No dia 25 de novembro de 1990, começava uma era difícil para os trabalhadores paulistanos. Foi o começo da trágica era de apoios da esquerda a candidatos do “mal menor” da direita, notadamente o PSDB e o MDB. Esta decisão iria estabelecer a ditadura do PSDB sobre o estado, que resultaria na destruição do ensino em São Paulo, bem como da saúde, do empobrecimento geral do mais rico estado do Brasil. O grande vencedor desta decisão foram os bancos, os grandes capitalistas, que se enriqueceram às custas dos trabalhadores. Vejamos como começou esta história.
Em São Paulo, o Partido dos Trabalhadores (PT) não conseguiu chegar ao segundo turno com Plínio de Arruda Sampaio, fazendo com que a disputa se concentrasse no herdeiro da Ditadura Militar (1964-1985), Paulo Maluf (PDS), e no ex-promotor Luiz Antônio Fleury Filho (PMDB).
Fleury iria se apresentar como preocupado com esse fato, o então senador eleito petista Eduardo Suplicy deu o pontapé da política de apoiar o “mal menor”: “devemos fazer tudo para evitar a vitória de Maluf, inclusive apoiar Fleury”, disse, defendendo o “voto útil”.
Apresentado como “civilizado”, “democrático” e apoiador das “Diretas Já”, Fleury foi o governador responsável pelo ainda hoje inigualado Massacre do Carandiru, quando uma rebelião contra as condições infernais da cadeia de mesmo nome resultou no assassinato a sangue-frio de pelo menos 111 detentos segundo a polícia paulista — a contagem feita pelas famílias dos presos, entretanto, chega a 250 vítimas. O crime chocante foi imortalizado na canção Diário de um detento, do grupo Racionais MCs, sendo um dos maiores sucessos do conjunto.
Além de ser o responsável por esta matança monstruosa, Fleury foi o herdeiro político de Orestes Quércia.
Também filiado ao PMDB, Quércia foi governador de São Paulo de 1987 até 1991, antes de Fleury assumir. Durante seu mandato, atacou com muita truculência o movimento dos trabalhadores, utilizando a PM para reprimir, por exemplo, a greve dos professores e dos funcionários públicos, ambas de 1989, e a greve dos metalúrgicos, de 1990.
Além disso, Quércia utilizou seu poder enquanto governador para favorecer o PMDB no principal estado do País, para atropelar processos de licitação e beneficiar as empresas de seus aliados e para calar a imprensa.
É nisso que resultou a política de “tudo para evitar a vitória de Maluf”. Não é possível averiguar qual seria o resultado do governo Maluf, porém é fato que o maior massacre da história de São Paulo não foi realizado pelo herdeiro da Ditadura, mas pelo candidato “civilizado”.
Em outra demonstração do equívoco dessa política, no dia 1º de janeiro de 1995, começava uma era em São Paulo marcada pelo domínio do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) que se estenderia até 2022. Derrotado não pela esquerda, mas pela extrema direita, o Palácio dos Bandeirantes (sede do governo estadual) teria seu primeiro residente não tucano com o bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Até então, Mário Covas seria o primeiro, após as eleições de 1994, feito que seria repetido com sua reeleição em 1998, seguido pelo então vice, Geraldo Alckmin (que assume o governo após a morte de Covas, em 2001 e reelegendo-se em 2002), José Serra (2007-2010), Alckmin novamente (2011-2018) e, finalmente, João Doria (2019-2022), sendo substituído por Rodrigo Garcia, seu vice, para disputar as eleições presidenciais daquele ano.
A ditadura tucana teria como um de seus principais apoios a política do “mal menor”, usada desde a primeira vitória de Covas e sobre a base da qual o PT entrou em uma aliança informal com o PSDB.
Ocorre que tanto o PSDB quanto Mário Covas já eram percebidos como partido e liderança política da direita, como expressou o então candidato petista ao Palácio dos Bandeirantes, José Dirceu. O qual também chamou a votar nos canalhas do PSDB.
Uma vez no governo paulista, o PSDB pôs em ação sua política de atendimento aos interesses dos banqueiros. Nos dois governos de Covas, foram privatizados a Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL, 1997), a Eletropaulo (1998), a Companhia Energética de São Paulo (CESP, 1999), as rodovias Via Anhanguera (SP-330), Rodovia dos Bandeirantes (SP-348), e Rodovia Castello Branco (SP-280), em 1998, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM em 1998) e o Banco do Estado de São Paulo (Banespa, 2000), entre muitos outros.
Em 1998, a política do “mal menor” assume uma feição mais acabada, com a eleição paulista concentrando-se, no segundo turno, entre o candidato a reeleição e o homem da linha-dura da Ditadura Militar, Paulo Maluf. Lembrado constantemente por ser um organizador do regime militar e defendê-lo até o fim, Maluf foi o espantalho para que o maior partido da esquerda brasileira apoiasse novamente o PSDB.
Ao apresentar como obrigatório defender a direita numa eleição, condenaram a esquerda a votar na direita contra a extrema direita em diversas eleições, criaram um monstro. No momento em que fizeram isso, disseram ao trabalhador: “eles não são tão ruins assim”. Confundiram o povo e colocaram a esquerda numa rota de derrotas sucessivas nas eleições governamentais de São Paulo.
A decisão correta seria, sem dúvida, dizer basta. Era preciso colocar em alto e bom som: nenhum apoio aos candidatos dos capitalistas. Poderia se perder uma batalha, mas a guerra seria vencida. Os trabalhadores aprenderiam a rejeitar tanto a extrema direita quanto a versão disfarçada desta direita. O Estado não teria perdido suas estatais, não pagaria pedágios absurdos e contas de luz em dólar.
A saída nunca é confiar em falsos amigos e no mal menor, é chamar o povo a confiar em uma única força: a sua própria força.