Assinado pelos militantes do PSOL Israel Dutra e Roberto Robaina, o artigo Construir a linha combativa para derrotar a extrema direita tenta defender uma solução eleitoreira para um problema político: enfrentar o setor mais radicalizado da direita por meio da eleição de candidatos da esquerda reformista, sob a bandeira do “antibolsonarismo”. A história mostra, no entanto, que o fascismo nunca foi derrotado pelas urnas, e sim pela força da mobilização popular. Diz o artigo:
“É evidente e notório a força do fenômeno da extrema direita, resiliente e organizada, no Brasil e no mundo. As eleições que se aproximam, ainda que por serem de caráter municipal envolvam temas específicos, serão mais um capítulo do teste de forças com os bolsonaristas. Sejam eles mais diretos, como Marçal, Wagner e Ramagem, sejam aliados ‘íntimos’ como Nunes e Melo.”
A tentativa de apresentar a via eleitoral como o caminho principal para derrotar o fascismo é uma cortina de fumaça para desviar o verdadeiro eixo de luta, escondendo que o avanço do fascismo não se resolve com votos, e sim com as massas nas ruas. Desde o surgimento do fascismo na Europa até suas manifestações mais recentes, a extrema direita sempre encontrou no jogo eleitoral um espaço para crescer e se fortalecer, antes de partir para ações violentas e antidemocráticas.
O fascismo italiano de Mussolini, o nazismo de Hitler e os regimes de Franco e Salazar jamais foram derrotados por elas. Quem derrotou o fascismo? As massas organizadas e mobilizadas, que enfrentaram diretamente a repressão, as milícias fascistas e os governos que colaboravam com esses regimes.
A derrota do fascismo no Reino Unido nos anos 1930, por exemplo, ocorreu quando os trabalhadores ingleses e os partidos comunistas reagiram com violência às investidas dos camisas negras de Oswald Mosley, empurrando a extrema direita para a marginalidade política. O fascismo francês, que crescia assustadoramente nos anos 1930, só foi derrotado graças à mobilização revolucionária de 1936, quando operários e camponeses franceses tomaram as fábricas e as ruas, barrando as investidas da extrema direita e quase tomaram o poder no país imperialista, o que não concluíram devido à inexperiência dos setores mais avançados e à traição do stalinismo.
Até mesmo no Brasil, a história nos ensina que a mobilização popular foi a única resposta capaz de conter os avanços da extrema direita. O episódio da Revoada das Galinhas Verdes (1934), quando os integralistas foram humilhados e derrotados, é um exemplo claro de que a organização e a ação de massas são a chave para enfrentar e vencer a direita radical. Os integralistas foram combatidos com força e, após a derrota, nunca mais voltaram a ter expressão política no País.
Finalmente, no ABC paulista, a Ditadura Militar (1964-1985) foi derrotada não por campanhas eleitorais, mas sim pela força das greves operárias iniciadas em 1978 e que desafiaram abertamente o regime militar, levaram a um processo de radicalização política que só foi encerrado em 1994. Esse exemplo é esquecido pelos reformistas, que preferem esconder o papel das mobilizações revolucionárias e tentam nos convencer de que o caminho é o das urnas.
Com isso, prestam um serviço ao próprio fascismo, desarmando a classe trabalhadora.
O texto de Dutra e Robaina fala em “construir um muro” contra a extrema direita, mas qual é o real material desse muro? A lógica reformista que defende alianças com setores do “centrão”, que tenta vencer a extrema direita apenas no terreno eleitoral, sem colocar as massas em movimento, é um muro de areia que não resiste ao vento. No fundo, esse tipo de estratégia reformista acaba, na verdade, fortalecendo a extrema direita, pois enquanto a esquerda institucional está ocupada em selar acordos com o centrão e em disputar cargos, a extrema direita avança nas ruas, ocupando espaços na sociedade civil e preparando suas bases para ações mais agressivas.
A tentativa de lidar com a extrema direita dentro dos limites do sistema eleitoral burguês é um convite à derrota. A extrema direita cresce com uma base social que não se engaja pelo voto, mas sim por meio de uma política mobilizadora, criando uma força que se impõe pela violência, pela intimidação e pela presença nas ruas.
Isso ficou claro no Brasil, quando o bolsonarismo cresceu enquanto as direções da esquerda se limitavam a tratá-los como um fenômeno meramente eleitoral. O resultado foi um crescimento expressivo da extrema direita, que ganhou força nos espaços de poder.
O foco em campanhas eleitorais, como apresentado no texto, revela um claro desvio do que deveria ser a prioridade de qualquer agrupamento que se coloque contra a extrema direita: a organização popular e a ação direta. A ideia de que a eleição de parlamentares “tribunos do povo” possa se tornar a linha principal de combate ao fascismo é uma ilusão que serve ao carreirismo dos tais “tribunos”.
Se o MES/PSOL realmente está interessado em lutar contra o bolsonarismo, a primeira preocupação do partido deveria ser quantos trabalhadores pode mobilizar para o enfrentamento que se propõe. As eleições podem ser um momento para impulsionar essa luta, mas precisa ser travada com essa perspectiva, ao contrário do que estabelece o texto, quando diz:
“Nossa prioridade é reeleger nossos vereadores (além dos citados, Jurandir Silva, Juliana Ativoz, Leandro Sartori, Débora Firmo, Roberta Stoppa, apoiando nosso aliado Gabriel Biologia em Fortaleza) e disputar onde temos condições de colocar novos tribunos no parlamento ou retomar como o caso de Raul Marcelo, ex-deputado que se apresenta por Sorocaba.
Os próximos dias serão decisivos para a construção de uma esquerda combativa, militante e anticapitalista com representação parlamentar, com vistas à disputa do movimento de massas e do debate de estratégias com o ativismo.”
A prioridade, como diz expressamente o artigo, é “reeleger vereadores” e construir uma “representação parlamentar”. Como isso servirá à luta dos trabalhadores, camponeses e estudantes é um mistério que o artigo não diz, o que em si já é uma resposta.