Neste domingo (18), o presidente Lula afirmou que a fuga de dois detentos de um presídio de Segurança Máxima em Mossoró, no interior do Rio Grande do Norte, parece ter sido facilitada por alguém “do sistema”. Não era de se esperar outra coisa: as tais celas de “segurança máxima” são muito “seguras” na teoria. Mas, na prática, são controladas por seres humanos, como tudo na sociedade, e, portanto, são absolutamente falíveis.
Dizem que, nos tais presídios, os detentos ficam completamente isolados, que são revistados todas as vezes que saem de suas celas e que todos os seus passos são monitorados por câmeras de vídeo. Uma perfeita ditadura! Mas que, no entanto, não foi páreo para a dupla Rogério e Tatu.
Fato é que as tais prisões de segurança máxima só servem para aumentar ainda mais a repressão sobre os pobres coitados que não têm como acessar as “pessoas certas” do “sistema”. Aqueles que desafiam o Estado fora dos presídios também o farão de dentro deles. Rogério e Tatu, supostamente sem se comunicarem, conseguiram fugir de maneira sincronizada, passando por câmeras que convenientemente estavam sem funcionar. É uma piada.
Agora que um orçamento bilionário para a repressão e o atropelo dos direitos democráticos da população carcerária aparecem como ineficientes, a imprensa faz um escândalo em torno da fuga. “Na região no entorno da Penitenciária Federal de Mossoró, no interior do Rio Grande do Norte, o clima é de tensão entre os moradores devido a fuga de dois detentos na madrugada desta quarta-feira”, afirma matéria do jornal O Globo. “Nos arredores do Rancho da Caça, onde os criminosos foram vistos pela última vez, há receio de que os foragidos voltem a arrombar e invadir casas para furtar mantimentos”.
Dois homens que, segundo a própria imprensa, vagueiam só com a roupa do corpo, desesperados para sair da cidade em que se encontram, seriam, portanto, motivo de pânico entre a população! Como se não houvesse violência em Mossoró antes da fuga da dupla…
O objetivo é estabelecer um clima de histeria. A imprensa burguesa, defensora número um do “bandido bom é bandido morto”, tenta agora diminuir a desmoralização do sistema de repressão que montou. A cada tantas horas, aparece com uma notícia que indica que a caçada estaria prestes a encontrar um desfecho: comemora que uma família diz ter avistado Rogério e Tatu, que uma camisa de um dos detentos teria sido encontrada e por aí vai. A jornada de duas pessoas desconhecidas pela quase totalidade dos brasileiros passou a ser acompanhada em detalhes pelos grandes veículos da comunicação.
É uma caça. De um lado, Rogério e Tatu. Quem são? Não faço a menor ideia. Que fizeram? Diz a polícia que teriam cometido meia dúzia de crimes. E do outro lado? Uma coalizão de todas as polícias que se possa imaginar – militar, penal, civil, federal e o escambau -, juízes, diretores de presídios, a própria imprensa golpista e até a Interpol!
É difícil não torcer pela dupla acreana. Que grande mal farão esses dois soltos por aí? Será que farão mal maior que aqueles que o perseguem? Na briga pela desmoralização dos primeiros e pela desmoralização dos últimos, fico com a desmoralização dos últimos. Que maravilha que é ver a polícia estabanada, a imprensa preocupada, os carcereiros humilhados…
A desmoralização que Rogério e Tatu estão impondo ao sistema de repressão não é, de longe, inédita. Há pouco tempo, outro brasileiro ousou desafiar o aparato de repressão, mas sua aventura durou pouco. Danilo Cavalcante, em seus 13 dias de liberdade, havia conseguido um ato duplo de heroísmo: fugiu de uma cadeia norte-americana. Um golpe não apenas contra o aparato de repressão, mas contra a arrogância do país mais poderoso do planeta. Não posso negar que minha simpatia pelo anônimo Danilo Cavalcante crescia a cada olé que dava nos agentes norte-americanos.
Mas aquele que ainda será lembrado por algum tempo quando o assunto é despistar as autoridades é o jovem Lázaro Barbosa de Sousa. Perseguido durante 20 dias pela polícia, até ser covardemente assassinado, Lázaro impressionou o Brasil por ele, um homem sem estudo e sem recursos, ter conseguido enganar a polícia por tanto tempo, valendo-se apenas do conhecimento que tinha do terreno em que atuava.
As notícias periódicas sobre a situação de Rogério e Tatu, muito longe de aterrorizarem a população, que já vive o seu terror diário, são capítulos de uma história que merece ser apreciada como um dos raros momentos em que a polícia leva um revés.