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Ricardo Rabelo

Ricardo Rabelo é economista e militante pelo socialismo. Graduado em Ciência Econômicas pela UFMG (1975), também possui especialização em Informática na Educação pela PUC – MINAS (1996). Além disso, possui mestrado em sociologia pela FAFICH UFMG (1983) e doutorado em Comunicação pela UFRJ (2002). Entre 1986 e 2019, foi professor titular de Economia da PUC – MINAS. Foi membro de Corpo Editorial da Revista Economia & Gestão PUC – MINAS.

Coluna

Eleições na França: o avanço da esquerda

"Grande erro da esquerda francesa foi não conseguir hegemonizar a maioria dos distritos"

O segundo turno das eleições francesas derrotou a extrema direita, que ficou em terceiro lugar, e deu vitória surpreendente à esquerda da Nova Frente Popular, mantendo Macron e seu partido derrotado em terceiro lugar. Macron, no entanto, operou para não reconhecer a vitória da esquerda, adiando a escolha do primeiro-ministro e afirmando que não aceitava a França Insubmissa no poder. Isto significa que o programa comum da Frente Popular, que garante algumas conquistas populares importantes, pode não ser aplicado. O Partido Socialista só aceita que seja indicado um primeiro-ministro da Frente Popular se for do seu partido ou um tecnocrata “neutro”. O irônico desse proposta é que o PS estava praticamente extinto, e só obteve uma votação expressiva pelo efeito da “onda antifascista” desencadeada pela chamada “Frente Republicana” que envolveu um eficiente mecanismo de retirada de candidatos que estivessem em terceiro lugar nos distritos em que o Reagrupamento Nacional de Marie Le Pen tinha ficado em primeiro lugar no 1⁠º Turno. 

No segundo turno, foram divulgados resultados que apontavam a hegemonia Nova Frente Popular, que obteve 182 deputados, ficando o partido de Macron Juntos em segundo lugar com 168 deputados, relegando para a última posição a extrema-direita de Marie Le Pen que obteve apenas 143 deputados. Por sua vez, a direita tradicional permanece com 60 deputados.

O resultado foi amplamente comemorado por multidões que lotaram, em Paris, a Place de la République, e em locais semelhantes em Lyon, Marselha e várias outras cidades francesas. A derrota do partido de Le Pen e Bardella, mas também as derrotas de apoiadores do genocídio na Palestina. Apesar da sua capacidade de arrebatar o voto de grandes setores da população francesa, a extrema-direita falhou pela terceira vez desde 2017 na reta final. O período entre os dois turnos foi caracterizado por uma autêntica insurreição popular em que milhões de pessoas foram às ruas mostrando toda sua fúria pela ameaça fascista representada não só pelo partido de Le Pen, mas pelos bandos fascistas e fascistas que provocam a população, principalmente os imigrantes, todos os dias. A verdadeira face do fascismo, caracterizado pela violência social, pela brutalidade racista e islamofóbica da maioria de seus candidatos, fez que a multidão gritasse nas ruas: não passarão!

No entanto, o grande erro da esquerda francesa foi não conseguir hegemonizar a maioria dos distritos, de forma que o mecanismo da renúncia generalizada não fizesse crescer os resultados dos macronistas e, dentro da Nova Frente Popular, do Partido Socialista. Se o esquema freou o crescimento do RN (Partido de Le Pen), a política de frente ampla permitiu reabilitar figuras como Gérald Darmanin ou François Hollande, ambos reeleitos. Se Macron nunca esteve tão fraco, a base presidencial, assim como os Republicanos, salvou-o da ameaça de colapso.

Nesses últimos dias na França, predominou a incerteza. Na ausência de maioria absoluta, estão sendo preparados acordos para determinar quem governará numa situação de crise profunda, marcada pela pressão do mercado e pelas tendências bélicas na Europa. Confrontados com as convulsões políticas que se avizinham, os eleitores da esquerda só devem ter confiança nas próprias forças e nas suas lutas como classe trabalhadora. O regime político da Quinta República, que garante poderes ditatoriais ao Presidente, parece ser eficiente em impedir a efetivação de mudanças esperadas pela população, cuja necessidade a ampla votação na esquerda explicita.

A Composição da Assembleia Francesa ficou assim:

Partidos  Votos Deputados
RN Rassemblement National 8744080 88
UG Union de la gauche 7004725 146
ENS Ensemble! (Majorité présidentielle) 6313808 148
LR Les Républicains 1474650 38
UXD Union de l’extrême droite 1364964 16
DVD Divers droite 980818 25
DVG Divers gauche 401063 12
REG Régionaliste 288202 9
HOR Horizons 258139 6
DVC Divers centre 177167 6
UDI Union des Démocrates et Indépendants 119672 3
DIV Divers 38025 1
ECO Ecologistes 37808 1
SOC Parti socialiste 26343 2

O que é a Nova Frente popular 

Formada no calor do impacto da grande votação do partido Reagrupamento Nacional de Le Pen, a Nova Frente Popular buscou resgatar o espírito de unidade das esquerdas que esteve presente na formação da original , em 1936. Ela reúne os partidos Verde, Socialista, Partido Comunista e a França Insubmissa, um movimento político que se destaca por não aderir ao neoliberalismo e não se submeter aos interesses do imperialismo. Nesse aspecto, a Nova Frente Popular, apesar de se colocar contra o genocídio em Gaza e propor o reconhecimento do Estado palestino, incluiu no seu programa a defesa da Ucrânia e uma crítica muito agressiva à Rússia e seu presidente.

Foi incluído em seu programa o seguinte trecho:

“Derrotar a guerra de agressão de Vladimir Putin e garantir que ele seja responsabilizado pelos seus crimes perante a justiça internacional: defender sem fissuras a soberania e a liberdade do povo ucraniano e a integridade das suas fronteiras, entregando as armas necessárias, cancelando a sua dívida externa, apreendendo os bens dos oligarcas que contribuem para o esforço de guerra russo no quadro permitido pelo direito internacional, enviando forças de manutenção da paz para proteger as centrais nucleares, num contexto internacional de tensão e guerra no continente europeu, e trabalhar para o regresso da paz.”

A vitória da esquerda

A esquerda venceu? Podemos considerar com tal apenas a França insubmissa, ainda que com algumas ressalvas. É evidente que não se trata de um partido marxista e revolucionário e seu programa é um programa reformista avançado. Coloca uma série de fases de evolução anunciando algumas reformas importantes que, no seu conjunto, rompem com o neoliberalismo. O Programa da Nova Frente Popular é, na verdade, uma extensão do Programa da França Insubmissa. Mas não podemos considerar que o Partido Socialista e o Partido Verde pretendam realmente implementá-lo. Dessa forma, e enquanto Macron der as cartas , o establishment “atlantista” conseguiu afastar a ameaça de um governo francês independente , seja pela direita ou pela esquerda, o que teria sido um desastre para a sua política anti-russa. 

Pouco importa aos atlantistas quem governa na Europa, desde que não saiam do caminho da guerra. Aí está Meloni, em Itália, que pertence à liga de Le Pen, que governa seguindo fielmente as diretrizes da NATO. Assim como a Grécia, que é usada como principal porto de descarga de armas e munições para a Ucrânia, que depois seguem a rota pela Bulgária e pela Romênia, até chegarem às mãos dos carniceiros de Kiev.

No século XXI, ser esquerda é – sem esquecer a consigna de todo o poder para os sovietes – a luta contra a OTAN e tudo o que ela representa; a luta contra a acumulação obscena e imoral do capital nacional e mundial em cada vez menos mãos; e uma Europa independente e socialista em termos marxistas. Nada disso estava em questão na França.

Para derrubar Macron e a extrema-direita, só as lutas dos trabalhadores, da juventude e dos bairros operários podem garantir a implementação das reformas essenciais que estiveram no centro dos debates da campanha da esquerda: a revogação da Reforma da Previdência e aposentadoria aos 60 anos, o aumento do salário mínimo e de todos os salários, a sua indexação à inflação, o fim das medidas autoritárias e racistas. Somente com a mobilização dos trabalhadores será possível concretizar o programa da Nova Frente Popular e fazer recuar a extrema-direita.

As direções do movimento operário, a começar pelas centrais sindicais, devem se colocar à frente dessas lutas com base nas organizações operárias e populares. Uma política claramente independente da classe operária deve colocar na ordem do dia a luta anti-imperialista, não servindo de suporte para a política das grandes potências capitalistas. 

Uma primeira decisão unitária

Foi divulgado recentemente que a Nova Frente Popular se unificou na indicação de um nome de consenso para se candidatar à Presidência da Assembléia Nacional. O comunista André Chassaigne, 74, foi escolhido como o candidato único da NFP. Chassaigne disputará o cargo contra Yaël Braun-Pivet, do campo governista e presidente em exercício da Câmara, e Charles de Courson, centrista do grupo independente Liot.

Maiores informações em: https://www.infoecosys.com.br/wp522/?p=73333

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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