O cenário político no Brasil foi preenchido nas últimas semanas, com maior intensidade, acerca do debate sobre a anistia ou não dos golpistas. A forma como o processo tem sido conduzido, o tempo em que as medidas estão sendo tomadas e as figuras que têm sido atingidas merecem a atenção das organizações populares.
A forma como o processo tem sido conduzido nos remete a avaliar que está centrado em aspectos individuais, em personalidades. Essa situação, claramente manobrada pela burguesia através de sua influência no aparato de Estado e nos meios de comunicação, tem o objetivo justamente de desviar para aquilo que é justamente o reflexo da construção dessa superestrutura da sociedade burguesa brasileira, ou seja, a formação das Forças Armadas enquanto ferramenta de aplicação de golpes de Estado, de defesa dos interesses dos capitalistas e do imperialismo.
Quanto à questão do tempo, é preciso levar em consideração quando as medidas supostamente de contragolpe estão sendo colocadas em prática. Por exemplo: durante o processo eleitoral de 2022, claramente o aparato de Estado por meio da Polícia Federal foi utilizado para tentar dar um golpe. Por que nada foi feito no calor do momento? Anteriormente ao golpe de 08 de janeiro de 2023, já havia inúmeros indícios de que estávamos em um contexto de golpe de Estado. Por que nenhuma medida foi tomada?
Apesar de ter ocorrido o indiciamento de determinadas figuras de significativa relevância política e militarmente, é preciso salientar que até o momento apenas alguns elementos de menor relevância e desqualificados foram presos. Essa situação nos remete novamente a questão do que é fundamental para os trabalhadores, que é como é constituída as Forças Armadas e sua doutrina militar.
As revelações feitas após dois anos do ocorrido tem sua relevância, isso é inegável. Mas uma operação desse porte só poderia ser colocada em marcha por meio de um aparato institucional que há anos trabalha contra os interesses nacionais e que tem o seu próprio povo como inimigo, ou seja, somente as Forças Armadas em seu conjunto, enquanto instituição estatal defensora dos interesses dos capitalistas poderia executar o que estava em marcha.
As operações da Polícia Federal e do Supremo Tribunal Federal tem um efeito midiático e ideológico que dão uma magnitude artificial que destoa do conteúdo concreto e dos resultados dessa ação política.
Conforme foi mencionado acima, o intuito é alardear com a prisão de figuras desqualificadas e com essa manobra política e midiática, manter a estrutura política-institucional das Forças Armadas. Porque os indivíduos políticos que figuram nos postos de comando desse aparato da superestrutura burguesa são completamente descartáveis, podendo ser substituídos. Mas a manutenção do essencial, do fundamento dessa instituição estatal, que é a defesa dos interesses dos capitalistas, do imperialismo, da propriedade privada e da exploração da classe trabalhadora, continuará intacta, podendo ser implementada por qualquer outro indivíduo comprado pela burguesia e seu aparato de estado.
Nesse sentido, a atuação despolitizada das organizações populares e de esquerda, bem como as organizações democráticas, leva todo o conjunto da sociedade para uma campanha que não garantirá resultados efetivos para aqueles que defendem os interesses nacionais e democráticos do país.
Isso nos faz perder uma grande oportunidade, em um momento onde se a tática política correta for utilizada, poderia ser levantado um grande e democrático debate nacional em torno das questões: qual modelo de Forças Armadas e doutrina militar é necessária para o país? Quais são as reivindicações dos trabalhadores diante de tal discussão? Prender meros indivíduos descartáveis para a burguesia ou esmagar o aparato de repressão e guerra que é voltado contra a própria população do país?
Algumas figuras políticas têm levantado a necessidade de reformular o artigo 142 da Constituição Federal. Essa medida realmente é algo necessário. Mas a mera mudança na letra da lei seria suficiente? Obviamente que não. O que é essencial para os trabalhadores são mudanças práticas, no dinamismo e no cotidiano das Forças Armadas, que atinjam o modo de agir e de atuar desse aparato estatal.
Desde o final da Segunda Guerra Mundial, as Forças Armadas são dominadas por uma cúpula e por uma doutrina militar que tem o objetivo de colocar o povo brasileiro e os interesses nacionais como inimigos, para garantir que as vontades e o domínio do imperialismo (principalmente dos EUA) prevaleçam no Brasil.
Por isso, não haverá verdadeira soberania nacional e efetivo combate ao golpismo no Brasil, sem que haja uma refundação das Forças Armadas sob uma doutrina militar nacionalista e que coloque como elemento fundamental a união cívico-militar onde o povo esteja como protagonista político-militar na defesa de nosso território e portanto de nossos interesses enquanto nação.