No ano de 1974 a luta do Fatá, o maior partido do povo palestino, estava entre dois momentos de grande conflito. Os guerrilheiros palestinos haviam sido expulsos da Jordânia e se realocado no Líbano. “Israel” começou então a desestabilizar a política libanesa e a ameaçar de invadir o país, algo que seria feito em 1978. O dirigente do Fatá, Iasser Arafat, então teve a oportunidade de se pronunciar na Assembleia Geral das Nações Unidas. Até hoje a Palestina não é um membro pleno da ONU.
Após agradecimentos iniciais Arafat destaca a importância das lutas de libertação nacional: “em nome do povo da Palestina, aproveito esta oportunidade para parabenizar três Estados que recentemente foram admitidos como membros das Nações Unidas após obterem sua independência nacional: Guiné-Bissau, Bangladexe e Granada. Estendo nossos melhores votos à liderança desses Estados Membros e desejo-lhes progresso e sucesso”. Um país caribenho, um asiatico e um africano haviam conquistado independencia, isso era uma inspiração para o povo palestino.
Ele então coloca: “a questão da Palestina está sendo reexaminada pelas Nações Unidas, e consideramos esse passo uma vitória tanto para a Organização Mundial quanto para a causa do nosso povo. Isso indica novamente que as Nações Unidas de hoje não são as Nações Unidas do passado, assim como o mundo de hoje não é o mundo de ontem. As Nações Unidas de hoje representam 138 nações, um número que reflete mais claramente a vontade da comunidade internacional. Assim, as Nações Unidas de hoje estão mais aptas a implementar os princípios consagrados em sua Carta e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, bem como mais verdadeiramente capacitadas a apoiar causas de paz e justiça”.
É interessante, pois a ONU havia sido um dos principais responsáveis pela criação do Estado de “Israel”, ao mesmo tempo, a organização de fato havia se modificado e permitia uma atuação política maior do que existe hoje, por exemplo. No ano de 1975 chegou a ser votado na Assembleia da ONU que o sionismo é equivalente a racismo. Por aí fica claro como o momento permitia uma defesa maior da Palestina, hoje os sionistas conseguiram criar o absurdo oposto, leis que igulam anti sionismo a racismo. Mas é preciso deixar claro que isso nunca resultou em nada para os palestinos, a ONU apenas provia ajuda humanitária da mesma forma que faz hoje.
O discurso então parte para exaltar a luta daquele momento: “grande número de povos, incluindo os do Zimbábue, Namíbia, África do Sul e Palestina, entre muitos outros, ainda são vítimas de opressão e violência. Suas áreas do mundo estão dominadas por lutas armadas provocadas pelo imperialismo e discriminação racial, ambas meramente formas de agressão e terror. Esses são exemplos de povos oprimidos, compelidos por circunstâncias intoleráveis, a enfrentar tal opressão. Mas, onde quer que ocorra essa confrontação, ela é legítima e justa”. Aqui aparece o que era um paralelo claro na época. Os governos de tipo de apartheid da África eram equivalentes ao Estado de “Israel”.
A caracterização de Arafat é muito clara: “as raízes da questão palestina remontam aos últimos anos do século XIX, ou seja, ao período que chamamos de era do colonialismo e da colonização como a conhecemos hoje. Este é precisamente o período durante o qual o sionismo como um esquema nasceu; seu objetivo era a conquista da Palestina por imigrantes europeus, assim como colonos colonizaram, e de fato invadiram, grande parte da África. Este é o período durante o qual, jorrando do ocidente, o colonialismo se espalhou até os confins da África, Ásia e América Latina, construindo colônias em todos os lugares, explorando cruelmente, oprimindo e saqueando os povos desses três continentes. Esse período persiste até o presente. Evidências marcantes de sua presença totalmente repreensível podem ser facilmente percebidas no racismo praticado tanto na África do Sul quanto na Palestina”.
Ao fim do discurso ele conclui: “na minha capacidade formal como Presidente da Organização para a Libertação da Palestina e líder da revolução palestina, apelo a vocês para que acompanhem nosso povo em sua luta para alcançar a autodeterminação. Este direito é consagrado na Carta das Nações Unidas e tem sido repetidamente confirmado em resoluções adotadas por este corpo augusto desde a redação da Carta. Apelo ainda para que ajudem nosso povo a retornar à sua pátria de um exílio involuntário imposto a ele pela força das armas, pela tirania e pela opressão, para que possamos recuperar nossa propriedade, nossa terra e, posteriormente, viver em nossa pátria nacional, livres e soberanos, desfrutando de todos os privilégios de uma nação. Só então a criatividade palestina poderá ser concentrada no serviço à humanidade. Só então nossa Jerusalém retomará seu papel histórico como um santuário pacífico para todas as religiões”.
E fecha seu discurso de uma forma poética: “hoje eu vim trazendo um ramo de oliveira e a arma de um combatente pela liberdade. Não deixem o ramo de oliveira cair da minha mão. Repito: não deixem o ramo de oliveira cair da minha mão. A guerra se inflama na Palestina, e ainda assim é na Palestina que a paz nascerá”.