Nesta terça-feira, 9 de maio, o jornal O Estado de S. Paulo, um dos órgãos mais conscientes da burguesia brasileira, publicou um editorial intitulado A ficha caiu. Segundo o texto, os “investidores” – isto é, os representantes do grande capital – estariam “desiludidos” com o governo Lula. “Eu me penitencio por ter acreditado que o PT teria alguma seriedade fiscal”, teria dito um dos tais “investidores” citados pelo Estadão.
O pretexto para essa tal “desilusão” seria o comportamento de Lula frente ao arcabouço fiscal criado pelo próprio governo petista. Diz o jornal burguês, mostrando-se, ele próprio, “desiludido”: “a facilidade com que o atual governo desrespeitou o arcabouço fiscal – que, diga-se de passagem, este mesmo governo propôs – mostrou que Lula da Silva não é só incapaz de aprender com os erros do passado; ele é incapaz de entender que errou“.
Segundo o Estadão faz crer, o conjunto da burguesia resolveu “dar uma chance” para Lula, mas ele teria acabado traindo os capitalistas, adotando um programa completamente hostil às amarras neoliberais. Não procede. O fato é que, nos últimos tempos, Lula tem se mostrado um presidente muito mais moderado que quando iniciou o mandato em janeiro de 2023. A questão não é econômica, é política. Tampouco os capitalistas estão “desiludidos”: as medidas fiscais de Lula são apenas uma desculpa para que a burguesia se unifique em uma oposição cada vez mais coesa contra o governo.
O editorial do Estadão surge na esteira de uma série de acontecimentos que mostram que a burguesia entrou em um acordo com o bolsonarismo. Entre os eventos de maior destaque, estão as críticas da imprensa capitalista à atuação de Alexandre de Moraes. É a unidade com o bolsonarismo o verdadeiro motivo da indisposição dos capitalistas com Lula.
A unidade com o bolsonarismo, por sua vez, responde a necessidades da política internacional. O imperialismo está em uma situação desesperadora. A situação econômica é desesperadora, mas a situação política e militar é pior, diante da iminente derrota na Ucrânia e da provável derrota no Oriente Médio. E é por isso que, nas últimas semanas, foi aprovada a “lei do antissemitismo”, o TikTok foi banido, os estudantes norte-americanos estão sendo reprimidos e os países europeus estão mandando soldados para a Ucrânia. A dominação imperialista está em uma grande crise, que tende a se aprofundar, e precisa ser respondida com muita dureza. Do contrário, se essa tendência à rebelião não for contida, a dominação imperialista poderá vir completamente abaixo.
Diante dessa situação, em um país como o Brasil, o presidente ideal jamais seria Lula. Por mais que ceda no terreno econômico e mesmo na questão dos direitos democráticos, Lula jamais será capaz de levar adiante o programa repressivo e de devastação econômica que o imperialismo precisa para este momento. O presidente dos sonhos para o grande capital é alguém como Javier Milei, que está sendo elogiado pelos banqueiros.
Essa é, na verdade, uma tendência na América Latina. A burguesia se prepara para apoiar, no Chile, o fascista Antonio Kast. Na Bolívia, não permitirão que Evo Morales seja candidato. Na Colômbia, o cerco contra o governo de Gustavo Petro é cada vez maior.
Ao contrário da Europa, na América Latina, a “social-democracia” já é uma carta fora do baralho. Já não é mais uma opção a ser levada em conta. O PSDB, no Brasil, já está à beira da falência total. Por isso, surgem apenas duas opções: a ditadura neoliberal de Javier Milei ou o nacionalismo progressista de Lula e Nicolás Maduro. Em meio à crise pela qual o imperialismo está passando, não há dúvida de que lado irá ficar.
Para a burguesia, é preciso um Javier Milei brasileiro. E é daí que vem o acordo com o bolsonarismo. Para conter a situação de crise, até mesmo o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) vem aparecendo como uma melhor opção para os capitalistas.