A Revolução Palestina de 1936 foi derrotada, assim como tantas outras, por falta de uma direção. O sionismo e o imperialismo criara uma situação revolucionária na Palestina muito rapidamente, de 1917 até 1936. No entanto, os nacionalistas não conseguiram formar um partido coeso e os comunistas foram neutralizados pelos expurgos stalinistas da década de 1930. Ghassan Kanafani, militante da Frente Popular pela Libertação da Palestina (FPLP), conta um pouco sobre a situação em seu texto sobre a revolução, destacando:
“Na véspera da revolta, a situação dos representantes do movimento nacionalista na Palestina era a seguinte: com a dissolução do Comitê Executivo Árabe em agosto de 1934, seis grupos emergiram:
- O Partido Árabe da Palestina, em maio de 1935, liderado por Jamal al-Hussaini; ele incorporava mais ou menos a política do Mufti e representava os feudais e os grandes comerciantes das cidades.
- O Partido de Defesa Nacional, liderado por Raghib al-Nashashibi; fundado em dezembro de 1934, representava a nova burguesia urbana e os altos funcionários.
- O Partido da Independência, que havia sido fundado em 1932, com Auni Abd al-Hadl à frente. Incluía intelectuais, a burguesia média e alguns setores da pequena burguesia; isso contribuiu para que sua ala esquerda desempenhasse um papel especial.
- O Partido da Reforma que, fundado pelo Dr. Husain al-Khalidi em agosto de 1935, representava um número de intelectuais.
- O Partido do Bloco Nacional, liderado por Abd al-Latif Salah.
- O Partido da Juventude Palestina, liderado por Ya’qub al-Ghusain.
Essa multiplicidade era puramente superficial; não era uma expressão clara e definida da configuração de classes no país. A esmagadora maioria das massas não estava representada (segundo Nevill Barbour, 90% dos revolucionários eram camponeses que se consideravam voluntários)”.
Uma maioria camponesa esmagadora não é um problema para a revolução, as revoluções de sucesso aconteceram todas em países atrasados com uma maioria camponesa, Rússia, China, Coreia, Vietnã. O problema é organizar um partido liderado pela classe operária que consiga levar adiante a política para os camponeses, a distribuição de terras.
Kanafani afirma: “um olhar sobre a estrutura de classes na Palestina em 1931 mostra que 59% dos árabes palestinos eram camponeses (19,1% dos judeus), 12,9% dos árabes trabalhavam na indústria da construção e mineração (30,6% dos judeus). 6% dos árabes palestinos trabalhavam em comunicações, 8,4% no comércio, 1,3% na administração, etc. Isso significa que a esmagadora maioria da população não estava representada nesses partidos que, embora representassem os líderes feudais e religiosos, os compradores urbanos e certos setores dos intelectuais, estavam sempre sujeitos à liderança do Mufti e sua classe, que representava os líderes feudais-clericais, e era mais nacionalista do que a liderança que representava a burguesia urbana. Esta última era representada pelos efêndis [tradicionais senhores de terra], em um momento em que começavam a investir seu dinheiro na indústria (essa tendência se tornou mais acentuada após a derrota da revolta de 1936-1939)”.
Essa colocação é muito interessante, pois mostra um caráter peculiar da revolução. A burguesia costuma impulsionar o movimento nacionalista até certo ponto. Ele é sempre liderado por setores pequeno-burgueses. No mundo árabe foi muito comum pessoas ligadas ao exército cumprirem esse papel, Nasser, Gadafi, Qassem no Iraque, dentre outros. Mas na Palestina a economia moderna era controlada pelos sionistas e a revolução se dava contra o sionismo, isso criou o fenômeno diferenciado da tradicional classe dominante do campo ser mais combativa que a burguesia. No fim, nenhum deles era revolucionário, mas o Mufti de Jerusalém acabou assumindo o papel de liderança mais combativa.
Sobre a pequena burguesia ele ainda comenta: “a pequena burguesia em geral (pequenos comerciantes, lojistas, professores, funcionários públicos e artesãos) não tinha liderança. Como classe, não teve influência nem importância sob o regime turco, que dependia da classe efêndi, à qual os turcos deram o direito de governo local, devido ao fato de ter crescido em conjunto com a aristocracia feudal”. Os efêndis eram a classe dominante no período anterior, da dominação dos turcos (otomanos), ela, portanto, se chocava com a nova classe que surgiu com a intervenção imperialista, a burguesia sionista.
Por fim, ele comenta do movimento operário: “o movimento operário estava recém-estabelecido e era fraco, e como resultado, exposto à opressão pelas autoridades, à concorrência esmagadora do proletariado e da burguesia judaica, e à perseguição pela liderança do movimento nacionalista árabe”. Aqui Kanafani comete o erro de não criticar o stalinismo, provavelmente por ser um militante da FPLP. O movimento operário sempre é perseguido pelo imperialismo e compete com o nacionalismo nos países atrasados. Mas um fator que é mais decisivo é ter a política errada na hora da revolução, e isso aconteceu devido ao stalinismo.
Hoje a Palestina não possui um partido marxista, mas é um país onde atua um partido nacionalista revolucionário, o Hamas. Esse diferencial é enorme, pois, no que tange as revoluções de libertação nacional, há exemplos onde não foi necessário um partido operário para derrotar a potência colonial.