Após a grande demonstração de força dada pelo bolsonarismo, a esquerda decidiu chamar um ato no dia 23 de março ainda no mês de fevereiro, com as principais lideranças do Partido dos Trabalhadores (PT) participando do que, para eles, seria mais importante: o de Salvador, marcado para acontecer no Largo do Pelourinho. Ocorre que grandes personalidades petistas do próprio estado da Bahia sabotaram o ato, o que ficou evidente pelas ausências do governador Jerônimo Rodrigues e do ex-governador (2007-2014), atual líder do governo no Senado, Jaques Wagner na manifestação.
Ao direitista portal Poder360, “a assessoria de Jerônimo Rodrigues afirmou que o governador sequer estava em Salvador. Disse que ele entregava obras na cidade de Porto Seguro e nos distritos de Arraial D’Ajuda e Trancoso. Por isso, não teria chegado a tempo na capital”. “Já a equipe de Jaques Wagner”, continua a matéria, “afirmou que ‘o senador teve um compromisso familiar que o impediu de estar presente no ato’”. Quem acredita nessas explicações, acredita em tudo.
Dada a grande antecedência com que o ato fora marcado (quase um mês), é um insulto à inteligência alheia o governador baiano justificar sua ausência como decorrente de uma suposta desorganização, o mesmo valendo para Wagner. Tais explicações não valem pelo que dizem as palavras, mas pelo que evidenciam na prática: as manifestações do dia 23 foram um fiasco, dentre outros motivos, porque o setor mais direitista do PT as sabotou.
À impressão inicial de que a esquerda e o governo Lula haviam despertado para a necessidade de um enfrentamento político com o bolsonarismo, seguiu-se uma impressionante demonstração de capitulação do maior partido da esquerda nacional. Mesmo naquele que era considerado como o principal ato das manifestações nacionais marcadas para a data, o da capital baiana, o público presente no largo do Pelourinho não superou 1.042 pessoas, segundo a já citada matéria do Poder360.
Em uma cidade onde Lula teve mais de 70% dos votos válidos na eleição presidencial de 2022, trata-se de uma desmoralização explicável não pelas desculpas dadas pelos petistas baianos, mas pela sabotagem escancarada da direita dentro do PT, além da cisão no interior do próprio partido.
Com quatro governadores, 182 prefeitos, oito senadores, 67 deputados federais, 118 deputados estaduais e 2.665 vereadores em todo o País, a única razão real pela qual os atos convocados serem o fracasso de público retumbante que foram é a decisão de abandonar as ruas. Demonstrações de que a política da direita petista é acompanhada pelos setores da esquerda próximos ao imperialismo foram dados pela figura de Guilherme Boulos (PSOL), candidato “de esquerda” à prefeitura da principal cidade do País e que, tal como o governador da Bahia, não compareceu ao ato de São Paulo por um compromisso marcado para o mesmo horário em conjunto com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
É visível que após a convocação da manifestação no final de fevereiro, os partidos de esquerda depararam-se com um entrave, que impediu a convocação séria das manifestações. Sem conseguir desconvocar os atos (apesar de cidades como o Rio de Janeiro terem feito isso), as manifestações foram simplesmente abandonadas, criando o clima favorável para golpes como os de Jerônimo Rodrigues, Jaques Wagner e tantos outros sabotadores.
O fiasco de 23 de março mostrou ainda porque os atos em defesa da Palestina não crescem devido à luta interna do PT, impedindo-o de se mobilizar. O próprio senador e líder do governo na casa, por exemplo, condenou a denúncia feita por Lula do genocídio cometido por “Israel” contra o povo palestino:
“Wagner relatou que afirmou a Lula: ‘não tiro uma palavra do que vossa excelência disse, a não ser o final. Não se traz à baila o episódio do Holocausto para nenhuma comparação, porque fere sentimentos, inclusive meus, de familiares perdidos naquele episódio’.”
É um posicionamento que revela a verdadeira posição do senador, que alega “sentimentos” feridos para criticar Lula quando o presidente luta contra a pressão sionista e chama um genocídio pelo que de fato é. Uma posição próxima o bastante do sionismo para sufocar as mobilizações contra os sionistas que massacram o povo palestino e contra os que, aqui no Brasil, deixaram claro que o bolsonarismo continua sendo uma força que precisa ser enfrentada politicamente. Esse combate, por sua vez, tem a oposição de Wagner, Rodrigues, Boulos e todo um setor da esquerda que brinca de se opor a Bolsonaro, mas, na prática, sabota a luta real contra a extrema direita.


