Ao lado de alguns dos principais responsáveis pelo genocídio do povo palestino na Faixa de Gaza, como Estado Unidos, França e Alemanha, o governo brasileiro decidiu assinar uma carta, publicada com entusiasmo pela Casa Branca, que exige a libertação dos prisioneiros sob a tutela do Movimento de Resistência Islâmica (Hamas, na sigla em árabe). O texto pede a soltura imediata e incondicional dos prisioneiros e alega, cinicamente, que tal gesto do Hamas “traria um cessar-fogo imediato e prolongado em Gaza”.
Que 17 nações queiram a liberdade de prisioneiros, ainda mais quando há prisioneiros nascidos nesses países, é algo normal. O que não é normal, contudo, é que alguém queira que um movimento de libertação nacional, como o Hamas, entregue os seus prisioneiros de guerra sem algo em troca. O Hamas não “sequestrou reféns”, como diz a imprensa imperialista, sem propósito. A cada semana, os líderes do partido islâmico lembram que o objetivo de ter feito prisioneiros foi o de negociar uma troca com “Israel”.
Incrivelmente, o texto articulado pelos Estados Unidos não menciona que, enquanto o Hamas teria cerca de 200 prisioneiros sob seu controle, hoje, mais de 12 mil palestinos são reféns do Estado de “Israel”. A carta também ignora que, até agora, os prisioneiros soltos pelo Hamas elogiaram o tratamento dos combatentes. Por outro lado, os prisioneiros palestinos sofrem todos os crimes de lesa-humanidade possíveis de ocorrerem em uma prisão. Vivem em celas superlotadas, são torturados, passam fome e, frequentemente, são executados.
O ato de fazer prisioneiros de guerra é um protesto contra as arbitrariedades de “Israel” e, também, um método de luta. Vários palestinos que hoje são dirigentes das forças de resistência foram, algum dia, reféns da entidade sionista que só conseguiram a liberdade após uma troca de prisioneiros.
A essa altura dos acontecimentos, quando “Israel” já assassinou 36 mil pessoas, sendo a maioria destes crianças e mulheres, sair a público para apresentar os “reféns do Hamas” como um grande problema humanitário é asqueroso. Ainda que não houvesse justificativa alguma para fazer israelenses de prisioneiros, o suposto sofrimento dessas pessoas seria algo absolutamente secundário diante da matança indiscriminada.
E é justamente pelo caráter parcial da carta que ela é assinada por uma minoria de países. Nem um único país que integra os BRICS, além do Brasil, endossou o documento. Não é para menos: trata-se de uma carta com o objetivo de omitir os crimes do Estado de “Israel” e de aumentar a pressão sobre o Hamas para que abra mão de um de suas armas na luta contra seus opressores.
Essa pressão sobre o Hamas, por sua vez, não é por acaso. Ela vem em um momento que “Israel” perde cada vez mais apoio na opinião pública e vem sendo derrotado no terreno militar. Caso o Hamas cedesse em relação aos prisioneiros, “Israel” teria, assim, ao menos uma vantagem para apresentar a público, camuflando a situação desesperadora em que se encontra.
Que os Estados Unidos articulem um documento repulsivo como esse, não causa surpresa. No entanto, o governo brasileiro, comandado por um presidente oriundo do movimento operário e popular, jamais poderia compactuar com essa iniciativa. É mais uma prova de que Lula está completamente acuado pela direita e, por isso, está cedendo cada vez mais terreno aos mesmos que conspiraram em torno de sua prisão em 2018 – isto é, o imperialismo.
Com a carta, também cai por terra o discurso de Lula voltado para uma frente contra a “extrema direita” que seria formada junto a representantes de países imperialistas, como França, Espanha e Estados Unidos. Afinal, além do sionismo ser, em si, uma expressão contemporânea do fascismo, a Argentina de Javier Milei também assinou a carta articulada pela Casa Branca.
Quando Lula se aproxima de Joe Biden, Emmanuel Macron e Pedro Sánchez em nome de um suposto combate à extrema direita, tudo o que está fazendo, na verdade, é capitular ainda mais diante do imperialismo. Ao voltar suas baterias contra o Hamas e ao propor uma frente com o imperialismo, Lula está se distanciando do bloco hoje comandado por países como a Rússia, a China e o Irã.
Pressionada pela situação interna, a diplomacia brasileira caminha de maneira muito perigosa em direção ao sionismo e ao imperialismo.