Direitos democráticos

Em nome do negro, atacar as liberdades democráticas?

Colunista da Folha defende que o Judiciário possa definir como se organizam os partidos para a suposta garantia dos direitos dos negros, o mesmo judiciário que os encarcera

No último domingo, 14 de julho, a Folha de S.Paulo publicou uma coluna escrita pela jornalista Ana Cristina Rosa intitulada Ultraje à democracia. O artigo é um comentário sobre a PEC da Anistia, recentemente aprovada em segunda votação pela Câmara de Deputados, e seguiu para o Senado. A PEC, caso aprovada, anula uma série de penalizações a todos os 29 partidos registrados no Brasil, derrubando, em certa medida, as arbitrariedades perpetradas pela Justiça Eleitoral contra o direito de organização. Uma das determinações do TSE, que diz respeito à ingerência sobre a campanha política dos partidos, fixa uma proporção de verba que deve ser alocada para candidaturas de pessoas negras. Ironicamente, a colunista da Folha vem reivindicar a luta do negro:

“O enfrentamento da disparidade étnica na cena política nacional por meio do equilíbrio na divisão de recursos públicos desagradou a muitos. A ponto de unir ‘caciques’ políticos da esquerda à extrema direita pela aprovação da PEC da Anistia (em dois turnos, no mesmo dia) na Câmara dos Deputados.

A determinação de não compartilhar o poder —especialmente com gente preta—, resultou no avanço sobre o processo democrático para frear conquista obtida com décadas de lutas dos movimentos sociais negros.”

Pareceria uma piada, caso não fosse fato, que tal formulação estampasse as páginas da Folha de S.Paulo. A disparidade étnica na política reflete uma situação econômica, portanto, social do negro na sociedade, assim como o problema da mulher. Basta observar, com a suposta redução dessa disparidade com a medida arbitrária do Judiciário, em que melhorou a vida dos negros no Brasil? A resposta é óbvia: em nada.

A chamada conquista do movimento negro é, na realidade, fruto da cooptação deste pelo setor político representado pela Folha, o imperialismo, através do identitarismo. Ao invés de reivindicar melhoras concretas para o negro, estas foram substituídas por perfumaria, por uma política de aparência, de “combate ao racismo”. O entendimento de que a vida do negro deveria melhorar concretamente foi substituído para: a sociedade deve aparentar ser igual, mesmo que não o seja. Em outras palavras, ao passo em que a maior parte dos negros brasileiros está na rua da amargura, alguns negros privilegiados ganharam cargos com altos salários, e isso seria o objetivo final do movimento negro. Uma farsa.

O que de concreto se depreende da medida sobre os partidos é não uma melhora da vida do negro, sobre a qual a anulação da mesma também não incide negativamente, mas o incremento do poder do Judiciário para arbitrar sobre os partidos. É importante lembrar, esse é o mesmo Judiciário que teve participação decisiva no golpe de 2016 e na prisão de Lula para fraudar a eleição de 2018, também impedindo o líder popular de participar do pleito ou aparecer na campanha, ainda que seu processo não tivesse finalizado a tramitação. 

Ressaltamos esse golpe político porque ele afetou a vida do negro no Brasil de maneira decisiva, com os ataques aos direitos sociais, com os cortes orçamentários, a reforma trabalhista, a reforma da previdência, que jogaram a população na fome e na miséria, especialmente sua camada mais pobre, sua camada mais negra. Tudo isso é ignorado pela colunista Ana Cristina Rosa, verdadeira farsante em sua argumentação.

Mais que tudo, esse é o mesmo Judiciário responsável pelo encarceramento de cerca de 840.000 pessoas no País, sendo uma parcela de mais de 60% composta por negros. Ora, seria melhor garantir o direito de organização, de fazer campanha como bem entender, a qualquer partido, ou seria melhor submeter todo e qualquer partido existente ou criado no Brasil aos ditames do Judiciário?

Para justificar tal injustificável, a colunista da Folha denuncia:

“Contudo, por abjeto que seja, não é de se estranhar vindo de um Parlamento que tem tomado decisões que podem ser definidas como racistas.

Os exemplos incluem a defesa de dois pesos e duas medidas para enquadrar negros como traficantes e brancos como usuários de drogas; a criminalização de vítimas que engravidaram de um estupro (sendo que a maioria delas é negra); e a proposta de mudar a Constituição para reduzir a idade mínima para o trabalho (num país em que a maior parte das crianças que trabalham é preta ou parda).

Sem a regra da proporcionalidade, parte significativa dos candidatos negros não terá recursos públicos para financiar suas campanhas. E, por óbvio, isso afetará a representatividade étnica na política. Resta saber se o Senado irá compactuar com esse ultraje à democracia.”

Vemos, aqui, um truque muito utilizado para defender as maiores arbitrariedades. O Congresso aprovou medidas que impactam negativamente a vida do negro, logo, devemos restringir os direitos políticos no Brasil, em nome do negro. Faz sentido? Em que ganha o negro no Brasil com a restrição do direito de organização? Se os partidos existentes supostamente beneficiam pessoas brancas nas eleições e não atendem aos anseios e necessidades da população negra, ora, nada tão ilustrativo para a formação de partidos que levem à frente de maneira decidida a luta do negro: pelo fim do encarceramento; pelo fim das polícias etc.

Por que enganar a população inserindo artificialmente negros em partidos liderados pela burguesia? Esse seria o único ponto possível de se apontar como “positivo” para o negro em toda esta farsa.

Finalmente, resta saber, para defender os direitos do negro, basta ser negro? A realidade nos mostra que não, mas é isso que buscam fazer crer Ana Cristina Rosa e a Folha, ironicamente, ao mesmo tempo, demonstrando a inverdade de sua posição.

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