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José Álvaro Cardoso

Graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina, mestre em Economia Rural pela Universidade Federal da Paraíba e Doutor em Ciências Humanas pela UFSC. Trabalha no DIEESE.

Coluna

Petrobrás e o melhor negócio do mundo

"O imperialismo norte-americano, talvez como poucos, tem consciência que para desorganizar um país é fundamental atacar os alicerces de sua economia"

O imperialismo norte-americano, talvez como poucos, tem consciência que para desorganizar um país é fundamental atacar os alicerces de sua economia. Quando, há quase uma década, a Operação Lava Jato colocou na cadeia, Marcelo Odebrecht (em meados de 2015) e outros empresários importantes no país, tornou-se evidente que o imperialismo estava por detrás do golpe de Estado no Brasil. Afinal, somente uma força desse tipo poderia encarcerar, de forma completamente ilegal, representantes de um setor da burguesia nacional extremamente poderoso e bem-sucedido economicamente. 

Um dos mais fortes indicadores da condução dos EUA do processo golpista no Brasil foram justamente as primeiras ações do governo de Michel Temer, que assumiu em 31 de agosto de 2016. Esse governo tratou, por exemplo, de desmontar rapidamente a Lei de Partilha, que tinha sido aprovada em 2010, após o anúncio da descoberta das reservas do pré-sal. O objetivo central da lei era justamente reter uma parcela maior da renda petrolífera, no Brasil. Uma lei dessas, teria quer imediatamente retirada de circulação. Esse interesse em liquidar uma legislação que trazia aspectos como exigência de conteúdo nacional nas compras de equipamentos por parte da Petrobrás e a exigência de que somente a Petrobrás poderia operar nos poços do pré-sal, desnudava a verdadeira natureza do processo golpista. Como é conhecido, do ponto de vista econômico, o principal interesse do golpe foram as imensas reservas contidas no pré-sal. 

Recentemente assumiu a presidência da Petrobrás, Magda Cambriard, que, segundo consta, defende posição mais desenvolvimentista e nacionalista em relação ao petróleo e ao papel da Petrobrás, do que o seu antecessor. Pelas suas primeiras entrevistas, como presidente da companhia mostrou-se bastante preocupada com a urgência de o Brasil ter segurança energética e se desenvolver, problemas em relação aos quais a Petrobrás exerce um papel essencial. 

Em sua primeira coletiva de imprensa como presidente da Petrobrás, Magda Chambriard defendeu fortemente o esforço exploratório de petróleo e gás para garantir a soberania energética do país. A executiva foi incisiva na necessidade de a Petrobrás repor as reservas, para escapar do risco de o país voltar a ser importador de petróleo. Isso porque, o fato de o país dispor do pré-sal, que atualmente supre mais de 70% das necessidades nacionais de petróleo, não garante o eterno fornecimento. A empresa precisará continuar realizando seu planejamento estratégico, visando explorar novas possibilidades de produção de energia, principalmente de fontes renováveis. Nesse sentido, aliás, o Brasil tem ampla vantagem, pois sua matriz energética é a mais limpa do mundo. 

A autossuficiência brasileira em petróleo é muito recente. Além disso, o país depende da importação de derivados, porque os governos golpistas interromperam a política de expansão das refinarias, agora retomada, com limitações financeiras, pelo governo Lula. Nesse contexto, a presidente da Petrobrás tem explicitado as novas fronteiras de exploração, incluindo a questão do Amapá, na bacia Foz do Amazonas e a bacia de Pelotas. Segundo Chambriard, as reservas do pré-sal atingirão o seu ápice em 2023, o que é “nada” em termos de tempo, considerando o tipo de produto que estamos tratando. A produção de petróleo demanda investimento elevadíssimo, e requer planejamento estratégico para as fases de pesquisa, prospecção e extração. 

A direção da Petrobrás está aguardando para obter autorização do Ibama para explorar petróleo na região da Foz do Amazonas. A Petrobrás é a maior especialista em exploração de petróleo em águas profundas e ultra profundas no mundo, não me lembro de acidentes com petróleo, no mar, envolvendo a companhia. Essa autorização é fundamental porque a sobrevivência da empresa depende de produção eficiente, com o cuidado de sempre e com a permanente reposição de reservas de petróleo e gás. 

Desde que o pré-sal começou a ser explorado no Brasil, há pouco mais de uma década, os benefícios para o país são incalculáveis, do ponto de vista da geração de energia, impostos, emprego e renda. Segundo Guilherme Estrela, geólogo conhecido como o “pai do pré-sal”, e outros especialistas, se o Brasil não tivesse descoberto o pré-sal, possivelmente agora estaria importando petróleo. Hoje o pré-sal disponibiliza mais de 70% do petróleo que o Brasil consome. A exploração de petróleo no pré-sal representa 26% da balança comercial do Brasil. Mas, como em qualquer processo dinâmico, atingido o pico de produção, começa a redução gradativa até o fim das reservas.  Por isso o trabalho da Petrobrás de exploração de novas reservas, como essa da Margem Equatorial, não pode ser interrompido. É fundamental que a estatal passe a produzir em novas áreas. 

Para realizar a chamada transição energética, para uma matriz renovável o Brasil precisa dos recursos do petróleo. Por isso que é fundamental um elevado nível de investimentos na Petrobrás. É o dinheiro ganho com petróleo e gás, que permitirá que a empresa tenha condições de realizar a chamada política de transição energética, para, através de novos investimentos, diversificar as fontes de produção de energia.  Por isso que a estratégia desenvolvida pelos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, de pagar os maiores dividendos do planeta para os acionistas, entre as petroleiras, no fundo foi desenvolvida para destruir a empresa, via carência de investimentos. Quem imaginar que essa formulação é uma “teoria da conspiração”, deveria conhecer pelo menos um pouquinho da história do petróleo e da fundação da Petrobrás.   

Quando Magda Chambriard foi indicada para a presidência as ações da Petrobrás caíram de cotação. O que é um bom sinal, porque claramente o movimento das ações teve um caráter especulativo. As grandes empresas vendem em massa para realizar o lucro e depois compram quando caem os preços. Como uma empresa que é top 10 em todos os quesitos de eficiência, não iria dar lucro? Mesmo no período dos governos golpistas, Temer e Bolsonaro, que tentaram atrasar a empresa no que foi possível, ela gerou muitos lucros. Afinal, como constatou John Davison Rockefeller, fundador da primeira grande empresa de petróleo da história, a Standard Oil, “o melhor negócio do mundo é uma empresa de petróleo bem administrada; o segundo melhor negócio, uma empresa de petróleo mal administrada”. Claro, a diferença, em relação ao governo Lula, é o que Temer e Bolsonaro faziam com esses lucros: nesses governos viraram lucros dos acionistas, em detrimento dos investimentos. 

O governo Lula demandou à nova direção a retomada das encomendas de navios e plataformas a estaleiros brasileiros, estratégia que visa aproveitar a demanda da Petrobrás para reindustrializar o país e gerar emprego e renda. A demanda de petróleo, e o peso da Petrobrás na economia, são armas robustas para reforçar as cadeias produtivas nacionais. Como já se falou algumas vezes, a Petrobrás é uma nação; mas é uma nação amiga do Brasil. 

A Petrobrás é uma das poucas multinacionais que o Brasil dispõe. A internacionalização da exploração é uma variável também importante da companhia. No ano passado, a empresa anunciou a volta das atividades na costa oeste da África, onde adquiriu participação em blocos da Shell em São Tomé e Príncipe e negocia para entrar no litoral da Namíbia. A Petrobrás auxilia inclusive na estratégia da diplomacia brasileira de se aproximar dos “países irmãos” da África. 

A troca da presidência da Petrobrás tem papel fundamental no esforço que o governo vem fazendo de reindustrialização e agregação de valor aos produtos. Como o Brasil, entre os países atrasados, é um dos mais industrializados ainda, apesar de todo o processo de recuo da indústria nos últimos anos, ele é atacado com muita ferocidade. Todo o ódio dos setores conservadores, em relação às aspirações de soberania econômica e política do Brasil, vem a tona, quando o governo toma qualquer iniciativa no campo da industrialização do país. Essa turma acalenta um sonho, que mal consegue disfarçar: transformar o país em definitivo, em um exportador de matérias primas e em uma base onde as companhias estrangeiras possam explorar seus negócios, aproveitando a abundância de recursos naturais, como petróleo e água, e uma população super explorada, acostumada a baixos salários. 

A essa altura acabou a trégua da mídia com o governo Lula. A direita tradicional já está fazendo acordo com a extrema direita, pensando na sucessão em 2026. A reação dos setores conservadores só não tem sido mais violenta porque a situação econômica está razoavelmente controlada neste momento. A inflação está relativamente baixa e a economia obteve um certo crescimento do PIB no ano passado, de 2,9%. O crescimento, modesto para as necessidades do Brasil, possibilitou uma redução da taxa de desocupação. Além disso, o câmbio se manteve estável e o Brasil vem apresentando superávit comercial próximo a US$ 100 bilhões, o que é fundamental para o balanço de pagamentos. Ou seja, há uma parte significativa do empresariado que está ganhando muito dinheiro, o que desestimula aventuras conspiratórias, neste momento. Mas é uma correlação muito difícil para o governo. 

Além disso, a parte do empresariado que tem um pouco mais de juízo, está observando atentamente o processo de demolição da Argentina, com a experiência desse governo dito anarcocapitalista. Um fato recente indica bem o desfecho que pode ter essa experiência tresloucada do país vizinho. No dia 22 de maio, a Argentina contratou emergencialmente um navio com 44 milhões de metros cúbicos (m³) de gás natural liquefeito (GNL) da Petrobrás. Em função de um consumo atípico de gás decorrente do frio extremo que tem feito na Argentina, que não havia sido registrado há décadas, e às vésperas do inverno que ameaça ser o mais rigoroso dos últimos anos, a demanda por gás para calefação aumenta drasticamente. 

A esses fatos se soma a desorganização de um governo supostamente libertário, que não tem a menor noção de gestão de um país importante como a Argentina, e que tem levado a população à fome em massa. Nesses dias, em que Brasil e Argentina comemoram 200 anos de relações diplomáticas, esse acontecimento foi extremamente significativo da importância de os países disporem de estatais fortes e organizadas, que possam auxiliar na oferta de produtos e serviços básicos para suas populações, como alimentação, energia, habitação e segurança territorial.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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