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Henrique Áreas de Araujo

Militante do PCO, é membro do Comitê Central do partido. É coordenador do GARI (Grupo por Uma Arte Revolucionária e Independente) e vocalista da banda Revolução Permanente. Formado em Política pela Unicamp, participou do movimento estudantil. É trabalhador demitido político dos Correios e foi diretor da Fentect (Federação Nacional dos Trabalhadores dos Correios)

Coluna

Funk e sertanejo: dois pesos e duas medidas

Dois estilos comerciais e decadentes, mas por que esquerda identitária bajula o funk e hostiliza o sertanejo?

A esquerda pequeno-burguesa tem uma tendência ao oportunismo e à demagogia. Aos amigos tudo, aos inimigos, o achincalhamento.

Dois episódios recentes chamaram a atenção sobre o comportamento de setores da esquerda em relação a dois assuntos.

O primeiro foi a declaração do ator Pedro Cardoso, em entrevista à Rádio Bandeirantes, que criticou a música sertaneja atual que, segundo ele, seria “a música do fascismo brasileiro”:

“Não sei se tem algum artista verdadeiro ali. Mas, na minha opinião, é uma temática completamente monótona e de baixíssima inspiração. Não é à toa que essa é a música do fascismo brasileiro. É uma música vazia, de interesse teórico, sobre assunto nenhum. É uma música sobre nada, sobre ser corno ou não ser corno”

A opinião de Pedro Cardoso encontrou certa ressonância no meio da esquerda.

O outro episódio foi o da palestrante travesti Tertuliana Lutosa, funkeira e professora universitária. Em palestra na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), ela subiu na mesa, rebolou e mostrou a bunda.

A pesquisa da rebolante pesquisadora é, segundo ela, uma defesa do que ela chama de “cultura popular” dentro da universidade, que ela definiu como “educação pelo cu”. Cultura popular, nesse caso, seriam o funk e suas variantes.

A ideia geral, que é compartilhada por boa parte da esquerda pequeno-burguesa e identitária, é a de que o funk é algo muito popular e que isso teria que ser valorizado.

Como vemos, são duas posições opostas sobre dois estilos musicais. O sertanejo seria “fascista”; o funk seria “do povo”.

Antes de qualquer coisa, cada um tem o direito de gostar do que for e ter a opinião que quiser.

Porém, soa exagerada a colocação de Pedro Cardoso ao dizer que o sertanejo seria a música do fascismo. Pode não ter sido essa a intenção dele, mas é como se todas as pessoas – e não são poucas – que gostam de sertanejo fossem fascistas.

Não parece uma política correta acusar boa parte da população brasileira de fascista.

A única consideração política mais ponderada sobre o sertanejo atual é que o estilo está muito ligado aos latifundiários que influem no poder de difusão desse estilo.

O que Pedro Cardoso disse sobre o conteúdo vazio do sertanejo atual é verdadeiro, mas isso não torna o estilo “a música do fascismo”, é apenas e tão somente uma consequência da péssima qualidade daquilo que a indústria fonográfica enfia goela abaixo da população.

E o funk atual, tão bajulado por setores da esquerda identitária, não seria super vazio de conteúdo? Claro que sim. Aliás, uma comparação rápida entre um estilo e outro nos leva à conclusão de que o funk seria ainda amais vazio de conteúdo. E não estamos falando apenas das letras.

Ambos os estilos são vazios, cada um a seu modo. E são vazios não por nenhuma característica específica dos gêneros musicais, mas simplesmente porque esse é o resultado da política dos monopólios da indústria fonográfica.

Nesse sentido, não há nenhum motivo, a não ser a demagogia, de defender o funk e no outro extremo chamar o sertanejo de fascista.

Posto isso, é preciso fazer justiça. O funk, embora seja muito ouvido, não tem nem de longe a popularidade do sertanejo. A música sertaneja atual só é o que é porque o estilo, agora falando do sertanejo verdadeiro, raiz, é o mais popular do País. Sim, a música sertaneja é a música mais ouvida pela população brasileira e o mercado fonográfico utiliza essa popularidade real para vender um produto falso, que, na verdade, não bem um sertanejo, mas um pop gringo que conserva algumas características dele.

Se é por um problema de ser popular, então, o sertanejo mereceria mais demagogia, não hostilidade. No entanto, a esquerda parece ter adquirido o dom de ser impopular e de hostilizar aqueles que ela acha que não são “dos seus”. Os identitários não vão gostar disso, mas não precisa ser muito esperto para saber que um travesti rebolando numa sala de aula é a coisa mais impopular que se possa fazer. Aí, ao invés de reconhecerem que não é de bom-tom esfregar o ânus na cara das pessoas, os identitários vão dizer novamente que o povo é fascista.

Pedro Cardoso acusa, ainda, os sertanejos de serem “muito apegados à cultura estadunidense”. É um fato. A música comercial está contaminada pelo lixo que o imperialismo nos envia para cá. Mas justiça tem que ser feita: no frigir dos ovos, é muito mais genuíno uma pessoa ouvindo música sertaneja do que funk, que só pelo nome já sabemos que não veio do Brasil.

*As opiniões do colunista não refletem, necessariamente, a opinião do Diário Causa Operária

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