Pela segunda vez, a “administração autônoma” curda, liderada pelas Forças Democráticas da Síria, uma milícia financiada pelos EUA, não conseguiu obter a aprovação dos norte-americanos, para realizar as eleições locais que estavam previstas para agosto passado. Após a recusa anterior a essa iniciativa, que levou a FDS a adiar as eleições sem marcar uma nova data, os norte-americanos repetiram sua negativa, através do porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller. O imperialismo teme que a Síria saia ainda mais do seu controle.
Miller afirmou que o governo dos EUA não apoia o anúncio feito pela “administração autônoma” sobre a convocação para as eleições justificando essa posição pelo fato de que “as condições necessárias para a realização de eleições livres, justas, transparentes e inclusivas na Síria, incluindo as regiões do norte e do leste do país, não estão atendidas“. Ele acrescentou que “Washington enfatiza a necessidade de que quaisquer eleições estejam em conformidade com a Resolução 2254 do Conselho de Segurança da ONU“.
A insistência da “administração autônoma” em realizar essas eleições tem vários objetivos, incluindo a confirmação de que possui a capacidade administrativa necessária para realizar as eleições. Também busca provar sua legitimidade na região através da obtenção de conselhos eleitos pela população, além de conquistar o apoio absoluto dos Estados Unidos e, consequentemente, o reconhecimento internacional. Eles tentam replicar a experiência da região do norte do Iraque, onde os curdos têm um “governo autônomo” (controlado pelos EUA) desde a invasão do país em 2003. A negativa das eleições indica que o candidato dos EUA perderia.
Há duas correntes em disputa dentro da “administração autônoma”: uma quer arriscar a realização das eleições, mesmo que seja em uma ou duas províncias; a outra pede cautela e espera pelas condições adequadas para realizá-las. A segunda, que não deseja contrariar as diretrizes dos EUA para garantir a continuação do apoio militar norte-americano, é a que controla a posição até agora em relação às eleições, o que provavelmente resultará em seu adiamento ou na manutenção da data de sua realização indefinida.
Em comentário sobre a recusa americana à iniciativa da SDF, fontes citadas pelo jornal Al-Akhbar curdas afirmam que “pareceu surpreendente para as lideranças curdas, que sempre receberam conselhos norte-americanos sobre a necessidade de implementar a democracia nas áreas do nordeste da Síria e de garantir a chegada de conselhos eleitos às administrações locais“. As fontes sugerem que essa posição “está relacionada à consideração das posições turcas e à prevenção de novos conflitos na região, em meio à escalada contínua em Gaza e no Líbano, e ao medo de uma guerra regional a qualquer momento“.
E embora as fontes revelem que “a direção era para realizar as eleições nas províncias de Raca e Tabqa, por serem relativamente distantes da fronteira turca”, elas estimam que “as eleições sejam adiadas por mais um período, aguardando a melhoria das condições internacionais e regionais, ou adiadas para depois das eleições presidenciais norte-americanas, para saber quem será o novo presidente e quais serão as diretrizes de seu governo“.
Elas ainda ressaltam que “os EUA se preocupam em não oferecer nenhum apoio político à administração autônoma, limitando seu apoio apenas ao aspecto militar“, acrescentando que “a administração autônoma e o braço político da STF pressionam continuamente por apoio político norte-americano, mas não tiveram sucesso até agora, devido ao cuidado de Washington em considerar a sensibilidade turca em relação à administração curda na região“.
A Turquia aparece em grande destaque nessas negociações, pois é um aliado dos EUA por meio da OTAN, mas que age de forma cada vez mais independente no Oriente Médio. Mas não é só isso o relevante. Além da Turquia, há a presença dos russos na região e de todo o Eixo da Resistência, o governo Bashar al-Assad está cada vez mais forte e os curdos já acenaram para Assad após a reaproximação do presidente aos países árabes depois do acordo dos sauditas com o Irã.
A reunificação da Síria
As SDF, dirigidas pelos curdos, controlam um território que é majoritariamente de população árabe. Recentemente as tribos árabes se aglutinaram em peso em torno de Assad enfraquecendo a posição do imperialismo. As tribos árabes sírias rejeitaram a presença dos EUA na Síria e expressaram total apoio ao governo de Damasco e ao Eixo da Resistência durante o Quinto Fórum de Tribos e Clãs Sírios, na cidade de Homs, em 14 de setembro.
Os participantes do fórum, compostos por representantes de várias tribos e organizações tribais, denunciaram “a presença estrangeira ilegal em todas as suas formas no território sírio e suas práticas contínuas, especialmente o roubo da riqueza do país, que pertence ao povo sírio“, segundo uma declaração conjunta.
As tribos referiam-se principalmente à ocupação dos campos de petróleo sírios pelos EUA e ao saque do petróleo e outros recursos naturais do país, realizado pelos EUA e pelas FDS. A declaração tribal também reafirmou o “rejeição completa de tentativas de divisão sob qualquer nome“, acrescentando que “os clãs e tribos continuarão a ser uma força de reserva popular” para o Exército Árabe Sírio (SAA). O comunicado condenou “as miseráveis tentativas de sabotagem realizadas” pela FDS e outros.
“As tribos assinaram um documento de compromisso sanguíneo no qual afirmaram seu apoio à corajosa liderança do presidente Bashar al-Assad e que sempre serão leais e fiéis à Síria com seu sangue e almas diante da ocupação, seus agentes e mercenários, para que a Síria permaneça forte e inexpugnável“, relatou a SANA na cobertura do evento.
Os representantes tribais também elogiaram a resistência libanesa Hesbolá e as organizações de resistência palestinas que lutam contra as forças invasoras israelenses na Faixa de Gaza. O poeta Abu al-Taieb al-Mansour, um representante tribal da região do deserto Badia da Síria, afirmou durante uma entrevista ao veículo de notícias libanês Al-Ahed que as tribos árabes apoiam “a valente resistência libanesa que apoia Gaza e faz o inimigo sionista provar o cálice amargo“.
O número de presentes no fórum foi o dobro do número que compareceu a um fórum tribal realizado em maio no território controlado pela FDS, cerca de 5.000 membros de clãs participaram do fórum em maio.
Uma coalizão de tribos árabes sírias liderada pelo xeque Ibrahim al-Hafel lançou uma ofensiva massiva contra a FDS no campo de Deir Ezzor em 7 de agosto como parte de uma rebelião que começou contra os militantes apoiados pelos EUA no ano passado. A campanha tribal árabe contra a FDS tem recebido apoio direto do exército sírio.
A força que tem o governo Bashar al-Assad é o que amedrontara os EUA para a realização das eleições. Ao mesmo tempo, a pressão sobre as FDS deve ser enorme, pois a população cada vez se revolta mais com o seu governo. O grande vencedor é Bashar al-Assad e o Eixo da Resistência.