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Oriente Médio

O idealismo a serviço do imperialismo na questão de ‘Israel’

MRT ignora por completo quem é que sustenta a entidade sionista

No artigo Hospital Al-shifa em Gaza: morte, devastação e mentiras, em que faz um balanço da ocupação do Hospital Al-shifa, localizado na Faixa de Gaza, o Movimento Revolucionário dos Trabalhadores (MRT) apresenta uma tese profundamente pró-imperialista sobre o Estado de “Israel”. Conforme o texto publicado em seu sítio, Esquerda Diário, para o MRT, a única forma de “Israel” ser extinto seria por meio da vontade dos Estados Unidos!

A tese aparece no seguinte trecho:

“Após quase 6 meses de guerra sangrenta, a pressão dos governos imperialistas começa a se expressar publicamente. Internamente, a aliança do [sic] Netanyahu com a extrema-direita está ameaçada pela pressão de um setor crescente na sociedade que exige o fim das isenções que permitem os judeus ortodoxos a não prestar o serviço militar, e, portanto, não serem enviados para lutar em Gaza; também há pressão das famílias dos reféns, que no sábado iniciaram um movimento para exigir um cessar-fogo e um acordo de libertação para os israelenses que seguem sequestrados em Gaza. Lamentavelmente, estas manifestações de um amplo setor da população de Israel realmente não levam em conta o sofrimento dos civis palestinos. Centram unicamente na questão da libertação dos reféns israelenses. A movimentação geral de direita da sociedade israelense sobre a questão palestina durante os últimos 15 anos e o trauma causado pelo ataque de 7 de Outubro tem criado um certo consenso na necessidade de travar esta guerra, enquanto desumanizam os palestinos e reforçam a legitimidade do colonialismo.”

Para o MRT, portanto, em toda a sociedade israelense, não haveria ninguém que “levasse em conta o sofrimento dos civis palestinos”. Dito de outra forma, a sociedade inteira – ou, pelo menos, sua esmagadora maioria – seria favorável ao genocídio na Faixa de Gaza. E, por isso, os palestinos estariam condenados a viver sob um apartheid até o dia em que viver o último israelense.

É uma tese realmente curiosa – mas que não tem nada de marxista. Por que exatamente uma população de 9,5 milhões de pessoas estaria disposta a defender, até às últimas consequências, um regime genocida? Do ponto de vista material, o que justificaria esse interesse?

Não há justificativa. Por mais que haja manipulação religiosa, por mais que haja todo um esforço oficial de doutrinação, a repressão ao povo palestino não corresponde, em si, às necessidades sociais de uma maioria de pessoas – das quais mais de 20% é árabe. E, portanto, não seria de seu interesse que um Estado como “Israel” existisse.

O que é inacreditável é que o MRT utiliza para a sua análise aquilo que vem de uma ditadura. Em uma ditadura, a esmagadora maioria da população é contra o regime. Mas essa oposição só é expressa em momentos excepcionais. “Israel”, por sua vez, não é qualquer ditadura, mas a ditadura mais abertamente fascista de todo o planeta. Não apenas é difícil de saber exatamente o que acontece lá, uma vez que a propaganda mentirosa é incessante, mas também a repressão aos movimentos abertamente pró-Palestina é gigantesca.

Também não é fato que não haja apoio à causa palestina em “Israel”. Desde que os primeiros reféns foram libertos, ficou patente que uma parte dos israelenses compreendem perfeitamente os motivos que levaram o Hamas a deflagrar a operação Dilúvio de al-Aqsa. Tanto é assim que prisioneiros foram a público agradecer ao Hamas pelo tratamento e outros tantos foram proibidos por “Israel” de conceder entrevistas. Um familiar de um refém, em entrevista a uma emissora israelense, chegou a elogiar nominalmente o líder das Brigadas al-Qassam.

O que se pode dizer é que, em “Israel”, a correlação de forças ainda não se mostrou suficientemente favorável para uma mobilização de massas que seja dirigida por organizações pró-Palestina. E que, portanto, as manifestações contra a guerra não sejam manifestações que reivindiquem, abertamente, a dissolução do regime de apartheid. No entanto, isso é transitório – é parte de um processo social em curso.

A primeira condição para que haja uma mobilização contra o Estado de “Israel” em si é que a sua autoridade seja questionada. Independentemente dos motivos que estejam levando os israelenses às ruas, o fato é que, na medida em que o governo não tem apoio, ele também se enfraquece na repressão aos palestinos. Objetivamente, na medida em que israelenses se opõem à guerra, o governo perde apoio para reprimir os palestinos, uma vez que uma coisa está diretamente ligada à outra. Sendo assim, criam-se as condições para que surjam movimentos mais abertamente pró-Palestina.

Se levássemos a sério a tese do MRT, teríamos que, em primeiro lugar, concluir que a única maneira de impedir a limpeza étnica da Palestina seria fazer o que “Israel” acusa o Hamas de defender: a expulsão de todos os israelenses do território que hoje ocupam. Ou seja, seria impossível libertar a Palestina, pois isso só poderia ser feito por meio do extermínio ou da expulsão de cada uma das pessoas que não “levariam em conta o sofrimento do povo palestino”.

E também seríamos obrigados a concluir que o que sustenta o Estado de “Israel” é o apoio de 9,5 milhões de pessoas que, sabe-se lá por quê, acreditam que viver sob um regime de apartheid seja a coisa mais maravilhosa do mundo. Implicitamente, o MRT está dizendo que o que sustenta “Israel”, portanto, não é o imperialismo. Não são as armas dos Estados Unidos, não são os bilhões de dólares enviados a “Israel”, não é o assédio mundial contra a opinião divergente promovida pelo imperialismo. “Israel” é sustentado, finalmente, por pessoas incapazes de “levar em conta o sofrimento do povo”.

Tudo é tão ridículo que o próprio MRT, no trecho supracitado, reconhece que a “pressão dos governos imperialistas começa a se expressar publicamente”. De onde viria essa pressão? Ao não explicar, o MRT dá a entender, na verdade, que a sociedade israelense estaria resistindo à pressão do imperialismo – isto é, que o imperialismo não apenas não sustenta, como estaria contra “Israel”!

Em outro trecho, o grupo afirma que “é provável que a necessidade de Netanyahu de perpetuar a guerra para permanecer no poder e escapar de problemas legais leve-o ao limite de flertar com a eclosão de uma guerra regional”. Isto é, o que move o primeiro-ministro é o medo de ser preso – por quem? -, ao mesmo tempo em que o que o limita é a pressão dos governos imperialistas. Em nem um único momento o MRT é capaz de reconhecer que a pressão dos países imperialistas sobre “Israel” nada mais é que o resultado da pressão popular sobre os governantes desses países, nem de reconhecer que o que Netaniahu mais teme é a mobilização da própria sociedade israelense.

Os erros de análise do MRT não são à toa. Eles derivam todos de um mesmo erro: para o grupo, “Israel” está em guerra sozinha. Não existe o outro lado. Não existe uma resistência palestina, que está impondo uma derrota militar tão grande a “Israel” que está derrubando todos os pilares de sustentação do sionismo.

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