Na última terça-feira (28), a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei do Programa de Mobilidade Verde e Inovação, no qual continha um dispositivo que dá fim à isenção dos impostos federais sobre compras estrangeiras, isenção que cobria compras de até 50 dólares, fixando uma taxa de 20% a ser cobrada.
O projeto foi descrito como um “projeto de incentivo à indústria”, segundo o sítio da Câmara dos Deputados. Supostamente com o objetivo de incentivar a indústria automobilística, o projeto estabelece o fim da isenção fiscal a compras feitas no estrangeiro abaixo dos cinquenta dólares, prática que se tornou comum com a popularização de plataformas como Shein, AliExpress, Alibaba etc. A inclusão no projeto de lei do fim da isenção foi fruto de um acordo feito por Arthur Lira (PP), deputado federal e atual presidente da Câmara dos Deputados.
O projeto, que teve apoio da maioria dos partidos e parlamentares da Câmara, foi aprovado sob pressão de um grande lobby, com registros de conversas via WhatsApp entre Lira e o empresário Luciano Hang, proprietário das lojas Havan e apoiador de Jair Messias Bolsonaro, ex-presidente do país. Votaram a favor tanto governo, quanto oposição, com o líder da bancada do Partido dos Trabalhadores (PT), Odair Cunha (MG), saindo em defesa da medida, afirmando que “é uma concertação de todos os partidos com o Poder Executivo para proteger a indústria nacional”.
Fernando Haddad (PT), Ministro da Fazenda, também defendeu a medida, dizendo que a taxação “não pode ser tratada do ponto de vista partidário”, e que “é uma questão que tem a ver com igualdade de competição, as pessoas estão em busca desse equilíbrio, e o Congresso está fazendo uma mediação entre os vários interessados.”
O Presidente Lula (PT) cogitou vetar o projeto, uma vez que o mercado consumidor dos produtos estrangeiros baratos e que obtinham uma vantagem significativa com a isenção fiscal nas compras até 50 dólares, e de que isso prejudicaria as relações do país com a China, que é o principal parceiro comercial do Brasil. Durante as negociações na Câmara que alteraram a proposta inicial do deputado Átila Lira (PP), relator do projeto, de manter a alíquota de 60% para compras abaixo de US$50, mesmo alíquota cobrada pelo Imposto de Importação, o governo Lula defendia a manutenção da isenção, argumentando exatamente que esses produtos são adquiridos majoritariamente pela população pobre do país
Agora, as compras até US$50 serão tarifadas em 20% da alíquota aprovada por Lira, mais os 17% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços, de responsabilidade estadual, cobrado “por fora e por dentro”, o que alavanca ainda mais a tarifa sobre o consumo dos mais pobres, levando a tributação efetiva para cerca de 44,5% dos produtos.
Diante da situação que deve reduzir ainda mais o consumo da população pobre, a empresa varejista AliExpress divulgou uma nota, afirmando como será prejudicial a nova tributação.
Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o brasileiro que recebe um salário mínimo por mês, comparado a um milionário, compra determinado produto por R$100 e ambos pagam a mesma alíquota, em torno de 45% em tributos sobre o valor do produto que pode variar para mais, dependendo do ICMS. Estudos revelam que uma parcela de 10% dos mais pobres compromete o equivalente a 21,2% da renda com o que se chama “tributos indiretos”. Já os 10% mais ricos desembolsam apenas 7,8% da renda com a mesma finalidade.
Os impostos sobre o consumo, no geral sobre bens e serviços, representaram 40,2% (R$1,3 trilhão) da receita tributária geral do país em 2022, segundo o Estudo Especial Nº19 da Instituição Fiscal Independente, e dominam a arrecadação do país, punindo a população pobre e fazendo com que ela pague pelos gastos do Estado que compromete, em média, metade de toda a sua arrecadação trilionária com os banqueiros através da dívida pública, além de outras formas de transferência de renda inversa, onde o pobre transfere sua renda para os ricos.
E na linha de privilegiar os ricos, o Brasil se destaca. Apesar de constar na Constituição Federal, no artigo 153, que compete à União instituir impostos sobre grandes fortunas mediante uma lei complementar, isso nunca de fato se deu. O Brasil é um dos poucos países no mundo em que não existe um imposto sobre lucros e dividendos, além de determinar o pagamento de imposto de renda para quem recebe praticamente dois salários mínimos.
Mesmo que a tributação recaia sobre a Lei Orçamentária Anual, essa será sem dúvidas transferida ao consumidor, em geral, pobre, tendo em vista que 85% da população ganha menos de R$5.000 por mês, segundo dados do Dieese.