No dia 13 de dezembro, dia em que o presidente Lula fez a sua segunda cirurgia em menos de uma semana, o portal Brasil 247 publicou o artigo Até pedido de atestado de óbito circula no X, assinado por Alex Solnik.
No início do texto, Solnik se mostra escandalizado com as publicações, que circulam nas redes sociais, falsificando a morte do presidente Lula.
“Há dezenas de postagens nas redes sociais, e sobretudo no X, não só desejando a morte do presidente Lula, como ‘informando’ que ele já morreu; há inclusive um pedido de atestado de óbito com o logotipo do Hospital Sírio Libanês circulando livremente.
Eu e as pessoas com um mínimo de informação sabemos que se trata de mentiras deslavadas, e não damos a menor pelota para essas sandices, mas é impossível calcular quantos acreditam nisso e até em outras fake news, como a que Lula já morreu faz tempo e quem está internado é um sósia, com milhares de compartilhamentos.”
Que publicações desse tipo existam, não é novidade nenhuma. Em 2017, por exemplo, quando a direita – que, ainda que visivelmente fascista, não se identificava como “bolsonarista” – fez muito pior diante da internação da ex-primeira-dama Marisa Letícia. Mas não é apenas esse o problema. Boatos sobre a morte de alguém deve ser uma das “fake news” mais antigas da história humana.
Dizer que não se trata de uma novidade é importante porque Solnik, propositalmente, quer apresentar isso como um fato novo. Mas o que quer o autor? O seguinte trecho é bastante revelador:
“O Artigo 19 do Marco Civil da Internet diz que as plataformas só precisam retirar conteúdo a pedido da Justiça.
E como um pedido da Justiça demora um tempão, mesmo num caso que envolve o presidente da República, durante muitos dias, não se sabe quantos, milhões de usuários ficarão expostos a essas postagens criminosas que colocam em dúvida a real existência da pessoa mais importante do país.
Se o X pode fazer isso com o presidente da República, o que não poderá fazer com o cidadão comum?”
Para os que ainda não estão a par do tema, o artigo 19 do Marco Civil é um dispositivo que diz: “com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário”.
A derrubada do artigo 19 implicaria que as redes sociais poderiam ser responsabilizadas pelo conteúdo publicado pelos usuários, mesmo quando não houvesse decisão judicial a respeito. Se um usuário publicar a mensagem “todos os judeus são ratos” na rede social X, hoje, a plataforma não teria responsabilidade sobre isso. Se, daqui a um ano, o Judiciário condenasse a pessoa que falou isso e obrigasse a plataforma a retirar o conteúdo, ela finalmente seria obrigada a fazê-lo. Mesmo que seja um absurdo alguém ser condenado pelo que fala na Internet, o artigo 19 garante que a liberdade de expressão seja mantida até a decisão judicial.
Caso o Supremo Tribunal Federal (STF) derrube o artigo 19, e o mesmo usuário fosse condenado por falar que “todos os judeus são ratos”, a plataforma X poderá ser responsabilizada por ter mantido a publicação no ar até o momento da ordem judicial. Na prática, o que acontecerá é que todas as plataformas, diante do receio de ser processadas, irão aplicar uma censura brutal contra todos os usuários. E o maior alvo serão aqueles que comentam assuntos políticos, que podem desafiar os grandes interesses.
É por isso que o editor-chefe do Brasil 247 tem se posicionado abertamente contra a derrubada do artigo 19. Ele mesmo já falou o óbvio: sem o artigo 19, ninguém saberá o que pode ser dito ou não na Internet. A atividade de um portal progressista ficará inviável. O que será proibido não é dizer apenas que “todos os judeus são ratos”, mas, por exemplo, pedir o fim do Estado de “Israel”. Basta que, para isso, um juiz diga que antissionismo é a mesma coisa que antissemitismo.
Alex Solnik, ao defender o fim do artigo 19, contribui para que o próprio Brasil 247 seja amordaçado. Isto é, que deixe de existir como é hoje.