Uma das estratégias do Hamas com o lançamento da Operação Dilúvio de al-Aqsa no dia 7 de outubro de 2023 foi a de fazer prisioneiros israelenses para trocá-los pela libertação dos prisioneiros palestinos. Foram mais de 200 prisioneiros e até agora o primeiro acordo de trégua libertou mais de 300 dos 11 mil palestinos que estão atualmente nas masmorras de “Israel”. Essa estratégia não surgiu do nada, ela é inspirada em uma das maiores vitórias do Hamas, uma ação que desmoralizou tanto o sionismo que a extrema direita atual se recusa a repeti-la, o caso do soldado Gilad Shalit que foi trocado pela libertação de 1027 palestinos em 2011.
Em 9 de junho de 2006, “Israel” bombardeou usando sua marinha que bloqueia a Faixa de Gaza uma praia perto de Beit Lahia e matou oito palestinos. Pelo menos trinta outras pessoas ficaram feridas. O massacre ficou registrado em um vídeo que mostra Huda Ghalia, uma angustiada menina de onze anos que acabou de testemunhar a morte de seus parentes. As imagens de Ghalia se espalharam por todo o mundo e geraram uma enorme revolta, principalmente na própria Palestina.
No dia seguinte, os sequestradores de Shalit divulgaram uma declaração, oferecendo informações sobre Shalit se Israel concordasse em libertar todas as prisioneiras palestinas e todos os prisioneiros palestinos menores de 18 anos. A declaração foi emitida pelas Brigadas Izz ad-Din al-Qassam, pelos Comitês de Resistência Popular (que incluem membros do Fatá, Jiade Islâmica e Hamas) e por um grupo até então desconhecido chamado Exército do Islã.
No dia 25 de junho de 2006, Gilad Shalit, então um soldado israelense de 19 anos, foi capturado por combatentes das brigadas al-Qassam, braço armado do Hamas durante um ataque saindo da Faixa de Gaza. Os combatentes utilizaram um túnel próximo a Kerem Shalom e atacaram uma posição do exército israelense. Dois soldados israelenses foram mortos, outros dois, além de Shalit, ficaram feridos. Dois combatentes palestinos também foram mortos. Shalit sofreu uma fratura na mão esquerda e uma ferida leve no ombro. Os militantes o capturaram e o levaram através de um túnel para Gaza.
Foi uma das primeiras atividades mais desenvolvidas do Hamas, que havia conquistado a libertação do território de Gaza no ano de 2005 com a retirada dos colonos e das tropas israelenses. Essa vitória permitiu que as forças armadas do partido palestino se tornassem cada vez mais armadas e profissionais.
Shalit foi o primeiro soldado israelense capturado por palestinos desde Nachshon Wachsman, em 1994. Sua captura inspirou o Hesbolá também a atacar “Israel” e capturar os soldados Ehud Goldwasser e Eldad Regev no Líbano no mês de julho. Isso foi um dos principais eventos da guerra de julho em que o Hesbolá derrotou “Israel” pela segunda vez. Esta, entretanto, apesar de sempre uma boa memória, é assunto para outro artigo.
Assim como em 2023, o Estado de “Israel” foi incapaz de resgatar seu soldado. As forças israelenses invadiram a Faixa de Gaza em 28 de junho de 2006, a libertação de Shalit era um dos objetivos oficiais da operação “Chuvas de Verão”. De acordo com um porta-voz da embaixada israelense, “Israel fez tudo o que pôde, esgotando todas as opções diplomáticas, e deu a Mahmoud Abbas a oportunidade de devolver o israelense sequestrado… Esta operação pode ser encerrada imediatamente, condicionada à libertação de Gilad Shalit”. O interessante é que Abbas é um membro do Fatá e não do Hamas, portanto não tinha relação com o caso.
Em 29 de junho, o comandante do Comando Sul de “Israel”, Aluf Yoav Galant, confirmou que Shalit ainda estava em Gaza. O Ministro da Justiça de Israel, Haim Ramon, acrescentou que Shalit estava sendo mantido no sul de Gaza, especificamente. O governo israelense foi incapaz de localizar seu soldado e após pouco tempo desistiu de resgatá-lo por meio de uma invasão militar.
O sodado sionista Shalit foi mantido em cativeiro na Faixa de Gaza pelo Hamas durante mais de cinco anos. Houve diversas tentativas de negociação para sua libertação, mas elas só se desenvolveram de fato no ano de 2011. Em outubro, um acordo foi costurado entre “Israel” e o Hamas, mediado pelo governo do Egito. No dia 18 de outubro, Gilad Shalit foi liberto e repatriado para “Israel”. Apesar de gerar grandes comemorações no Estado sionista, o caso foi uma vitória muito maior para os palestinos que conseguiram trocar um único refém por mais de mil pessoas.
A libertação dos prisioneiros palestinos em 2023 é semelhante ao que houve no ano de 2011. Foi uma enorme vitória da resistência que deu uma popularidade ainda maior para o Hamas. Nem a imprensa imperialista pode esconder a vitória do Hamas. Um artigo do The Guardian da época afirmou: “o Hamas transformou a celebração na Faixa de Gaza em uma demonstração de força para o movimento militante, com milhares erguendo bandeiras verdes do Hamas e um número menor levantando as bandeiras do movimento rival Fatá. Em um comício na cidade de Gaza, com a presença de cerca de 300 dos ex-prisioneiros, o primeiro-ministro do Hamas, Ismail Hanié, elogiou aqueles que capturaram Shalit e ‘iniciaram este momento histórico para o povo palestino. Nossas forças são sempre vitoriosas’, disse ele. ‘Nunca seremos derrotados, nunca seremos quebrados’. Na Cisjordânia, o presidente palestino Mahmoud Abbas dirigiu-se a uma multidão de vários milhares, incluindo prisioneiros libertados e seus familiares.”
Aqui está claro o motivo da política da extrema direita de evitar a qualquer custo a troca de prisioneiros. A vitória dos palestinos em 2011 foi tão grande que permitiu até comícios do Fatá, que não estava envolvido com o caso. Nos dias de hoje, em que esse partido se desmoralizou e o Hamas cresce cada vez mais, toda vitória, toda libertação de prisioneiros será um fortalecimento do Hamas. E um fortalecimento na Cisjordânia, a principal base de atuação da extrema direita sionista.