Neste sábado (24), Pavel Durov foi detido na França por acusações ligadas a usos criminosos do aplicativo Telegram, incluindo terrorismo, tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e fraude, o que poderia levar o bilionário de 39 anos à prisão por até 20 anos.
Durov, nascido na Rússia, mas cidadão de diversos Estados (incluindo o francês), é co-fundador da rede social russa VK, assim como co-fundador e CEO do Telegram, uma das redes sociais mais populares do mundo cujas funcionalidades se assemelham ao Whatsapp. Sua prisão na França (“terra dos direitos humanos”), decretada por não cooperar com as autoridades do país, veio como uma confirmação dos rumos que as ditas “democracias” ocidentais vem tomando.
A posição ideológica do CEO do telegram, negando a cooperar com qualquer ente estatal que tente bisbilhotar as conversas de seus usuários não é nova. Aliás, este foi o motivo que o levou a sair da Rússia ainda em 2014, quando denunciou as tentativas do Kremlin em controlar a rede social VK, empresa em que foi co-fundador e CEO. Pavel, então enamorado pelas ditas “democracias” liberais, pensou que vivendo na Europa ocidental, teria seu direito à privacidade (e o dos usuários do Telegram) garantidos.
Após a prisão de Durov, algumas contas no X (antigo tweeter) começaram a divulgar uma suposta fala de Dmitry Medvedev, ex-Primeiro Ministro e ex-Presidente russo, que comentou sobre a prisão do CEO:
Há algum tempo, perguntei a Durov por que ele não queria cooperar com a polícia em crimes graves. “É uma questão de princípio”, disse ele. Eu lhe disse: “Isso causará sérios problemas em qualquer país”.
No entanto, para Edward Snowden, ex-funcionário da CIA e da “National Security Agency” – NSA (Agência de Segurança Nacional) que está refugiado na Rússia desde que revelou um enorme esquema de espionagem interna nos EUA, a prisão de Durov é um ataque direto a liberdade de expressão. E mais, para o estadunidense, o que o Estado francês está fazendo, nada mais é que a tomada de “reféns”.
O presidente francês, Emmanuel Macron, também utilizou da rede social X para justificar as ações do Estado, além de se distanciar da tomada de decisão, alegando que a prisão é apenas uma ação corriqueira do judiciário francês e que não é politicamente motivada.
Apesar dos argumentos apresentados pelo presidente, a notícia da prisão de Pavel Durov foi percebida pela própria população francesa como mais uma forma de calar as críticas que atingem o governo Macron, basta lembrar que grande parte dos grupos envolvidos nas mobilizações populares dos últimos 4 anos em solo francês, utilizaram o Telegram para se comunicarem. Aliás, os franceses não são os únicos a empregarem a rede social em seu dia-a-dia. Na guerra russo-ucraniana, ambos os lados utilizam do Telegram para coordenar movimentos de tropas, evacuações e até mesmo informar a população sobre a guerra diretamente da linha de frente.
A conveniência da prisão do CEO do Telegram, em um momento em que a plataforma contava com quase um bilhão de usuários, também traz questionamentos sobre a democracia francesa. Afinal, por qual motivo Durov foi indiciado agora e não antes? Afinal, o CEO do Telegram já era um cidadão francês e residia no país muito antes dessa operação.
O recrudescimento das chamadas “democracias” ocidentais não é um fenômeno novo, apesar desta nova leva de repressão que emerge da pandemia de 2020 e se aprofunda durante a guerra russo-ucraniana, já no início do novo milênio temos nos EUA o amanhecer do Patriot Act e suas consequências, como a Agência de Segurança Nacional – NSA.
No entanto, é importante destacar que os atuais regimes de países capitalistas avançados que, durante décadas (e alguns até mesmo séculos), conseguiram manter o verniz “democrático”, hoje revelam suas verdadeiras cores autoritárias. Tal questão — a falta de democracia nos países capitalistas avançados — é um problema de profundas consequências, em especial porque toda a propaganda imperialista atual está montada na ideia de que os países membros da OTAN são os campeões da vontade popular, enquanto países como China, Irã e Rússia são ditaduras sanguinárias. A falsa dicotomia entre democracias e ditaduras torna-se cada dia menos convincente.
A necessidade de esconder a verdadeira natureza autoritária dos autoproclamados regimes “democráticos”, é uma das razões que levaram toda a União Europeia, assim como os EUA e suas empresas, a bloquearem grupos de telecomunicações russas (como a RT). Por qual motivo um Estado bloqueia o acesso a informações vindas de um país terceiro em que supostamente não possui hostilidades?
A prisão de Pavel Durov neste sábado, por não cooperar com a justiça francesa, ainda é cercada de mistérios. No entanto, o que podemos observar é que o CEO do Telegram possui uma firme posição ideológica contra a insistência do Estado em adentrar o domínio privado de seus cidadãos. Também podemos observar um crescente movimento nas “democracias” ocidentais, que consiste em restringir os direitos individuais e políticos de seus cidadãos. Se a percepção de Snowden se provar mais uma vez correta, os verdadeiros criminosos estão no Estado francês.
