Liberdade de expressão

Liberdade de expressão deve estar na agenda da esquerda

As políticas de cerceamento das liberdades só favorecem a direita, que quer manter o controle da circulação de informação

A liberdade de expressão, embora seja um direito claramente consagrado na Constituição, vem sendo reinterpretada à luz de um aparente bom-mocismo, que lhe acrescenta uma série de ressalvas e condições. Tornou-se comum o debate em torno de seus hipotéticos “limites”. Posta dessa maneira, a discussão se direciona a saber onde seriam fincadas as balizas que garantiriam a paz e o respeito entre os indivíduos. Pressupõe-se, então, que um Estado com mais leis que disciplinem a liberdade de manifestação do pensamento trará mais progresso à sociedade.

Quem insere em buscador de internet o tópico “liberdade de expressão” obtém entre as primeiras respostas textos não assinados que, à maneira de verbetes enciclopédicos, ensinam que, sim, existem limites. Estes passaram a fazer parte das definições, como se não fossem exatamente o ponto em disputa. Liberdade limitada é ou não é liberdade?

Lemos, na página da Fia Business School, que “obviamente, ter liberdade para mostrar, publicar ou difundir os pensamentos não significa que isso possa ser feito sem respeitar alguns limites” e que, “para viver bem em sociedade, é essencial estar atento a declarações que possam, por exemplo, ofender as preferências, origens e o estilo de vida de outros indivíduos”. Mais adiante, veremos o seguinte: “No que diz respeito à parcela destinada à dignidade humana, significa que a liberdade de expressão é um requisito imprescindível para que cada um possa se expressar, sem censura, e manifestar seus pontos de vista. Isso vale para os mais variados assuntos, desde que essas opiniões não afetem outros direitos”. Essas lições lembram os antigos livros de Educação Moral e Cívica da época da ditadura militar. Em suma, temos liberdade, mas apenas para dizer “coisas boas”, aquelas que os juízes julgarem “boas”…

Na página do Brasil Escola, da Rede Omnia, o que não falta são textos sem assinatura, que se apresentam como explicações escolares sobre os mais variados temas (é um dos sites frequentemente usados por estudantes). Lá temos o seguinte:  “Nesse contexto, ela [a liberdade de expressão] é entendida como o direito de expressar opiniões, ideias e pensamentos sem censura ou interferência governamental ou privada. Ela proporciona a base para o livre intercâmbio de informações, o debate público e a diversidade de perspectivas. No entanto, a liberdade de expressão não é um direito absoluto e enfrenta desafios e limites em diferentes contextos, como questões de incitamento ao ódio, discurso de ódio e desinformação. Além disso, a era digital trouxe consigo novos desafios, como a responsabilidade das plataformas on-line e a proteção da privacidade. Diante dessas complexidades, é fundamental encontrar um equilíbrio entre a liberdade de expressão e outros direitos, garantindo um ambiente inclusivo e seguro para o exercício das liberdades”.

Nesse texto, além de explicitarem alguns dos supostos “limites” (“incitamento ao ódio, discurso de ódio e desinformação”), acrescentam como ponto pacífico a questão da “responsabilidade das plataformas on-line”, que é outro tema em debate na sociedade. A quem interessa cercear a internet e manter sob controle a circulação de informação?

A Wikipedia, que é um dos mais populares sites enciclopédicos, vai na mesma linha: “A liberdade de expressão (de fala e de expressão), portanto, não pode ser reconhecida como absoluta, e as limitações ou limites comuns à liberdade de expressão estão relacionados com difamação, calúnia, obscenidade, pornografia, sedição, incitação ao crime, palavras incitadoras à violência, discurso de ódio, informações censuradas, violação de direitos autorais, segredos comerciais, rotulagem de alimentos, acordos de não divulgação, direito à privacidade, dignidade, direito ao esquecimento, segurança pública e perjúrio”. E ainda: “A ideia do ‘princípio da ofensa’ também é utilizada para justificar limitações de fala, descrevendo a restrição a formas de expressão consideradas ofensivas à sociedade, considerando fatores como extensão, duração, motivos do locutor e facilidade com que poderia ser evitada. Com a evolução da era digital, a aplicação da liberdade de expressão torna-se mais controversa à medida que surgem novos meios de comunicação e restrições”.

São muitos os textos que apresentam o problema dessa maneira, como se fosse consensual a ideia de que é preciso “limitar” a expressão.  Qual seria a diferença entre limitar e censurar? Mero jogo de palavras: “limitar” é um eufemismo que torna mais palatável para a esquerda e para a direita bem penteada a defesa da censura.

É preciso admitir que a política identitária, que vem tentando promover um novo tipo de sensibilidade, contribui bastante para essa defesa disfarçada da censura. Os termos “inclusão” e “diversidade” são constantemente usados como justificativa para o cerceamento da liberdade.  Como os identitários têm reivindicações “simbólicas” – o que mostra que são basicamente gente de classe média em ascensão –, suas lutas enfocam o uso de palavras, escolha de pronomes, etimologias fantasiosas, enfim, uma folha corrida de “delitos linguísticos”, que, em dias de delírio, chegam a incluir entre as ofensas supostamente “racistas” expressões como “caixa-preta” ou “buraco negro”.

No caso do racismo, em particular, embora já houvesse lei que punisse atos de discriminação racial, foi aprovada no início de 2023 a lei da injúria racial, que tipifica “crimes de fala”. As punições previstas nessa lei são mais severas quando a ofensa se dá em ambiente recreativo, daí os célebres casos de humoristas de stand-up que têm enfrentado as barras dos tribunais por contarem certas piadas – não demora que, por justiça, a plateia que ri dessas piadas também seja enquadrada. O STF, lançando mão de uma “analogia”, estendeu os efeitos dessa lei para ofensas de cunho “transfóbico”. Nada impede que outras analogias sejam feitas. Veja-se, a propósito, que o lobby sionista tem feito esforços para que as críticas ao Estado de Israel sejam tipificadas como “antissemitismo” e, por analogia, enquadradas na mesma lei da injúria racial.

É preocupante que a crítica à política identitária e à defesa da censura (mesmo que seja “em nome do bem”) seja associada à direita. A direita finge defender a liberdade de expressão, mas a deseja só para os seus, não como um princípio. No caso dos sionistas, que no Brasil cerram fileiras com os bolsonaristas e outros direitistas mais “limpinhos”, fica muito claro quanto as políticas identitárias de cerceamento das liberdades podem ser bem usadas pela direita. A luta pelas ideias deve ser travada sem censura. Quanto mais informação e mais liberdade para discutir e argumentar, melhor para a sociedade.

 

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