Em novembro de 2023, a Pró-Reitoria de Graduação da Universidade de São Paulo (USP) moveu um processo disciplinar contra cinco estudantes do curso de ciências moleculares pela fajuta acusação de “antissemitismo”. O processo, ademais, corre em sigilo, demonstração da ditadura que visa se impor na universidade. A conclusão dos trâmites processuais deve se dar em novembro deste ano, mês que vem.
Censura e repressão
A base da acusação é o informe político (leia a íntegra ao final deste artigo) distribuído numa assembleia realizada no curso em 23 de outubro do ano passado pelo Centro Acadêmico Favo 22. O texto caracterizou a operação Dilúvio de al-Aqsa, realizada em 7 de outubro de 2023, como histórica, e denunciou “Israel” por levar adiante uma política “fascista, colonialista e racista” na Faixa de Gaza, acusando o governo sionista de genocida.
Essa assembleia, ainda, foi realizada em resposta a chamados em grupos do curso por doações para o exército genocida de “Israel”. Em outras palavras, para a Pró-Reitoria de Graduação da USP, deveria ser proibido protestar contra o apoio ativo a um genocídio em curso.
Segundo nota da defesa dos estudantes, a universidade, que deveria ser um local de livre debate de ideias, persegue o contraditório, “inclusive recorrendo a artifícios inconstitucionais como alguns dos incisos do regimento disciplinar ditatorial da USP (…) Entendemos que esse processo é uma tentativa de ‘fazer exemplo’ e barrar movimentos pró-Palestina da USP que buscam denunciar o genocídio em curso e questionar a narrativa de que se trata de uma guerra entre dois lados equilibrados”.
Frente à pressão sionista, à época, o centro acadêmico divulgou nota se desculpando e atribuindo a redação do informe a outro grupo da USP, o Estudantes em Solidariedade ao Povo Palestino, que realiza uma campanha pelo fim de parcerias institucionais da USP com universidades israelenses. Demonstrativo do nível da capitulação é o teor da nota:
“Repudiamos os métodos e a linha político-ideológica reforçada pelo grupo Hamas, que é categoricamente antissemita e de extrema-direita”, declarou o C. A. Favo 22.
Sionismo e ditadura
Para a coordenadora do curso de Ciências Moleculares Merari de Fátima Ramires Ferrari, o recuo foi insuficiente, sendo, afinal, uma demonstração de fraqueza que abriu espaço para que se iniciasse uma campanha de perseguição política. A coordenadora encaminhou um relatório sobre a assembleia propondo punições administrativas aos envolvidos, que teriam ferido o código de ética da universidade e até a Constituição Federal ao supostamente propagar discurso de ódio. O fato demonstra claramente ainda o teor do identitarismo, que afirma combater o ódio, o racismo, etc., mas se lança à perseguição política para defender a limpeza étnica na Palestina.
O pró-reitor adjunto de graduação da USP, Marcos Garcia Neira, aceitou a justificativa de Ferrari, somando-se à caçada sionista aos opositores do genocídio e, em 30 de novembro, determinou a instauração de um processo contra cinco estudantes. Dois são acusados de escrever o informe, e três seriam suspeitos de disseminar discurso antissemita nas redes sociais.
Marcos Garcia Neira afirmou que, caso seja constatada veracidade das acusações, os estudantes ficam sujeitos a “sanção suspensória ou sanção expulsória previstas no artigo 249 do Regimento Geral da USP”. Tal medida, de 1972, tem origem na Ditadura Militar (1964-1985) e proíbe a prática de “ato atentatório à moral ou aos bons costumes”, a perturbação aos “trabalhos escolares” e “a manifestação ou propaganda de caráter político-partidário, racial ou religioso”. Uma medida fascista, coerentemente empregada pelo sionismo, seu parceiro histórico.
Uma comissão de professores, burocracia que comanda as universidades públicas, foi formada para julgar o caso. A comissão é composta por Gustavo Ferraz de Campos Monaco, professor da Faculdade de Direito e ex-procurador-geral da USP, José Ricardo de Carvalho Mesquita Ayres, professor da Faculdade de Medicina, e Ianni Régia Scarcelli, professora do Instituto de Psicologia.
Os estudantes acusados foram ouvidos, e o processo estava paralisado desde julho deste ano, o que parecia levar a um arquivamento. Na última terça-feira (22), contudo, a pró-reitoria de graduação intimou as testemunhas de defesa à prestação de depoimentos em 14 de novembro. Na sequência, se espera um desfecho do trâmite.
É urgente uma mobilização estudantil na USP para barrar a ofensiva sionista e defender os cinco estudantes perseguidos pelo sionismo e os arautos fascistas da burocracia. Caso passe a medida de expulsão, ou qualquer outra sanção minimamente significativa contra os estudantes, a universidade se tornará uma ditadura ainda maior, com a perseguição crescente de toda dissidência. Não só isso, mas estabeleceria um precedente perigoso para a ampliação e disseminação dessa política pelas universidades e por todo o aparato de ensino nacional.
Um fato que demonstra o nível de ingerência externa sobre a USP e o Brasil é o comentário do lacaio do imperialismo Fernando Lottenberg, comissário da OEA (Organização dos Estados Americanos) para o monitoramento e combate ao antissemitismo. O abutre sionista afirmou que:
“A ação dos dirigentes da USP é exemplar, demonstrando a importância de as universidades criarem mecanismos para o recebimento, apuração e determinação de sanções relacionadas às denúncias de antissemitismo ou qualquer outro tipo de disseminação do discurso de ódio (…) Infelizmente, estamos enfrentando um momento de perigoso e crescente número de casos de antissemitismo, inclusive dentro das universidades, locais onde a intolerância e o desrespeito à diversidade não deveriam ter qualquer tipo de espaço, mas acabam ali também encontrando terreno fértil.”
Urge levar adiante a campanha em defesa do povo palestino. Se aproxima o encontro do G20, grupo dos 20 países mais ricos do mundo, no Brasil, no Rio de Janeiro, e uma manifestação está convocada para o dia 18, quando se espera os presidentes destes países, como EUA, Inglaterra, Alemanha e França, os responsáveis maiores pelo genocídio na Faixa de Gaza.
O sucesso do protesto tem o potencial de virar a situação política contra o sionismo no País. Caso contrário, a censura e a perseguição tendem a aumentar.
Todos à manifestação no Rio de Janeiro, em solidariedade ao povo palestino!
Íntegra do informe na assembleia em solidariedade ao povo palestino:
“Na manhã de sábado [7 de outubro de 2023], forças palestinas iniciaram uma ofensiva histórica contra o colonialismo israelense a partir da Faixa de Gaza, região palestina que vem sendo ocupada por Israel há 16 anos de maneira colonial, baseada em assentamentos coloniais em terras e cidades palestinas roubadas. As forças armadas engajadas na operação Tempestade de Al-Alqsa são várias, lideradas pelo Hamas, a força mais organizada e bem estruturada, apesar de controversa entre o povo palestino. Todas as forças políticas palestinas mantêm um contato básico para garantir unidade militar.
A ofensiva foi histórica e deixou o exército israelense paralisado nas primeiras horas, nas quais diversos assentamentos foram retomados, vários militares israelenses foram feitos prisioneiros. Assim que se iniciou a retaliação da parte de Israel, com bombardeios indiscriminados em áreas civis, como se pode inclusive verificar em vídeo postado nas redes sociais do primeiro-ministro de Israel, 250 palestinos foram mortos rapidamente. Os bombardeios covardes continuam até agora e se intensificam, com mais de 750 palestinos mortos, desses, quase 200 são crianças.
Além disso, o ministro da defesa israelense, declarando que os palestinos são animais humanos que seriam tratados como tais, anunciou o corte do abastecimento de água, energia elétrica e combustível para a Faixa de Gaza, que é, há 16 anos, uma prisão murada a céu aberto cujo fluxo de bens e pessoas é completamente controlado por Israel.
Esse tipo de cerco, além de ilegal perante o direito internacional, impede o funcionamento dos serviços de saúde, hospitais na Faixa de Gaza, enquanto os bombardeios aumentam. É importante lembrar que essa ofensiva da resistência palestina ocorreu em resposta à dessecação da mesquita de Al-Aqsa e da agressão de mulheres envolvidas no funcionamento da mesquita. Além disso, nos últimos meses Israel vem escalando o conflito com reiteradas tentativas de invasão a Jenin, terceira maior cidade da Cisjordânia e foco importante da organização da luta armada palestina.
Os bombardeios estão perto da fronteira com o Egito e Israel já bombardeou o Líbano, que retaliou e mobilizou-se para uma resposta militar de maior escala.
A mídia brasileira, alinhada com o bloco imperialista estadunidense, vem focando numa campanha de desinformação, entrevistando brasileiros que moram lá contando histórias pessoas de familiares ou amigos que sofrem com o conflito, tentando pegar as pessoas no emocional e tentando gerar ódio aos palestinos, desumanizando-os e os caracterizando de terroristas que matam civis israelenses sem motivo.
É importante frisar que não há civis em Israel, menos ainda na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, regiões de assentamentos coloniais mais recentes, extremamente militarizados para garantir o roubo da terra palestina. Todo israelense, ao completar 18 anos, tem de servir no exército por quase três anos (2 anos e 8 meses). Dessa maneira, considerando a situação colonial e que todo israelense, homens e mulheres, são militares, o que temos é uma população não civil militarizada habitando terras roubadas. Não há, portanto, civis em Israel, como não havia civis franceses na Argélia no século 20 nem civis franceses no Haiti no século 18 na revolução haitiana.
Para contextualizar o genocídio, fascista, colonialista e racista que Israel pratica, antes do início desse conflito, 200 palestinos haviam sido assassinados por Israel esse ano e, nos últimos 21 anos, Israel assassinou em média uma criança palestina a cada três dias. O exército israelense é um dos mais ricos e bem equipados do mundo, recebendo doações bilionárias dos EUA todos os anos.
É o papel de todo ser humano que se importa com a opressão e a exploração se colocar contra o projeto sionista, contra o colonialismo israelense, contra o Estado de Israel, fundado no genocídio e no colonialismo. É fundamental que nos posicionemos em defesa da luta e da vida do povo palestino.”