalista Nasser. O acordo foi assinado no dia 27 de setembro.
Contudo, Nasser morre no dia seguinte, em 28 de setembro, de forma que a OLP perde o apoio fundamental que permitia às organizações palestinas permanecerem na Jordânia sem serem desmanteladas. Assim, Hussein, o rei jordaniano, lacaio do imperialismo, aproveita para mudar os termos do acordo: ordena que as organizações da OLP e todos os guerrilheiros palestinos entreguem suas armas. A FPLP e a FDLP se recusam, ao que um toque de recolher é instituído pelo governo. Em janeiro de 1971, o exército descobre um estoque de armas ilegais.
Vendo a inevitabilidade da repressão, em 5 de junho, as organizações palestinas, inclusive o Fatá, fazem um apelo à população, através da Rádio Bagdá, para a derrubada da monarquia jordaniana. Contudo, era tarde demais. O exército já havia controlado a maior parte das cidades, tomando as posições necessárias para desatar o golpe final contra as últimas posições da OLP na Jordânia – as cidades de Gérasa e Ajloun.
Assim, em 17 de junho, a resistência palestina é expulsa para o Líbano.
Contudo, o imperialismo e “Israel” não desistiriam de perseguir e tentar destruir a OLP. Com isso, em 1975, utilizaram de milícias fascistas de cristãos maronitas para desmantelar a resistência palestina, de uma vez por todas. Releia matérias já publicadas neste Diário, sobre acontecimentos da Guerra Civil do Líbano:
3 mil palestinos assassinados no horrendo Massacre de Tal Zaata
Ou seja, em resumo, Setembro Negro foi este período que se estendeu de setembro de 1970 a julho de 1971, durante o qual a Jordânia, com apoio do sionismo e do imperialismo, entrou em confronto com as organizações guerrilheiras da OLP, visando expulsá-las do país.