Na última segunda-feira (16), a 12ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal condenou Filipe Martins pelo “crime” de ajustar sua lapela. O juiz encarregado do caso atribuiu um significado supostamente racista ao gesto de Martins, condenando-o conforme a interpretação dada.
O episódio que levou à condenação ocorreu em março de 2021, durante uma sessão no Senado. À época, Martins ocupava o cargo de Assessor Especial para Assuntos Internacionais do governo Jair Bolsonaro.
Durante a sessão, Martins realizou um gesto que se assemelha ao sinal de “OK”, usado corriqueiramente no Brasil e em outros países. Esse gesto foi apropriado por grupos de extrema-direita supremacistas brancos, em que os três dedos esticados para cima formariam um “W”, de White, e o polegar com o indicador formariam a volta do “P”, de Power – indicando a frase supremacista White Power (Poder Branco, em tradução livre). Entretanto, a confirmação da intenção de Martins com o gesto vem tão somente da interpretação do juiz. Afirmar que o gesto é um sinal de “OK” ou de White Power é simplesmente impossível.
Martins realizou o gesto durante uma sessão do Senado na qual o presidente da Casa Rodrigo Pacheco, anunciava a presença do então ministro das Relações Internacionais, Ernesto Araújo. O ministro iria proferir um discurso sobre a atuação da pasta na compra de vacinas contra a Covid-19.
Após a sessão, Martins foi denunciado pelo Ministério Público Federal:
“Filipe Garcia Martins, com vontade livre e consciente, praticou, induziu e incitou a discriminação e o preconceito de raça, cor e etnia, em detrimento da população negra em geral e contra outros grupos sociais não brancos, como pardos, asiáticos e indígenas, mediante a realização de gesto apropriado por movimentos extremistas com simbologia ligada à ideia de supremacia branca”, diz a denúncia.
Além disso, o MPF afirmou que, ao realizar tal gesto, Martins se localizava atrás do presidente do Senado, conferindo-lhe “grande visibilidade”.
A decisão absurda do juiz David Wilson de Abreu Pardo enquadrou a ação na Lei de Crimes Raciais, por “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Martins foi condenado a 2 anos e 4 meses de reclusão, a serem cumpridos inicialmente em regime aberto. Contudo, a decisão foi substituída por pena privativa de liberdade.
Pardo determinou a prestação de 850 horas de serviço comunitário e o pagamento de mil reais durante 14 meses, valor que deve ser destinado a uma instituição social, além de R$8.250 em multa e R$30 mil por danos morais.
Martins alegou que o gesto era apenas para ajustar a lapela do próprio terno, sustentando que não houve um gesto voluntário de conotação racista. A defesa do então assessor argumenta – de forma justa – que o gesto não é o mesmo representado pelo MPF na denúncia e que o órgão seria incapaz de provar que a interpretação racista deveria prevalecer sobre quaisquer das “inúmeras” outras interpretações possíveis.
Apesar disso, o juiz responsável pelo caso, após analisar as provas e argumentações do processo, concluiu que Filipe Martins “realizou voluntariamente o gesto reputado criminoso pela acusação, não se tratando de ajuste da lapela do paletó”. “A voluntariedade na realização do gesto é respaldada pela circunstância de o réu olhar para a sua própria imagem, enquanto gesticulava, ao mirar para a tela que transmitia em tamanho maior o presidente do Senado (com isso, a sua própria, de corpo quase inteiro, sentado em cadeira próxima à parede do fundo)”, afirmou David Wilson de Abreu Pardo.