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Espanha

Justiça quer jogar homem na cadeia por uma beijoca

Histeria identitária após "selinho" de ex-cartola pode resultar em uma condenação de dois anos e meio de prisão

Após ser demitido da Real Federação Espanhola de Futebol (RFEF) por um beijo, Luis Rubiales, ex-presidente da federação, é agora ameaçado de enfrentar dois anos de prisão pelo episódio, ocorrido durante a conquista da Seleção da Espanha na Copa do Mundo de Futebol Feminino, em 2023, em Sidney, na Austrália. Segundo um documento judicial revelado pela agência de notícias Reuters na última quarta-feira (27), a promotora Marta Durantez acusa o ex-cartola de agressão sexual e coerção, crimes que, combinados, podem resultar em penas de prisão de até 2 ano e meio.

Durantez também acusa o ex-técnico da equipe feminina, Jorge Vilda; o atual diretor esportivo da Federação Espanhola, Albert Luque; e o chefe de marketing da entidade, Ruben Rivera, de coagir Hermoso a dizer que o beijo foi consensual. A acusação diz que os três dirigentes exerceram “constantes e repetidos atos de pressão” diretamente contra a jogadora e por meio de seus amigos e familiares. Cada um deles também poderá ser condenado a 18 meses de prisão.

Além disso, a promotora pede uma ordem de restrição que impeça Rubiales de se aproximar a Hermoso a uma distância inferior a 200 metros e de se comunicar com a atleta pelos próximos sete anos e meio. Por fim, Durantez pede uma indenização à atleta no valor de €50 mil (R$270 mil), a serem pagos por Rubiales, e outra, no valor de €50 mil, a serem pagos por Vilda, Luque e Rivera juntos.

Conforme as leis espanholas, penas inferiores a dois anos de prisão não resultam em encarceramento, o que coloca Rubiales sobre grave ameaça de acabar preso por uma simples beijoca.

Enquanto premiava as atletas pela conquista do título inédito, o então presidente da RFEF deu o que brasileiros chamam de “selinho” ou “bitoca” na jogadora espanhola. O gesto corriqueiro, no entanto, desencadeou uma onda de histeria, com uma espécie de competição pelo pior adjetivo ao beijo. Em entrevista à tradicional revista norte-americana The Atlantic, a jogadora da seleção norte-americana Megan Rapinoe usou o termo “fisicamente atacada” para falar sobre a colega espanhola:

“[Franklin] Foer: Um dos momentos mais ridículos que já assisti em todos os esportes foi quando o chefe da federação espanhola de futebol beijou uma jogadora na boca enquanto a parabenizava.
Rapinoe: Isso me fez pensar no quanto somos obrigados a suportar. Pense no quanto aquela equipe espanhola teve de suportar: algumas das jogadoras que se levantaram no ano passado [para protestar contra o mau tratamento dado pelo técnico e pela federação] ainda não estão no time. Talvez isso tenha sido algo que os galvanizou, mas isso não deveria ser necessário.

Havia outra imagem que sinaliza um nível tão profundo de misoginia e sexismo naquela federação e naquele homem [Luis Rubiales, presidente da federação espanhola de futebol] no apito final, apenas agarrando sua virilha. Em que tipo de mundo de cabeça para baixo estamos? No maior palco, onde se deveria estar comemorando, Jenni [Hermoso, a meio-campista espanhola que foi beijada por Rubiales] tem de ser agredida fisicamente por esse cara. [Nota do editor: Rubiales já se desculpou publicamente pelo beijo].”

O jornal madrileno Marca reproduziu uma denúncia contra Rubiales aberta por Miguel Galán, presidente da Escola Nacional de Treinadores de Futebol da Espanha, acusando o ex-cartola de “um ato sexista intolerável no esporte”. “Cabe, portanto”, continua a denúncia reproduzida na matéria, “ao Conselho Superior de Deportes transferir minha queixa ao Tribunal Administrativo do Deporte para iniciar um processo para investigar o alcance do ato regulamentado pela nova lei do esporte”.

Já o órgão de imprensa do imperialismo alemão DW questionou se a beijoca era “um gesto humano ou um gesto de poder”:

“A imprensa, as organizações feministas e os especialistas apontaram que o beijo de Luis Rubiales ocorreu em meio a um ambiente profissional, portanto, não eram duas pessoas em igualdade de condições, mas parte de uma hierarquia. ‘É um fato simbólico que revela uma grande atitude machista subjacente que está constantemente escondida, mas que desta vez veio à tona’, diz Begoña Marugán, socióloga e professora da Universidade Carlos III de Madri, em entrevista à DW.”

O órgão do imperialismo britânico BBC, por sua vez, publicou uma matéria trazendo uma cronologia dos eventos desencadeados pelo selinho, até concluir que:

“Todas essas medidas estão sendo bem recebidas pelos críticos de Rubiales e defensores de Hermoso, que veem no beijo e na atitude do dirigente um sinal de sexismo, abuso de poder e um sintoma da necessidade de mudanças nas estruturas do futebol.”

O ultra-identitário jornal espanhol El País usou as palavras da atleta espanhola no vestiário (“eu não gostei”) para dizer que “o gesto de Rubiales, que também já beijou efusivamente o rosto de outros jogadores e até os levantou em seus braços, gerou muitas críticas nas redes sociais”. A matéria do El País cita o vídeo abaixo, onde a festa pela conquista e a descontração depõe contra o clima de “agressão física”:

É perfeitamente normal que a atleta não tenha gostado da beijoca. Daí a transformar o ato em uma “agressão física”, “um gesto de poder” e um “abuso” vai uma distância enorme. Comentando a nova repercussão do caso, o presidente nacional do Partido da Causa Operária (PCO) denunciou que o caso mostra as tendências do identitarismo de empurrar o mundo “de volta para a Idade Média”.

“Dois anos de prisão por beijo indevido. A justiça espanhola com certeza está tendo uma crise sexual. O caminho de volta para a Idade Média está pavimentado pelas boas (?) intenções.”

 

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