No artigo Bolsonaro preso e Trump impune, o blogueiro Eduardo Guimarães apresenta a sua leitura sobre a situação política no Brasil e nos Estados Unidos. A questão central, para ele, é que, enquanto no Brasil o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) estaria na iminência de ser preso, o ex-presidente republicano Donald Trump continuaria solto.
Trata-se, acima de tudo, de um chute, não de uma análise. Fato é que é difícil prever tanto o que acontecerá em um país como em outro. Mas o que merece ser debatido são os motivos que levam Guimarães a fazer a essa aposta.
Segundo ele, a grande diferença entre um país e outro seria que, no caso do Brasil, o regime político estaria mais comprometido com a “persecução penal dos golpistas que tentaram instituir uma ditadura militar no Brasil”. Embora não o diga explicitamente, o que Guimarães quer dizer é que, por algum motivo, o regime brasileiro estaria mais comprometido com os interesses da população do que com os interesses dos poderosos. Seria, portanto, um regime “independente” em relação às pressões políticas.
Sem nem questionar por que, de uma hora para a outra, o Brasil, que sempre foi um país controlado por mafiosos que assaltam os cofres públicos, entregam as riquezas para o estrangeiro e ainda aprovam leis para castigar o povo trabalhador, Guimarães afirma que “sempre nos vimos como uma nação sem leis, um país em que a impunidade impera”, mas que “o Brasil tem uma democracia muito mais sólida do que se poderia imaginar”.
É inacreditável ouvir isso da boca de alguém que, como Eduardo Guimarães, acompanhou de perto as ilegalidades da Operação Lava Jato e da condenação do hoje presidente Lula. O próprio blogueiro, ao denunciar que havia uma armação para que Lula fosse preso clandestinamente, passou a ser alvo de investigação naquela época. E o que mais se dizia naquele momento? Que a Lava Jato estava “passando o Brasil a limpo”. Que, pela primeira vez na história, os ricos estavam “sendo punidos”. Guimarães não desconfia minimamente que estamos diante da repetição do mesmo circo?
O fato é que, tanto no Brasil, como nos Estados Unidos, não tem ninguém “passando o país a limpo”. Alguém está investigando a venda criminosa da Eletrobrás? Alguém está investigando as falcatruas cometidas pelos generais militares, que participaram ativamente do 8 de janeiro? Alguém está investigando a infiltração sionista na Polícia Federal? Alguém está investigando os repasses de armas feitos pelo governo norte-americano a “Israel”? Não. Se os problemas mais sérios de ambos os países estão fora do radar dos ilustres investigadores da Polícia Federal, então não se pode falar em “passar a limpo”.
Tanto em um caso, como em outro, que está acontecendo é o mesmo que aconteceu durante a Lava Jato: o Estado está sendo utilizado como instrumento de uma classe para perseguir outra. No caso da Lava Jato, os maiores atingidos foram o Partido dos Trabalhadores (PT), que apresentava uma resistência ao programa neoliberal, e a setores da burguesia brasileira, que também se contrapunham à colonização total da economia por parte dos norte-americanos. Agora, há uma briga comandada pelo mesmo setor – o imperialismo – para tentar controlar o trumpismo e o bolsonarismo, uma vez que representam um setor mais fraco da burguesia.
A necessidade de utilizar um expediente como esse já revela, em si, um cenário de crise. Significa que os poderosos não estão conseguindo se entender, pois não há dinheiro para todos. Se é assim entre os capitalistas, que dirá entre os capitalistas e os trabalhadores? As medidas antidemocráticas utilizadas contra Bolsonaro e contra Trump serão utilizadas, em uma escala mil vezes maior, contra a população de ambos os países.
O próprio fato de que nem Bolsonaro, nem Trump foram presos, inclusive, apenas revela que não há compromisso dos burocratas do Estado com punir nenhum deles. Eles apenas estão a serviço do grande capital, que quer não eliminá-los do regime político, mas procurar chegar a um acordo mais favorável com eles. Se Bolsonaro permanecer solto, mas concordar em ceder terreno para o imperialismo, então está tudo feito. O mesmo valeria para Trump.
O imperialismo procura um acordo com ambos porque sabe que tanto o bolsonarismo quanto o trumpismo poderão ser úteis para conter a esquerda. Quando for o caso, Guimarães verá o quanto o regime de ambos os países é conivente com a corrupção e com todos os crimes imagináveis.
Na tentativa de convencer o leitor de sua tese, Guimarães saca da manga uma verdadeira pérola: “Alexandre de Moraes foi a melhor surpresa que o Brasil teve em décadas”. Seria um único homem o responsável por fazer o Brasil mudar de séculos de impunidade para uma perseguição implacável contra os inimigos do povo brasileiro. Nem uma criança de cinco anos acreditaria nisso.
Ao falar em “surpresa”, Guimarães dá a entender que Moraes, embora seja de direita, hoje estaria beneficiando a esquerda e os trabalhadores. Nada mais poderia estar errado. O juiz, conforme explicando, está a serviço dos maiores inimigos dos trabalhadores – o imperialismo. Ele mesmo reforçou isso quando, recentemente, elogiou o governo golpista de Michel Temer, imposto pelos norte-americanos contra mais de 54 milhões de votos.
A declaração de Moraes mostra claramente que ele não mudou. Quem mudou foi a esquerda que, quando o governo Dilma Rousseff estava sendo derrubado, denunciou, corretamente, que aquilo era um golpe. Que denunciou que Moraes, ao ser o único ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) indicado por Temer era, portanto, mais uma engrenagem do golpe. Hoje, essa mesma esquerda, apavorada com a extrema direita, capitula vergonhosamente diante do imperialismo e se contradiz.