O portal Esquerda.net, no texto Uma cimeira dos BRICS na Rússia que não constitui alternativa, afirma que “não seria de esperar que, de um aglomerado de países totalmente dominados pela lógica capitalista (ainda que em diferentes graus), incluindo uma maioria de governos que reprimem os seus povos, emergisse uma alternativa favorável aos povos. O resultado da leitura integral da declaração final é concludente: mesmo ao nível das palavras usadas não encontramos verdadeiras diferenças em relação aos discursos, às declarações das principais potências imperialistas tradicionais e das instituições por elas dominadas. Se, além disso, nos dermos ao trabalho de analisar a política concreta dos BRICS, temos de concluir que para promover uma alternativa favorável à emancipação dos povos, para reforçar a luta contra as diversas formas de opressão e para defrontar a crise ecológica, não podemos contar com a ajuda e a ação dos BRICS”.
Ainda que a política da esquerda revolucionária seja a de mobilizar os trabalhadores, e não propriamente a política levada adiante pelos países dos BRICS, afirmar que o bloco seja reacionário é, no mínimo, um exagero. A tese inicial de que o bloco seria reacionário porque seus países são capitalistas é verdadeiramente idiota.
A luta dos países atrasados contra o imperialismo não precisa ser socialista para ser progressista. Qualquer avanço dos países oprimidos, sejam capitalistas ou não, é uma vitória dos trabalhadores. A Rússia capitalista, por exemplo, ao derrotar a OTAN está sendo muito mais progressista que a burocracia soviética na maior parte de sua existência.
O que importa é a luta de classes. Se a burguesia da Rússia e da China estão derrotando a burguesia imperialista, isso é uma vitória para todos os povos do mundo, pois todos são oprimidos pelo imperialismo. A luta de classes não é feita apenas de revoluções operárias.
O autor então afirma que “os BRICS não emitem nenhuma crítica em relação às políticas neoliberais impostas pelo FMI aos países que recorrem aos seus créditos. Não exigem ao Banco Mundial nenhuma mudança e contentam-se em dizer a seu propósito: ‘Aguardamos a Revisão da Participação Acionária de 2025 do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) 2025’.” Essa tese é ridícula, pois os BRICS estão criando o seu próprio banco, o BND, que será uma alternativa ao FMI. O autor critica muito o BND, mas não há como afirmar que ele não é uma alternativa que surge em oposição ao FMI.
O texto segue falando do clima: “sendo certo que as COP não produzem resultados convincentes, e as suas resoluções mais recentes foram caricatas, os BRICS estão muito próximos das grandes potências industriais imperialistas tradicionais, recusando-se a reconhecer que as políticas adotadas até agora não deram respostas à altura para as questões em jogo”. Aqui o ator não compreende que a política ambientalista do imperialismo é um ataque aos países atrasados. O Brasil, por exemplo, não pode explorar o petróleo da Margem Equatorial. Enquanto isso, a Exxon Mobil está na Guiana lucrando bilhões com petróleo extraído da mesma região. Quando os países atrasados se desenvolvem economicamente, isso é uma derrota do imperialismo e uma vitória dos trabalhadores. Quanto mais a classe operária tiver o controle sobre a economia, também menor será esse dano ao meio ambiente.
Passemos então à tese absurda de que os BRICS são sionistas, algo que este Diário já respondeu em outro artigo. “Os BRICS não decretam uma rutura ou uma suspensão das relações comerciais e dos tratados de cooperação com Israel. Pior ainda, como assinalaram Patrick Bond e outros autores, os BRICS continuam a fornecer petróleo, gás, carvão, indispensáveis àquele país para prosseguir o seu esforço de guerra”. Em primeiro lugar, manter relações econômicas com um país não significa apoiar o país, basta ver o caso EUA e Venezuela. Em segundo lugar, Hamas está cada vez mais próximo da Rússia, recentemente até abriu uma sede no país. O Irã, o nêmesis de “Israel”, está nos BRICS. A China está levando adiante o esforço diplomático que fortalecerá o Hamas na Cisjordânia. É ridículo considerar isso menos relevante do que relações comerciais.
O texto então chega na ideia absurda de que uma organização liderada pela Rússia deveria condenar a Rússia: “no ponto 36 os BRICS não condenam a invasão da Ucrânia pela Rússia. Escrevem eles: ‘Relembramos as posições nacionais relativas à situação na Ucrânia e em seus arredores, conforme expressas nos fóruns apropriados, incluindo o [Conselho de Segurança das Nações Unidas] e a [Assembleia Geral das Nações Unidas]. […] Observamos com apreço as propostas relevantes de mediação e bons ofícios, visando a uma resolução pacífica do conflito por meio do diálogo e da diplomacia’”.
Esse é mais um ponto chave. Um dos aspectos mais progressistas dos BRICS é que eles ignoram completamente o bloqueio político realizado pelo imperialismo. A guerra da OTAN contra a Rússia tentou isolar o país do mundo, mas a maior parte das nações oprimidas ignorou essa ofensiva e fortalece cada vez mais relações com os russos. Isso vale também para o Irã, estes são o primeiro e o segundo país com mais sanções econômicas no planeta.
Para concluir, o autor ataca o Novo Banco de Desenvolvimento porque atualmente ela ainda faz empréstimos principalmente em dólares. E afirma que “na declaração final da 16.ª cimeira dos BRICS, publicada em 23/10/2024, não encontramos nenhuma referência à criação de uma moeda comum. Estamos perante um importante passo atrás”. Essa ideia também é uma farsa. Até o Brasil, que atualmente está com uma das piores políticas externas dentro dos BRICS, mantém a defesa da moeda comum. A questão é que não seria uma moeda como o Euro, para uso cotidiano, mas sim uma forma de grandes transações internacionais sem o dólar. Esse é o grande plano dos BRICS e o texto o desconsidera completamente.
O que acontece é que o imperialismo ataca a Rússia, a China e o Irã e a esquerda pequeno-burguesa, principalmente na Europa, capitula diante dessa campanha. Fosse a Cúpula dos BRICS na década de 1970, toda a esquerda portuguesa estaria exaltando o evento. É uma política totalmente pró-imperialista. Os países oprimidos do mundo se aliam e a esquerda se coloca contra.