No texto A CRISE VENEZUELANA EXPÕE A ESQUERDA DEMOCRATIZANTE, o grupo Tribuna Classista afirma, a respeito da situação política na Venezuela, que “a abordagem política de uma esquerda operária e socialista deve partir da denúncia e rejeição de todo o processo eleitoral e da defesa da estruturação independente dos trabalhadores em oposição às duas variantes reacionárias em conflito”. Ou seja, que Nicolás Maduro e o chavismo seriam reacionário e, portanto, não deveriam ser apoiados, da mesma forma como Joe Biden o imperialismo são reacionários e não devem ser apoiado.
O que o grupo ignora, no entanto, é que nada é mais reacionário que o imperialismo. Se o imperialismo se choca com qualquer setor, é obrigação da esquerda revolucionária apoiar esse setor contra o imperialismo. O revolucionário Leon Trótski já usou de exemplo uma possível intervenção da Inglaterra contra a ditadura fascista de Vargas na década de 1940. Nesse caso, Vargas era reacionário, mas nada era mais reacionário que a Inglaterra. Portanto, o correto era apoiar Varga contra o imperialismo inglês.
Há muitos outros casos. Um deles é bem parecido, a guerra das Malvinas. A ditadura fascista da Argentina contra o imperialismo inglês. O correto era apoiar a Argentina e, inclusive, essa foi a posição de grande parte da esquerda argentina acertadamente. Há o caso de Sadam Hussein, o homem que havia assumido o papel da contrarrevolução contra o Irã na década de 1980. Quando os EUA invadiram o Iraque, era necessário apoiar o governo Sadam contra o imperialismo. Resumindo, a tese dos dois lados reacionários é falsa, nada é mais reacionário que o imperialismo.
O texto segue: “como aponta a declaração do PO, é necessário rejeitar ‘a repressão e a fraude, as manobras golpistas e auto-golpistas e todo o tipo de sanções econômicas e ingerências imperialistas. A defesa da questão nacional, crucial para a Venezuela, não passa pela defesa do governo Maduro, mas sim pela implementação de um verdadeiro plano econômico nas mãos de um governo operário que utilize os recursos energéticos como alavanca para a industrialização do país. A palavra de ordem do momento é a organização independente dos trabalhadores’”.
Aqui, aparece o grande problema da tese dos “dois lados reacionários”. Isso porque é preciso, sim, apoiar Maduro contra os EUA. Mesmo que Maduro tivesse fraudado as eleições, ou dado um autogolpe, isso seria irrelevante. Como descrito acima, há casos em que o país invadido tem um ditador violento, mas isso não muda o caráter de classe. O regime que o imperialismo imporá na Venezuela caso derrube Maduro é muito pior do que o que existe atualmente.
Além disso, é nessa luta contra o golpismo que a esquerda revolucionária se fortalece. O partido operário deve sempre ter uma organização operária, mas isso não se opõe ter uma frente de ação com outros setores. Segundo essa linha, um partido operário na Palestina não poderia fazer frente com o Hamas, pois é um partido islâmico. A “independência” que o grupo cita é, na verdade, uma oposição a qualquer grupo que ele não considera “revolucionário operário”.
Vejamos o caso mais importante, o da Revolução Russa. Os bolcheviques se tornaram o partido mais popular do país derrotando o golpe de Cornilove contra o governo de Querensqui. Ao fazer uma frente única contra o golpe, eles deixaram de ser revolucionários? Claro que não. Pelo contrário, eles mostram as massas que eles eram o verdadeiro partido da revolução. Não adiantaria falar em “nem Cornilove e nem Querensqui”. Caso tivessem feito isso, o golpe teria sido vitorioso e rapidamente eles descobririam que o governo Cornilove era muito pior do que o governo provisório.
A continuação do argumento mostra como ele é incorreto: “a esquerda, à sua maneira e à sua escala, contribuiu para que os trabalhadores e o povo venezuelano se tornassem prisioneiros de uma polarização reacionária. É necessário lembrar que algumas das forças que hoje estão no campo ‘democrático’ do imperialismo foram no passado defensores fervorosos da experiência chavista”. A polarização não é reacionária. Ela é um fenômeno material, que surge nos momentos de grande luta. O momento da mais ampla polarização é o momento da revolução.
O fato da polarização surgir entre o chavismo e o imperialismo, na verdade, é uma demonstração de que ele não é um fenômeno reacionário. O chavismo não é o marxismo, é uma variante do nacionalismo, e, portanto, tem um potencial revolucionário ao mesmo tempo que tem limites. Mas, de forma geral, é progressista no que tange a sua luta contra o imperialismo. Falar que Maduro é reacionário na atual conjuntura mundial é ridículo. É o único governo da América do Sul que mantém uma política de esquerda, que tem a política de união dos povos oprimidos contra o imperialismo.