A guerra entre Rússia e OTAN na Ucrânia tem levado a Europa a um estado de crise inédito. As medidas impostas pelo imperialismo para sufocar o gigante eslavo, economicamente, levou ao banimento de commodities russas do mercado mundial, entre elas o petróleo e o gás, do qual os países europeus são dependentes. A maior economia europeia, a Alemanha, por exemplo, apresenta uma recessão, que já derrubou o Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas de uma sociedade) em −0,3% no ano de 2023. Trata-se da primeira retração no PIB desde a crise da pandemia e a segunda em mais de dez anos.
No sentido oposto, os preços, longe de caírem, continuam subindo, pressionados principalmente pelos crescentes custos de energia. Segundo o Escritório Federal de Estatística (Destatis, na sigla em alemão), enquanto o PIB alemão caia, os preços subiam 3,7%, com a alta no preço com as despesas energéticas, 4,1%. As sanções contra a economia russa também estão por trás do segundo principal puxador da alta de preços, os alimentos, cuja subida deu-se na casa dos 4,5%, após atingir pico de 6,5% de elevação no mês de outubro.
Queda no PIB por lado e inflação por outro colocam uma grave ameaça à economia alemã. A produção industrial também acabou atingida pela falta de matérias-primas fundamentais como o gás, tornando a produção insustentável. O mesmo acontece no restante do Velho Mundo, onde segundo relatório do órgão de estatísticas Eurostat de 15 de novembro de 2023, “a produção industrial caiu 1,1% na Zona do Euro e em 0,9% na UE [União Europeia]”.
Além da destruição da economia europeia, os esforços para manter a guerra contra a Rússia em solo ucraniano criou uma enxurrada de imigrantes ucranianos, o que também sobrecarregou os sistemas sociais dos países e abriu uma crise no setor de moradia, e ressentimentos da população com os refugiados, como fica exposto na publicação do think tank Friends of Europe (Amigos da Europa, em português):
“Quando cinco milhões de ucranianos fugiram do exército invasor de Putin no ano passado, eles foram recebidos na Europa de braços abertos. Mas, como a guerra não tem fim à vista, a preocupação é que essa hospitalidade possa se desgastar e levar ao ‘cansaço da Ucrânia’. O principal problema é a moradia; embora muitas mulheres e crianças ucranianas sejam abrigadas em casas particulares, outras tiveram que ser colocadas pelas autoridades públicas em moradias sociais escassas.” (“Ukraine’s refugees highlight the shameful EU housing crisis”, Giles Merritt, 16/5/2023).
A matéria é de maio do ano passado, mas já denota uma crise social com os emigrados, que cujo motivo é mais aprofundado no parágrafo abaixo:
“Apesar de toda a simpatia sincera que saudou os recém-chegados ucranianos há um ano, a chegada deles foi a gota d’água que fez o copo transbordar. O fornecimento de abrigo para os refugiados consumiu quase dois terços dos 30 bilhões de euros que o influxo custou aos governos da UE em 2022. A natureza indefinida de sua permanência torna o gerenciamento especialmente difícil e caro.” (Idem).
“A escassez crônica de casas a preços acessíveis na Europa está se transformando em uma crise total. Entre 1960 e 2015, a população da Europa aumentou em 25%, chegando a meio bilhão, mas a construção de casas caiu pela metade. Não há moradias suficientes há décadas, e os preços desenfreados dos imóveis são o sintoma mais visível e indesejável disso”, conclui a publicação.
Agora, ante a emergência de uma conjuntura marcada por desarranjos econômicos e sociais combinados, um colapso em grande escala na Ucrânia ameaça levar a Europa a uma crise ainda maior do que a atual. Ao órgão russo Sputnik, o analista de assuntos internacionais Elijah Magnier observou esses acontecimentos e destacou a situação de seu país natal, a França, onde o presidente Emmanuel Macron recentemente enfrentou críticas por defender um envolvimento europeu ainda maior no esforço fracassado de Quieve.
Magnier participou do programa “Fault Lines” do Sputnik na quinta-feira (7 de março) para falar sobre a loucura da classe política da UE.
“Parece que a Europa está enlouquecendo“, disse o apresentador Jamarl Thomas. “Porque eles sabem com mais detalhes como a Ucrânia está se saindo mal no campo de batalha. Parece que eles estão preocupados com um colapso geral neste momento.” (“European Vassal States Mull Arms Production as Biden Leads Continent to Destruction”, John Miles, 08/3/2024).
“Parece haver um colapso geral em algum nível, com a Ucrânia fazendo tudo o que está ao seu alcance basicamente para manter suas posições e fracassando“, continuou ele.
Recentemente, diante do impasse nos EUA causado pelos parlamentares republicanos no Congresso, que se recusaram a continuar auxiliando a Ucrânia, a Europa passou a arcar com o custo da assistência a Quieve. A proposta, no entanto, se revelou muito polêmica.
A capacidade da indústria bélica europeia é tida como insuficiente para atender às necessidades da Ucrânia (idem). Somado ao problema de ter terceirizado sua defesa aos EUA desde a criação da OTAN, o Velho Mundo já enfrenta desafios causados pela política imperialista contra a Rússia, como a inflação e a desindustrialização, o que diminui ainda mais a capacidade europeia de ocupar o vácuo deixado pelos EUA. Os políticos estão hesitantes em investir recursos no setor militar, tremendo que a decisão obrigaria os governos a emitir títulos e piorar o quadro inflacionário.
“Por que precisamos provocar outros países quando podemos estar em paz e fazer negócios?”, perguntou ele, resumindo o pensamento de muitos em toda a Europa. “No entanto, o problema continua [com] quem é o líder e, nesse caso, o líder é a América”, destaca Magnier, reforçando a crise provocada pela guerra não é do interesse europeu, mas dos EUA. Miles, por sua vez, conclui que “enquanto a Europa depender de potências externas para sua segurança, ela nunca será totalmente soberana, e as fixações de Washington se tornarão as neuroses de Bruxelas.”
É o grande problema da atualidade enfrentado pelo imperialismo europeu. O continente berço do capitalismo continua em uma posição dominante em relação aos países atrasados, mas dominada pelo imperialismo, que à revelia dos interesses dos setores menores da burguesia europeia, precisa arrasar a Rússia.
A burguesia imperialista concretamente demonstra que não irá se deter, nem que para isso sacrifique países tão importantes quanto Alemanha e França. A determinação dos setores de ponta da burguesia, no entanto, dão indícios de provocarem uma crise ainda maior no interior do bloco dominante, o que vem se expressando na ascensão da extrema direita francesa e demanda um acompanhamento maior da evolução dessa crise.