Em artigo publicado no Brasil 247, onde afirma que a decisão da Câmara dos Deputados de manter o deputado Chiquinho Brazão (sem partido) preso seria prova de que não existe ditadura do STF.
Chiquinho Brazão, deputado federal pelo União Brasil, é acusado de ser o mandante do misterioso assassinato de Marielle Franco, vereadora do PSOL executada em março de 2018. A prisão preventiva do deputado foi determinada pelo Supremo Tribunal Federal, em decisão que rasgou ao meio a Constituição Federal, somando-se a outras tantas decisões inconstitucionais da corte que deveria ser defensora da constituição.
Afirma a Constituição, que deveria determinar a atuação do STF e, inclusive, de todo o Poder Judiciário: “Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. (…) § 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão”.
Alexandre de Moraes, espertamente, falou que o crime não era o homicídio de Marielle, claro que não, jamais. Mas o de “obstrução de justiça em organização criminosa”. O “em organização criminosa” surgiu apenas para cobrir a necessidade de ser crime inafiançável. Uma pixotada jurídica inacreditável.
Já preso, a Câmara dos Deputados foi chamada a decidir se mantém ou não a prisão ilegal do deputado Chiquinho Brazão. Ou seja, foi chamada a decidir algo já decidido. E decidiu pela manutenção da prisão preventiva. Foram 277 votos favoráveis, 129 votos contra a prisão e 28 abstenções. Resta saber se caso a Câmara tivesse derrubado a prisão preventiva de Brazão, todos os parlamentares que votaram a favor disso seriam presos pelo jocoso crime de “obstrução de justiça em organização criminosa”. De toda sorte, um recado para o STF: pelo menos 129 deputados federais tentaram soltar Chiquinho Brazão, ou seja, tentaram cometer o crime de “obstrução de justiça em organização criminosa”. E outros tantos se ausentaram, provavelmente em apoio velado ao deputado.
Sobre Aquiles Lins, ao ver tamanha barbaridade do STF e a votação da Câmara, o máximo que pôde falar é que “o resultado da votação representa uma vitória de todas as pessoas que lutam por justiça por Marielle e Anderson, dentro e fora das fronteiras brasileiras. Depois de seis anos de obstrução judicial e leniência com a impunidade, o estado e suas instituições competentes estão seguindo o caminho da responsabilização de todos os envolvidos nesta barbárie”.
O que aconteceu foi que a decisão ilegal e arbitrária do STF foi chancelada pela Câmara dos Deputados e, não é preciso dizer, o medo talvez tenha sido o melhor argumento. Isso não é vitória para ninguém, muito menos para quem luta por justiça. Uma coisa é lutar por justiça, outra coisa é lutar por juízes. Mais suspeito que todo o ocorrido até agora é que a “revelação” do caso apareça seis anos depois.
E o raciocínio do colunista do Brasil 247 é justamente esse: “o Supremo Tribunal Federal é o maior fortalecido da votação da Câmara. Apesar de enfrentar no Congresso uma série de pautas que tentam limitar sua atuação constitucional, a Suprema Corte, e especialmente o ministro Alexandre de Moraes, obtêm do campo político uma chancela importante e oportuna diante de um crime que deixou uma ferida aberta no país. Além disso, no momento em que o Brasil é vítima de um ataque internacional da extrema-direita com as falsas acusações feitas pelo bilionário Elon Musk, a decisão soberana da Câmara mostra que não vivemos na ditadura mal desenhada por Musk e seus engenheiros do caos”.
O que aconteceu no caso Chiquinho Brazão não prova que não existe uma ditadura do STF, pelo contrário, prova que o Estado brasileiro é uma anarquia jurídica total. Diante dessa selva, o STF é o principal expoente da arbitrariedade. A decisão da Câmara apenas reforça o arbítrio no Brasil e revela que a política golpista está dentro das instituições, não fora delas.
Ninguém se pergunta por qual motivo existe essa proteção do parlamentar na Constituição Federal. Simples, é uma garantia contra a perseguição política, especialmente em um regime recém saído da ditadura militar. A Constituição é de 1988. Mas, para a esquerda pequeno burguesa, não, o importante é quebrar essa proteção e entregar o regime político do país para gente que não foi eleita. Mas isso não é um dos sinônimos de uma ditadura? Sim, é.
O mais irônico e até mesmo perturbador é que o STF e a Polícia Federal estiveram à frente de todas as ações do golpe de Estado de 2016, golpe que abriu o campo para o desenvolvimento do bolsonarismo. Mas isso é passado, é preciso “virar a página do golpe”, como diria certo senador.
Foi o próprio Alexandre de Moraes que disse, ainda em 2023, que o golpe contra Dilma Rousseff foi dentro das “regras do jogo” e que isso “é prova de maturidade política e democrática (…) Não houve necessidade de nenhuma medida de exceção”.
A Constituição Federal não foi feita para ser cumprida ao sabor de ministros e juízes que atendem os interesses políticos de momento. Isso, sim, é uma ditadura. A proteção ao parlamentar, a imunidade, a prisão ser possível somente em flagrante, e no caso de crime inafiançável, é uma garantia histórica do parlamento, que busca se proteger dos desmandos dos demais poderes, seja do Executivo, seja do Poder Judiciário. Esse último em especial, pois, ao contrário do que pensam alguns, o fato de ninguém ser eleito no judiciário o torna o poder mais arbitrário possível, que não se controla pelo voto, que o povo não tem acesso nenhum, e que, por isso mesmo, foi fundamental em todos os golpes que o Brasil sofreu até hoje.