Muito interessante ver que um setor do empresariado decidiu apoiar o chamado movimento VAT (Vida Além do Trabalho), cuja PEC na Câmara dos Deputados é da deputada do PSOL, Erika Hilton.
No sítio Poder 360, o jornalista José Paulo Kupfer, que já foi colunista de economia do Estado de S. Paulo, defende a proposta, apesar de pedir que se vá Devagar com o andor.
Ele começa o texto dizendo que “Está mais do que na hora de modernizar a jornada de trabalho básica no Brasil. O regime 6×1, de 6 dias trabalhados por 1 de descanso, já é parte da história das relações de trabalho em número crescente de países”.
Segundo, ele, seria importante que o Brasil imitasse alguns países que já aboliram o regime de 6 por 1, desde que seja algo “gradual e flexível”: “Seria sensato tanto promover uma redução da jornada básica de trabalho quanto fazer a reforma de um modo gradual e flexível”. “A implantação de um novo regime de trabalho, com as devidas adaptações, deveria ser feita, gradualmente, ao longo de um período de tempo, levando em consideração as especificidades de cada tipo de atividade e permitindo as correções que se mostrassem necessárias”.
Os elogios ao movimento VAT estiveram também nos principais órgãos da imprensa capitalista: Folha de S. Paulo, O Globo, Exame, Época Negócios. O que faz um grupo de capitalistas, cujo principal função é extrair o sangue do trabalhador até a última gota, decidir apoiar uma medida que aparentemente diminuiria o tempo de trabalho?
A resposta não é tão difícil de se encontrar. A questão é que justamente não se trata de uma verdadeira redução da jornada o projeto apresentado na Câmara.
Para José Paulo Kupfer, o projeto deve ir devagar, mas deve ser aprovado. Ele critica os capitalistas que estão contra o projeto, dizendo que são “terrorismo econômico’:
“Assim como as críticas mais radicais ao projeto de redução de jornada, projetando uma desestruturação no mercado de trabalho e na economia, não passam de terrorismo econômico, os cenários idílicos de expansão dos negócios e da atividade, a partir da melhora no bem-estar pessoal dos trabalhadores, cheiram ao mais primário voluntarismo.”
O texto do Poder 360 nos dá a clara imprensa de que o jornalista, conceituado entre um setor empresarial, tenta convencer os capitalistas que ainda não entenderam os benefícios da PEC. Benefícios para os próprios capitalistas, está claro.
Acontece que a PEC apresentada no Congresso não é realmente um redução da jornada. Trata-se de um engodo, uma enganação para colocar uma parte da esquerda a reboque de uma proposta empresarial. Como explica Rui Costa Pimenta, em seu artigo Contra a escala 6×1, sim; movimento VAT e seu projeto, não.
“O movimento VAT é uma importação, responde a uma organização chamada 4dayweek Global, uma ONG empresarial imperialista que propaga a ideia da semana 4×3.
“A proposta de 4×3 [que é o que está exposto na PEC] não é uma verdadeira proposta de redução da jornada, mas uma proposta de flexibilização da jornada, ou seja, é pior que a escala 6×1. Por isso, o projeto apresentado, que sequer faz sentido, uma vez que a sua semana 4×3 levaria a 32 horas quando o projeto propõe 36 horas, não fala dos salários e do final de semana livre.”
Essa proposta atende às necessidades de uma boa parte de grandes empresas que tem uma demanda irregular de produção. Por exemplo, produzem muito mais em determinado período do ano que em outro. Assim, se houver uma flexibilização na contratação dos funcionários, esses empresários podem aumentar a carga de trabalho num período, fazer horas extras etc quando a demanda for maior e dar “folgas” ao trabalhador quando a produção cair. Na prática, o trabalhador fica totalmente a mercê do que bem entender o patrão.
Não há de fato uma diminuição da jornada, reivindicação das mais tradicionais do movimento operária, mas uma flexibilização das relações de trabalho que permite, inclusive, que o trabalhador trabalhe ainda mais e conforme as necessidades do patrão. Isso sem contar que não há nada no projeto que garanta a não redução salarial.
É por essa e outras que o colunista do Poder 360 parece dedicar-se a convencer aqueles empresários que ainda não querem aceitar a PEC. Por isso ele quer que as coisas vão devagar, para os empresários poderem se adaptar às novidades, ao que poderíamos chamar de incremento da reforma trabalhista de Temer.
Difícil saber se a maior parte dos capitalistas vão aceitar o projeto que está na Câmara. Mas uma parte, ligada ao imperialismo, está lutando para flexibilizar ainda mais as relações de trabalho, já tão sucateadas.
Contra isso, só mesmo a defesa de uma redução da jornada para 35 horas semanais, sem redução salarial, e que o trabalhador tenha direita ao final de semana livre. E isso é para já!