A vitória acachapante da extrema direita nas eleições da França no início de junho levou a esquerda a criar a Nova Frente Popular (NFP). O partido Reagrupamento Nacional (RN), de Marine de Le Pen, foi vitorioso novamente nas eleições parlamentares do dia 30 de junho, mas a esquerda ainda acredita que a NFP é o caminho para derrota do fascismo. Por isso o Novo Partido Anticapitalista (NPA), que compõe essa frente, publicou o texto “parar a extrema direita, fortalecer a esquerda unida e militante” logo após as eleições. O seu grande problema é que ele não compreende que a NFP é uma frente com os inimigos dos trabalhadores.
Ele começa: “os resultados alarmantes do RN são a combinação do desenvolvimento do nacionalismo e do racismo em certas categorias da população e do apoio cada vez maior das classes dominantes à extrema direita, apoio amplamente divulgado por uma parte da mídia. Ao mesmo tempo, as direitas estão desmoronando, com uma sanção muito importante a Macron e sua política. A chegada ao poder do RN e de seus aliados e apoiadores torna-se possível, e o perigo de um neofascismo aumenta um pouco mais na França”. Aqui não há uma explicação política real.
A RN cresce porque faz uma oposição ao regime político neoliberal, uma oposição a Emmanuel Macron, ao Partido Socialista e ao Partido Republicano. Opõe-se à guerra na Ucrânia e ao identitarismo. A esquerda, por sua vez, fica a reboque dessa política e não cresce. A NFP é um bloco tanto com o PS quanto com os verdes, ou seja, um bloco com o regime político imperialista falido. Não há como crescer se aliando com esse setor falido. Ao mesmo tempo, ele erra ao falar que a burguesia está com a RN, o principal setor da burguesia está sendo derrotado pela RN, assim como nos EUA está sendo derrotado por Trump. Até por isso também a RN aparece como combativa, porque é um setor menos poderoso da burguesia travando uma luta.
Então o artigo afirma: “o ressurgimento da esquerda em torno da Nova Frente Popular é a única boa notícia deste primeiro turno. Seus resultados importantes são, acima de tudo, fruto de uma unidade que mobilizou centenas de milhares de pessoas para se manifestar e fazer campanha. Neste estágio, essa resposta não é forte o suficiente para compensar a pressão perigosa da extrema direita”. A NFP não é positiva, ela é o caminho para a derrota da esquerda. Invés de polarizar com a extrema direita, de radicalizar para assim crescer, a esquerda fica a reboque dos neoliberais. o FI de Melenchon, o NPA e até o Partido Comunista Frances estão a reboque do PS. Este é basicamente o mesmo partido de Macron mas em versão esquerdista.
Então o NPA coloca o clássico argumento para a frente ampla: “impedir o RN de chegar ao poder. Nos próximos dias, precisamos de uma irrupção popular contra o perigoso avanço da extrema direita, de construir as mobilizações antifascistas e as manifestações mais massivas possíveis”. É preciso lutar contra a RN, mas também é preciso lutar contra o neoliberalismo, assim inclusive se vence a RN politicamente. Caso a esquerda se alie aos neoliberais não irá derrotar fascismo e se por algum motivo vencer irá estar empossando um neoliberal. É o caso de Boric no Chile.
Ele discorre sobre o assunto: “a principal questão do segundo turno é impedir que a extrema direita chegue ao poder em poucos dias, um objetivo essencial para nosso campo social. Sabemos que a política defendida ou implementada pelas direitas, em particular o macronismo no poder, contribuiu amplamente para abrir caminho para o RN, ao adotar parte de suas medidas e contribuir para dar-lhe legitimidade. No entanto, entre dois perigos, devemos primeiro fazer tudo para eliminar o mais importante e o mais imediato. Assim, considerando os interesses imediatos das populações imigrantes, de todo o mundo do trabalho, da defesa dos direitos e das liberdades públicas, é imperativo neste domingo derrotar o RN, seus aliados e apoiadores, de preferência com uma boa esquerda”.
Aqui aparece o problema de forma sutil, “de preferência com a boa esquerda”. Quem seria a má esquerda? O PS e os verdes. Mas, na prática, esses partidos já deixaram de ser de esquerda. Eles atuam mais como um PSB, como um PSDB, do que como qualquer força de esquerda. São partidos do imperialismo, que defendem a OTAN, o governo Macron, a política imperialista na França etc. A “má esquerda” é tão trágica para os trabalhadores quanto Macron e por isso muitos estão preferindo arriscar eleger Le Pen.
Eles então anunciam o seu programa: “para isso, é preciso fortalecer a unidade de ação de toda a esquerda, da base ao topo. Estar juntos e lutar lado a lado: manifestar-se contra a extrema direita e se defender contra os ataques de grupos fascistas, resistir às medidas antissociais, discriminatórias ou autoritárias, às violências policiais e racistas, às violências sexistas e sexuais, defender o aumento dos salários e dos benefícios sociais, o retorno da aposentadoria aos 60 anos com taxa integral”.
Grande parte do que eles dizem resistir é a política do governo Macron, ou seja, do setor direitista dentro da NFP. Isso mostra o problema da Frente Popular, a esquerda se compromete com um setor que é radicalmente contra o que ela defende. É o caso também de Lula, a frente ampla impede o presidente do Brasil de agir. Qualquer ação progressista acaba criando problemas na frente pois nela estão Alckmin e Simone Tebet. Na França o fenômeno tende a ser o mesmo.
E por fim: “manter vivas as solidariedades internacionalistas e anticolonialistas com a Palestina, a Ucrânia ou a Canaque e, de forma mais geral, com todos os povos vítimas do imperialismo francês. É mobilizando-se, todos juntos, que podemos mudar a vida”. Aqui vale dois comentários. Primeiro que O PS também defende o imperialismo na Palestina e na Nova Caledônia e, portanto, a NFP não tem essa política aintiimperialista. E segundo porque o imperialismo francês oprime a Rússia e não a Ucrânia. Nesse sentido, o apoio à Ucrânia talvez seja o único ponto de concordância da NFP e não é algo que fará a frente ganhar popularidade, pelo contrário.