Com o início da nova ofensiva israelense no Líbano em meados de setembro, o dever de todas as organizações anti imperialistas seria declara apoio total ao Hesbolá, a principal organização de resistência libanesa. A LIT-QI, no entanto, publicou um texto para criticar o Hesbolá como uma organização burguesa, no sentido mais reacionário da palavra, ou seja, fazem campanha contra o partido quando ele é alvo do imperialismo. O texto é “O que é o Hezbollah” de Flavio Bosco.
Eles afirmam: “o Hesbolá é hoje o principal partido burguês do Líbano com extensa rede de assistência social, uma milícia que é a principal força militar do país, maior que o próprio exército nacional, e sólidas relações com o regime iraniano”. Essa afirmação é enganadora. O Líbano tem partidos de direita e da extrema direita ligados ao imperialismo que podem ser considerados também os principais partidos burgueses. O Hesbolá é o principal partido nacionalista do país, suas ações de luta armada contra “Israel” e outros grupos pró-imperialistas são inclusive revolucionárias.
O texto então começa a atacar o Hesbolá como uma organização direitista: “a partir de 1987, o Hezbollah passa a disputar por todos os meios a hegemonia entre a comunidade xiita em detrimento dos comunistas e da AMAL. Neste período é assassinado o principal intelectual marxista libanês Mahdi Amel. Ao final, as organizações comunistas são perseguidas e colocadas à margem. Esta ofensiva anticomunista também foi realizada pelo regime iraniano para extirpar a influência de várias organizações socialistas na revolução iraniana, como o Partido Comunista, os Fedayins do Povo, os Mujahedin do Povo, e grupos curdos”.
Aqui fica implícito que o Hebsolá persegue comunistas, o que é uma farsa. A verdade é que as organizações xiitas desde a Revolução Iraniana se tornaram as mais populares em diversos países. Elas eram mais combativas que a tradicional esquerda ou o tradicional nacionalismo laico e por isso se tornaram dominantes. O Irã é um exemplo claro disso. Em meio a uma revolução operária quem tomou a dianteira não foram os comunistas, que pouco cresceram, foram os aiatolás xiitas. Na Palestina isso aconteceu com o Hamas substituindo o Fatá. A verdade é que os xiitas na prática são mais radicais que os comunistas e por isso tem mais popularidade. Conhecendo a esquerda mundial não é difícil de compreender isso.
O texto segue tentando afirmar que o Hesbolá deixou de ser um movimento de resistência e se tornou uma especie de partido burguês: “lentamente vai se gestando uma profunda mudança na base social e na composição da direção do Hezbollah, inicialmente baseada nas camadas mais pobres da comunidade xiita e liderado por religiosos xiitas, em direção à burguesia xiita, e com crescente presença de novos quadros educados nas universidades de elite no país. Ao mesmo tempo, o sul do Líbano deixa de exibir os maiores índices de pobreza, sendo substituído pelo norte do país, ao redor de Trípoli e Akkar, onde a maior comunidade é a sunita. Em Dahye, setores xiitas empobrecidos convivem com uma abastada classe média xiita e seus carros de luxo”.
É uma tese ridícula. Porque o partido cresceu e conseguiu inclusive adentrar o governo e porque o país se desenvolveu e assim criou uma camada social xiita que não é miserável, o Hesbolá teria perdido sua base social. Isso é uma farsa. A base social do Hesbolá continuou sendo a classe trabalhadora e os camponeses xiitas no sul do Líbano e em Beirute. Não fosse assim, a organização não conseguiria sustentar os ataques gigantescos de “Israel” e do imperialismo. O que é a burguesia libanesa perto desses inimigos? Apenas com apoio popular o Hesbolá pode ser tão forte. O partido inclusive se tornou tão popular que conseguiu fortalecer seus aliados sunitas e cristãos.
Um apoio direto a CIA
O texto tenta fazer uma análise de classe para afirmar que o Hesbolá, que derrotou “Israel” duas vezes, seria uma organização direitista. Mas quando começa a falar da Síria aparece todo o pró-imperialismo da LIT-QI. Ele afirma: “em março de 2011, a classe trabalhadora síria se levanta contra a ditadura da dinastia Assad, como parte da onda de revoluções que varreram os países árabes. A força da revolução esfacelou a base de apoio da ditadura e dividiu as forças armadas. Para evitar sua queda, o regime sírio recorre ao apoio das milícias politicamente ligadas ao regime iraniano, incluindo o Hezbollah”.
O texto ignora que as “forças armadas divididas” eram diversas organizações armadas ligadas aos EUA e aos sionistas. Que o que existiu na Síria era uma guerra do governo Assad, apoiada pelas organizações da resistência e o Irã, contra o imperialismo que destruiu totalmente o país tentando derrubar Assad. A política deles é equivalente a afirmar que os atos contra Dilma Rousseff eram uma revolução e que Maduro foi reacionário por se posicionar ao lado do PT naquele momento. Só que muito pior, pois os grupos da Síria são até hoje ligados comprovadamente a CIA.
Então chega a calúnia do imperialismo, o Hesbolá massacra árabes! É uma mentira inventada pelos sionistas que a organização repete se vergonha. Ele afirma: “essas milícias participaram de vários massacres contra a população síria. O Hezbollah, anteriormente admirado pela luta contra Israel, passou a ser repudiado pela população síria”. A realidade é o extremo oposto. Os grupos financiados pelos EUA, incluindo o Estado Islâmico, começaram a massacrar e oprimir a população da Síria. O Hesbolá é visto como libertador de diversas regiões do país. A posição da LIT-QI sobre a Síria mostra que o partido simplesmente não compreende nada sobre o Oriente Médio.
Eles concluem: “o Hezbollah não é uma organização terrorista, como afirmam Israel e o imperialismo ocidental. Também não é uma organização revolucionária. É um partido político burguês profundamente enraizado no regime confessional libanês e principal representante da comunidade xiita, entre a qual construiu praticamente um sub-estado xiita dentro do Estado libanês”. Mais uma vez classificar o Hesbolá como “partido burguês” é enganoso. Nesse sentido, o Hamas também seria o partido burguês, o Ansar Alá do Iêmen também. O correto é classificá-los com partidos nacionalistas e inclusive revolucionários.
Eles lutam uma guerra de libertação nacional e toda a guerra de libertação nacional é revolucionária. Não considerar o Hamas como revolucionário é o mesmo que considerar que o M-26-7 de Fidel Castro não era um grupo revolucionário. Ou que os tenentes que realizaram a Coluna Prestes não lutavam por uma revolução no Brasil. As revoluções não existem apenas lideradas por comunistas, a maior parte delas inclusive foi liderada por movimentos nacionalistas.
O LIT-QI faz de tudo para não apoiar o Hesbolá nesse momento. Na verdade, ataca o Hesbolá de forma discreta. Assim se torna um aliado do sionismo nessa guerra. É uma posição vergonhosa para qualquer organização do mundo, ainda mais uma de esquerda.