Nesta quarta-feira, 15 de maio, a Polícia Militar do estado de Pernambuco impediu que um grupo de manifestantes seguisse em caminhada pela rua Gonçalves Maia, localizada no centro da cidade do Recife. Conforme apurado por nossa equipe, a ordem para que a passeata fosse bloqueada pela polícia teria partido do consulado dos Estados Unidos, localizado a menos de 15 metros do “paredão” formado pelos agentes da repressão.
“Quando perguntamos o motivo do bloqueio, a resposta foi a de que eles receberam uma denúncia de que alguém iria jogar alguma coisa dentro do Consulado”, nos contou um manifestante que preferiu não revelar seu nome, por medo de represália estatal.
Durante a manifestação, nossos repórteres perguntaram ao comandante do batalhão ali presente quem iria jogar alguma coisa e que coisa seria essa. Não houve resposta. Nossos repórteres também perguntaram a representantes das organizações presentes se haveria de fato a intenção de jogar qualquer objeto no Consulado. Todas negaram.
De acordo com a advogada Marina Dias, presente na manifestação, ainda que houvesse de fato esse intuito, ele não justificaria o bloqueio da rua. “A rua é pública e o direito à manifestação está assegurado no artigo 5º da Constituição Federal“. O artigo mencionado pela advogada estabelece que:
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(…) II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
(…) IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
(…) IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
(…) XV – é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;
(…) XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;
(…) XVII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar.”
A advogada também mencionou, em sua fala no carro de som, que a iniciativa da Polícia Militar era um “atentado à soberania nacional”. Segundo denunciou, os agentes da repressão não foram enviados por uma decisão da governadora do estado, Raquel Lyra (PSDB), mas sim, conforme confessado pelos próprios policiais, pelo Consulado norte-americano. Isto é, pelo governo norte-americano.
“Não bastasse ser um crime contra as liberdades individuais, é também um crime executado por um país estrangeiro“, disse ela à nossa equipe. O mesmo artigo 5º da Constituição garante que: “(…) XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais“.
A presença da Polícia Militar despertou muita revolta entre os manifestantes presentes. Os principais blocos do ato, o dos estudantes grevistas das instituições federais de ensino e do Partido da Causa Operária (PCO), gritaram repetidamente palavras de ordem como “não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da Polícia Militar” e “chega de chacina, PM na favela e ‘Israel’ na Palestina”.
“Desde a concentração do ato, notamos uma movimentação estranha”, declarou Victor Assis, militante do PCO. “Por duas vezes, o tenente responsável pelo batalhão policial veio até nossa barraca para perguntar quem eram os organizadores e para onde o ato marcharia. Quando negamos qualquer informação, eles insistiram, dizendo que era para a ‘segurança dos manifestantes’. Agora ficou claro: era para a segurança dos assassinos de crianças palestinas que se encontram encastelados no Consulado norte-americano”.
Durante o impasse em frente ao Consulado norte-americano, vários manifestantes, tanto do carro de som, como do chão, relacionaram a ação da Polícia à proteção dos crimes cometidos pelo Estado de “Israel”. Em um dos pontos altos do ato, manifestantes gritaram “chega de caô, policial não é trabalhador”, deixando claro o papel que desempenha o aparato de repressão.
A manifestação terminou no horário previsto, às 19h, sem registro de confrontos.
Organizado pelo Comitê de Solidariedade Palestina-Pernambuco, o ato fazia alusão aos 76 anos da Nakba (“catástrofe”, em árabe), como é conhecido o processo de limpeza étnica da Palestina. O ato teve concentração na Praça do Derby, no centro do Recife, e começou às 16h.
O maior destaque do ato foi para a presença do vice-presidente do Instituto Brasil-Palestina, Sayid Marcos Tenório. Em sua fala, Tenório destacou a importância dos grupos do Eixo da Resistência na luta pela libertação da Palestina.
Outro lado
Nossa equipe tentou entrar em contato com o Departamento de Imprensa da Secretaria de Defesa Social de Pernambuco, mas não obteve resposta em nenhum dos telefones repassados. Não foi informado qualquer endereço de e-mail pelo qual poderia ser feito o contato.