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Poder Judiciário

Papel do Supremo é proteger ou rasgar a Constituição?

Apoio ao barbarismo jurídico do STF por jurista na Folha é reveladora do cinismo que marca a “defesa da democracia”

Em artigo publicado na Folha de S. Paulo no último dia 8 e intitulado Em defesa do Supremo, o advogado criminalista Fábio Tofic Simantob defende a tese de que, “entre erros e acertos, é inegável que a corte vem cumprindo à risca a missão de proteger a Constituição”, curiosamente ou não, colocando os piores crimes da instância máxima da Justiça na conta dos “acertos”. Diz Simantob:

“A competência inusual da corte para julgar os atos golpistas foi uma criação jurisprudencial, como diversas outras questões no direito brasileiro. O fato é que a competência se revelou necessária. Se o Congresso Nacional quiser dar uma contribuição à democracia, em vez de anistia, deveria transformar a competência em regra legal.”

Fazendo uso do método “Rolando Lero” (clássico personagem da Escolinha do Professor Raimundo) de usar o malabarismo retórico para golpes, o que o jurista quer dizer, concretamente, é que o Supremo Tribunal Federal (STF) não tinha competência alguma para “julgar atos golpistas”, mas da própria cabeça, decidiram que teriam e assim procederam, sem lei alguma que os respaldasse para tal. O jurista sabe que um dos princípios basilares do que se conhece como Estado democrático de Direito é o princípio da legalidade, mediante o qual o Estado só pode agir com base em uma lei que o autorize a tal. Esse princípio está expresso na Constituição, inciso II do artigo 5º, que diz: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Quando o STF decide da própria cabeça que terá competência para julgar atos tidos como golpistas pelo imperialismo e sem que haja uma legislação que o determine, está transgredindo esse princípio, criando uma interpretação arbitrária e sem base legal de suas atribuições. O fato de essa ação ser considerada “necessária” – para um determinado grupo político, não se deve esquecer jamais – não torna a ausência de um respaldo jurídico algo menor.

O princípio da legalidade exige que qualquer ato do poder público, incluindo o julgamento de crimes, seja explicitamente autorizado por uma norma legal, sob pena de se tornar um ato de abuso de autoridade flagrante. A ação do STF, ao assumir uma competência não prevista em lei, termina sendo um apoio para que mais decisões de tal magnitude sejam tomadas, com base em nada além de conveniências políticas.

A parcela da esquerda que se sente contemplada nesse momento pode não ter claro o que está defendendo, mas esse é exatamente o padrão de funcionamento da Justiça da Idade Média. O chamado “Estado de Direito” foi criado exatamente para combater as loucuras defendidas pelo advogado em seu artigo à Folha e dar proteção ao cidadão contra as tendências repressivas do Estado. À luz do desenvolvimento histórico, apoiar as arbitrariedades do STF sob o pretexto de “defesa da democracia” não é outra coisa além de um cinismo apoiado na ignorância do povo sobre o assunto.

Finalmente, ao afirmar que essa competência deveria ser transformada em uma regra legal, Simantob está, na prática, reconhecendo que o que foi feito até aqui carece de fundamento legal, e que a própria legitimidade da Corte fica fragilizada pela falta de uma autorização expressa do legislador. Ainda, o autor acrescenta:

“O julgamento de atos tão graves que atentam contra a existência das instituições não pode ficar à mercê da primeira instância ou de tribunais regionais. Se a competência nasceu de uma anomalia política que tornou inevitável a atuação da Suprema Corte, a experiência mostrou, por outro lado, que errado estava o ordenamento jurídico brasileiro de não atribuir desde logo esse poder ao STF.”

Imagine o leitor se a moda pega? Estaria certo um juiz que, com base na interpretação tirada da cabeça, determinasse que “errado estava o ordenamento jurídico brasileiro” e procedesse ao fechamento dos sindicatos e à prisão de sindicalistas?

E se outra interpretação personalista, dada por um policial, decretasse que “errado estava o ordenamento jurídico brasileiro” ao proibir a pena de morte e a instituísse à luz de alguma anomalia, ainda que só o referido policial assim entenda um dado fenômeno? O que o jurista está fazendo é um convite ao barbarismo jurídico que todos conseguem ver como começa, mas como se desenvolve e como termina, não. Há pistas sobre isso, no entanto.

Quando os golpes de Estado ocorridos no País a partir de meados dos anos 1940 são sempre efetuados para favorecer o imperialismo e particularmente duros com a esquerda, é possível conjecturar quem serão os próximos agentes da “anomalia política” que sofrerão as piores represálias pela suposta lacuna no ordenamento jurídico brasileiro.

“Quiseram colocar o Supremo entre a cruz e a espada. E conseguiram. Só não contaram que o Supremo poderia escolher a espada”, destaca Simantob, cunhando uma frase de efeito que “esquece” que a competência do Supremo é julgar e não “escolher a espada”. A figura de linguagem é muito apropriada para quem está em defesa de uma ditadura judicial, comandada por ministros-justiceiros. Para a defesa do Estado democrático de direito, a contradição em termos de Simantob é reveladora do cinismo que marca a “defesa da democracia”.

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