Em uma mensagem publicada nessa terça-feira (08/10) no X, o presidente colombiano Gustavo Petro declarou: “o golpe de Estado começou”. Esta mensagem, republicada em outras redes sociais pelo presidente, foi feita minutos depois do Conselho Nacional Eleitoral da Colômbia (CNE) anunciar a abertura de um processo para investigar possíveis irregularidades no financiamento da campanha eleitoral da coalizão governista de Petro, Pacto Histórico. Coalizão esta que venceu as eleições há dois anos com 50,4% dos votos, superando o candidato da extrema-direita, Rodolfo Hernández, o qual ficou com 47,3%.
O processo aberto pela CNE acusa Petro de ter supostamente violado o limite de gastos durante a sua campanha eleitoral. O presidente do CNE, César Lorduy, disse em uma coletiva de imprensa que a coalizão do presidente teria gasto 5,4 bilhões de pesos colombianos (equivalente a R$ 7 milhões), extrapolando o limite máximo permitido por lei.
Além do mandatário, outras 4 pessoas são apontadas como réus: Ricardo Roa Barragán, gerente de campanha de Petro e atual presidente da Ecopetrol (empresa de petróleo estatal da Colômbia); Lucy Aydée Mogollón, tesoureira; María Lucy Soto e Juan Carlos Lemus, auditores. Além destes, os partidos Colômbia Humana e Unión Patriótica (UP) também estão sendo acusados.
As investigações do CNE ocorrem no entorno da Sociedade Aérea de Ibagué (Sadi) que teria recebido da União Sindical Obrera (USO) e da Federação Colombiana de Educadores (Fecode) 4 bilhões de pesos (R$ 5,3 milhões) e 500 milhões de pesos (R$ 660 mil), respectivamente.
Diferentemente do Brasil – em que o TSE tem poder de caçar uma candidatura – o CNE não tem poderes para depor Petro. O Conselho Nacional Eleitoral é um órgão administrativo e pode apenas investigar campanhas eleitorais. Os resultados destas investigações não podem recair sobre um presidente em exercício. Lorduy, afirmou que:
“Esta é apenas uma abertura para formular acusações e abrir uma investigação. Por enquanto não há sanção. A partir de agora, os partidos a que nos referimos têm os prazos estabelecidos na lei para se defenderem”.
Contudo, os resultados apresentados pelo CNE podem ser encaminhados para a Câmara dos Deputados e ao Senado, os quais podem utilizar destes como precedentes para um processo de impeachment do presidente.
Em reação ao ataque, o partido Pacto Histórico questionou o fato de que o processo contra Petro e seu governo foi aberto por iniciativa de dois magistrados vinculados a partidos de direita, os quais compõe a oposição ao governo.
Benjamín Ortíz Torres e Álvaro Hernán Prada são os responsáveis pela abertura do processo. Torres é membro do Partido Liberal, uma legenda de direita que apoiou Federico Gutiérrez, terceiro colocado nas eleições de 2022.
Álvaro Hernán Prada é um ex-militar e membro do partido de extrema direita Centro Democrático – composto pelos ex-presidentes Álvaro Uribe (2002-2010) e Iván Duque (2018-2022). Prada é investigado na Suprema Corte de Justiça colombiana por manipulação de testemunhas e fraude processual, crimes supostamente cometidos para beneficiar o ex-presidente Uribe em um caso de corrupção. O magistrado, evolvido no processo de Uribe desde 2019, passou a ter foro privilegiado a partir de 2021, quando foi nomeado como membro da CNE pelo ex-presidente Duque.
Durante um discurso feito na terça-feira (08/10), Gustavo Petro deixou claro a posição golpista do CNE e de seus juízes:
“Se esse ato fosse levado a cabo, representaria a maior afronta à nossa democracia na história do país. O Conselho Nacional Eleitoral, um órgão administrativo infiltrado pelos mesmos políticos que governam nosso país há décadas, apresentou acusações contra mim. Isso claramente viola nossa constituição e meu privilégio”.
Petro negou as cinco principais acusações feitas pelo CNE. Quanto às supostas contribuições da USO e da Fecode para a campanha do presidente, Petro afirmou que estas foram feitas ao Partido Colômbia Humana e não a sua campanha, da mesma maneira que ocorreu com outras empresas e contribuintes para o Centro Democrático durante a campanha de 2018. Disse também que as acusações de pagamentos feitos a testemunhas eleitorais não correspondem a despesas da campanha.
O presidente colombiano disse também que “todas as despesas de campanha para propaganda eleitoral foram relatadas de acordo com os respectivos regulamentos”, afirmando ainda que a empresa contratada pelo próprio CNE para auditoria externa confirmou a veracidade das contas apresentadas. Petro afirmou que os magistrados do CNE confundem as autorizações de voo e se recusam a reconhecer a legalidade dos serviços prestados pela SADI. A acusação de que o evento de vitória eleitoral de Petro teria sido um gasto não reportado durante a campanha eleitoral também é uma falácia, já que tal evento não correspondia mais ao período da campanha eleitoral.
O presidente ainda anunciou um pedido à Comissão de Investigação e Acusação da Câmara para tornar públicas as mais de 25 provas testemunhais, 34 documentários e três inspeções judiciais que foram realizadas.
Ao fim de seu discurso, Gustavo Petro conclama o povo colombiano a ir às ruas defender seu governo:
“Faço um apelo à ampla mobilização do povo colombiano para a defesa irrestrita da democracia. Peço ao mundo que preste atenção na Colômbia e nos ajude a defender nossa democracia. Peço a todas as organizações populares da Colômbia que se reúnam e se declarem em assembleia permanente. É a hora do povo. Como Presidente da República constitucionalmente eleito, ordeno a todas as forças de segurança que não levantem uma única arma contra o povo. Os tempos de desigualdade e violência devem acabar na Colômbia. A decisão de hoje é o início de um golpe contra a jurisdição plena do presidente, contra os 11 milhões de pessoas que votaram nesse projeto progressista. Trata-se de uma fratura crua e incontestável da própria Constituição. Boa noite, colombianos.”