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Esquerda pró-EUA

O País que elegeu Lula e Dilma é ‘de direita’?

Não é o povo que está alinhado com o conservadorismo, mas sim as direções da esquerda que deixaram de politizar e mobilizar as massas

O professor Chico Teixeira, da UFRJ, em seu texto As bases conservadoras da sociedade brasileira, publicado no sítio Brasil 247, faz uma análise completamente descabida ao afirmar que “o eleitorado brasileiro tornou-se, desde 2014, majoritariamente de direita”. Segundo o autor, “a vitória de Lula, num segundo turno difícil com uma diferença de apenas 1.8%, ocultou um dado assustador: o eleitorado brasileiro tornou-se, desde 2014, majoritariamente de direita”. Essa afirmação não apenas ignora os fatos concretos das eleições presidenciais desde então, mas também desconsidera o quadro político que levou a esse acirramento de forças. A tentativa de transformar o povo brasileiro em um suposto grupo reacionário é um exemplo clássico de teoria acadêmica que se descola completamente da realidade.

A verdade é que, em 2014, o Brasil elegeu Dilma Rousseff para a Presidência em uma conjuntura extremamente difícil. Sob as ordens do imperialismo, a direita não poupou esforços para operar um golpe neoliberal de maneira indolor, elegendo o tucano Aécio Neves, mas fracassou.

Apesar das tentativas de subverter o resultado eleitoral, utilizando a recém nascida e já claramente golpista operação Lava Jato para impulsionar um novo padrão de perseguição política e desencadeando uma das campanhas mais sujas da história brasileira — com mentiras, calúnias e difamações lançadas em escala industrial pela imprensa que “não mente” — Dilma venceu.

Basta lembrar a edição antecipada da revista Veja, acusando a presidenta de tudo o que se possa imaginar, obviamente com o intuito de interferir no processo eleitoral. E não adiantou nada. O povo mostrou, em 2014, que não era de direita, mas sim de esquerda, resistindo ao massacre político que se instalava no País.

Teixeira, como acadêmico, deveria demonstrar aquilo que está afirmando. Onde estão os indícios de que o eleitorado brasileiro se tornou conservador em 2014, se Dilma foi reeleita mesmo sob esse cerco fechado? O fato é que, se a sociedade tivesse se tornado de direita como ele argumenta, a presidenta jamais teria vencido a eleição. Dilma venceu, e venceu apesar da campanha desprovida de limites da direita e do fogo cerrado da imprensa contra ela. Esse é o primeiro ponto que desmonta a tese do historiador.

Depois, Teixeira ignora completamente que, após o golpe de 2016, ocorreram diversas mobilizações populares em apoio a Dilma Rousseff. A votação do impeachment foi marcada por um gigantesco ato na Esplanada dos Ministérios, que se dividiu ao meio, com uma das metades repleta de manifestantes em defesa do mandato da presidenta.

Se a sociedade era tão direitista como ele afirma, por que existiu uma mobilização tão expressiva e combativa contra o golpe? O mesmo raciocínio vale para 2018. Nesse ano, uma mobilização espontânea de trabalhadores cercou o Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo do Campo (SP), desafiando a justiça golpista e a ordem de prisão de Lula.

Os trabalhadores chegaram a expulsar a GCM das cercanias, o que fez com que a PM se acovardasse e nem sequer tentasse enfrentar a mobilização. Esse seria o comportamento de uma classe operária direitista? Claro que não.

Poucos meses depois, nas eleições presidenciais e já preso, portanto, sem fazer campanha alguma, Lula era o franco favorito a vencer a eleição presidencial daquele ano. Pesquisas de opinião mostravam que ele teria 65% das intenções de voto e chances de vencer no primeiro turno, caso sua candidatura fosse adiante. Foi necessário um novo golpe para tirá-lo da disputa e, mesmo assim, o substituto do PT, o insosso Fernando Haddad, ainda conseguiu ir ao segundo turno, derrotando diversos candidatos abertamente reacionários. Isso não é sintoma de um eleitorado direitista, mas sim de uma profunda polarização política.

O que se viu, em seguida, foi o PT totalmente acuado, colocando um candidato sob medida para perder e completamente inadequado para a disputa eleitoral. Com Haddad encabeçando a chapa, a campanha se deu de maneira defensiva desde o início, sem qualquer capacidade de mobilização popular. Mesmo assim, a candidatura petista conseguiu mobilizar milhões de pessoas nas urnas. A derrota foi mais um reflexo das fragilidades do próprio partido e da falta de coragem de enfrentar o golpe, do que de um suposto direitismo da população.

Outro ponto ignorado pelo autor é que, naturalmente, o brasileiro comum é religioso e vê com desconfiança os ataques gratuitos à sua moral. Isso se traduz em rejeição ao identitarismo promovido por uma minoria acadêmica, que nada tem a ver com a esquerda tradicional, mas sim com os interesses do imperialismo. A ilusão de que o Brasil se tornou de direita após 2014 é fomentada pela própria ausência de mobilização e abandono das massas pela esquerda. Em vez de politizar a sociedade e combater as políticas neoliberais, optaram por entregar a eleição municipal de 2016 à direita. Isso, sim, favoreceu a ascensão de figuras reacionárias, mas não há qualquer evidência de que a população brasileira tenha mudado de lado ideológico.

Teixeira se esquece de que as eleições presidenciais sempre foram o palco onde as verdadeiras inclinações políticas do povo se manifestam com mais força. Em 2002, Lula venceu de lavada. Em 2006, foi reeleito com o opositor (o atual vice-presidente Geraldo Alckmin, que na época, conseguiu ter uma votação menor no segundo turno em relação ao primeiro.

Em 2010 e 2014, Dilma foi eleita e reeleita, apesar de todas as tentativas de desestabilização. E em 2018, a vitória da direita só veio após uma série de golpes e intervenções judiciais. Até 2022, a polarização continua entre o bolsonarismo, um fenômeno efêmero e artificialmente inflado, e o petismo, que carrega consigo o apoio da massa trabalhadora.

Não é o povo que se tornou de direita. A realidade é que a esquerda brasileira, desde 2016, abandonou o combate político, entregou as eleições menores e permitiu que as opiniões conservadoras prevalecessem nos cargos locais. Mas basta lembrar que, nas eleições presidenciais, a esquerda ainda se mantém como força majoritária e expressiva. Não é o povo que está alinhado com o conservadorismo, mas sim as direções da esquerda que deixaram de politizar e mobilizar as massas.

A afirmação do professor Chico Teixeira está completamente equivocada. O eleitorado brasileiro, ao contrário do que ele diz, não se tornou majoritariamente de direita. Pelo contrário, sempre que teve oportunidade, escolheu os candidatos de esquerda para governar o País. Não é o povo que se converteu ao conservadorismo, mas a esquerda que se afastou das massas, abrindo espaço para a ascensão de figuras reacionárias em um terreno de apatia política.

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