Para o sábado de carnaval, o Partido da Causa Operária havia convocado seus militantes e simpatizantes paulistanos para celebrar a data com um baile à fantasia no Centro Cultural Benjamin Péret (CCBP), no centro de São Paulo. A festa estava marcada para às 16h, mas como bons militantes, chegamos com antecedência para organizar o local. Havia mesas, cadeiras e o tradicional trailer do bar Jacobinos, onipresente nas atividades do Partido. Faltava apenas o público para a festa começar.
Num determinado momento, fui comprar gelo e eis que, quando retorno ao CCBP, todos os militantes estão na rua discutindo com dezenas de policiais truculentos da Guarda Civil Municipal. Há diversos supostos fiscais da Prefeitura de São Paulo com coletes laranjas. Reforço supostos porque o líder da equipe estava com uma camiseta com o número “01” estampado em suas costas. Esse fiscal recusou-se a se identificar quando o questionamos. A única informação que conseguimos extrair dele foi a de que era ele que “mandava aqui”, o que assumimos que seja em referência ao centro da cidade. Certamente uma pessoa muito importante!
Confiscaram nossas mesas, cadeiras e parte das mercadorias no trailer. Os policiais estavam em maioria numérica em relação aos militantes do Partido, o que, de certa forma, me deu certo orgulho. Será que tinham medo de uma reação? Como até pistolas de água foram proibidas no carnaval, não tínhamos muita chance de nos defender contra a GCM, mas mesmo assim os repressores foram cautelosos. Outro detalhe importante dessa “operação” carnavalesca – talvez o ato mais obsceno a ocorrer em todo o feriado – é a apreensão de parte das mercadorias. Entendo a partir disso que a lei pode ser aplicada parcialmente, ao gosto da autoridade. Finalmente é ele que “manda ali” e, segundo seu gosto pessoal, escolheu apreender apenas as bebidas alcoólicas.
Toda essa folia aconteceu em frente ao CCBP, na Rua Conselheiro Crispiniano, uma rua fechada para automóveis. Não estávamos, portanto, atrapalhando nenhum trânsito e estávamos na frente de um prédio que ocupamos legalmente. Não sei exatamente qual foi o crime que cometemos, mas como não “mandamos ali” fomos forçados a obedecer. A festa continuou, porém, ainda que sem as mesas, cadeiras e o trailer na rua. Movemos a infraestrutura para dentro do prédio e colocamos nossa bateria na rua, ocupando aproximadamente o mesmo espaço que a infraestrutura original. A polícia fez mais algumas rondas no local e optou por não apreender nossos tambores. Acredito que dessa vez estávamos dentro da lei, mesmo sem saber qual é essa lei. Não sabemos a lei que infringimos nem a identidade de quem a aplicou.
Não tinha como ser diferente, foi um carnaval à la PCO, um carnaval de luta. Lutamos por cada conquista do Partido, lutamos até mesmo por sua existência nesses tempos de censura e violação dos direitos democráticos.
Antes de encerrar, um detalhe escatológico. Num determinado momento do “esquenta” da festa, colocamos na rua nossa bandeira da Palestina, o que gerou indignação de um anarquista local – bravo combatente do centro de São Paulo. Segundo ele, era membro do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e trabalhava com a Mídia Ninja. Não tenho como confirmar. Pela segunda vez no dia fomos enquadrados por uma pessoa que não quis se identificar.
Eu, que estava segurando a bandeira, fui abordado. Segundo o herói dos povos, misturar a luta palestina com uma festa popular como o carnaval era uma depravação. Para ele, eu, que trabalho na imprensa de um Partido revolucionário, aquele que mais luta pelo povo palestino no Brasil, “não sabia o que o povo palestino estava passando”. Nossa mistura de política com festividade, com povo na rua, era uma heresia. O homem que trabalhava num bar próximo ainda nos ameaçou e disse que sua vontade era de “queimar tudo” apontando para o CCBP. Terminou dizendo que talvez fosse por essa mistura que a polícia havia apreendido nossas coisas.
Quando a polícia chegou, não tinha nada da Palestina na rua. Será que foi esse cidadão que nos denunciou? Não sei. Sei apenas que a faixa fez muito sucesso. A maioria dos que passaram por ela tiraram fotos e nos parabenizaram. Muitos ficaram para tocar com a nossa bateria. Não vou dizer que é fácil ser militante do PCO. Não temos descanso nem no feriado. Uma coisa, porém, é certa: vale a pena.




