A crise no governo de Justin Trudeau, no Canadá, parece ter atingido um ponto crítico. A renúncia da ministra das Finanças e vice-primeira-ministra, Chrystia Freeland, na última segunda-feira (16), revelou não apenas profundas divergências dentro do gabinete, mas também uma instabilidade que pode culminar no fim do governo liberal, liderado por Trudeau desde 2015. Freeland, uma das aliadas mais próximas do premiê, não poupou críticas em sua carta de demissão, descrevendo a estratégia econômica do governo como inadequada diante das ameaças impostas pelo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.
A ex-ministra afirmou que o Canadá enfrenta um “grave desafio” com a perspectiva de tarifas de 25% sobre produtos canadenses, anunciadas por Trump. Segundo Freeland, o país precisa encarar essa realidade com “esforço e determinação”, evitando “mimos políticos dispendiosos” e mantendo suas reservas fiscais para uma possível guerra comercial. A decisão de Freeland surpreendeu analistas políticos e colocou ainda mais pressão sobre Trudeau, cuja popularidade está em queda devido à inflação e a questões migratórias.
Pierre Poilievre, líder da oposição conservadora, imediatamente utilizou a renúncia de Freeland como prova de que o governo de Trudeau está em colapso. Poilievre pediu eleições antecipadas, alegando que o Canadá precisa de uma transição antes da posse de Trump em janeiro de 2025. Ele também apelou ao Novo Partido Democrático (NPD), liderado por Jagmeet Singh, para que retire seu apoio ao governo e force a realização de um novo pleito. Poilievre descreveu o governo liberal como um “caos total” e afirmou que Freeland abandonou o gabinete por não mais confiar no premiê.
Em resposta à saída de Freeland, Trudeau nomeou Dominic LeBlanc como o novo ministro das Finanças. LeBlanc, um aliado de longa data de Trudeau, afirmou que seu foco será enfrentar o alto custo de vida e buscar um terreno comum com Trump em questões econômicas e de segurança nas fronteiras. Apesar da confiança declarada pelo novo ministro, a mudança abrupta de liderança levantou dúvidas sobre a capacidade do governo Trudeau de se manter no poder. “Não vejo como ele consegue se recuperar,” disse Tyler Chamberlin, professor da Universidade de Ottawa. A renúncia de Freeland, segundo especialistas, expôs divisões internas no Partido Liberal e aumentou as demandas para que Trudeau renuncie.
Freeland, que também ocupava a posição de vice-primeira-ministra, foi uma figura chave na negociação do Acordo Estados Unidos-México-Canadá (USMCA) e era vista como uma possível sucessora de Trudeau. Sua saída foi comparada por especialistas à renúncia de um vice-presidente em outros sistemas políticos. Tari Ajadi, professor de Ciências Políticas na Universidade McGill, destacou que Freeland decidiu sair não apenas por discordar da direção do governo, mas também por acreditar que o Partido Liberal perderá as próximas eleições.
Trudeau, por sua vez, não comentou diretamente sobre a renúncia, mantendo o discurso de que continuará como primeiro-ministro. No entanto, analistas afirmam que a saída de Freeland pode ser o golpe final para sua liderança. Pesquisas recentes mostram que apenas 23% dos canadenses têm opinião favorável sobre Trudeau, enquanto Trump, paradoxalmente, é visto de forma mais positiva por 26% dos entrevistados. Esse cenário reflete a frustração dos canadenses com escândalos políticos, promessas não cumpridas e a crescente crise econômica.
A crise também trouxe à tona os problemas do sistema de imigração canadense. Recentemente, o governo lançou uma campanha publicitária em 11 idiomas alertando sobre as dificuldades do processo de asilo. A iniciativa contrasta com a postura de acolhimento adotada por Trudeau em 2017, quando declarou: “Para aqueles que fogem da perseguição, terror e guerra, os canadenses darão as boas-vindas”. Agora, o tom mais restritivo é visto como uma tentativa de agradar Trump, que acusa o Canadá de ser porta de entrada para drogas e imigração ilegal.
A pressão para que Trudeau renuncie vem também de dentro de seu próprio partido. Pelo menos sete parlamentares liberais já pediram publicamente sua saída, enquanto outros expressaram a mesma opinião de forma privada. Nas palavras de Tari Ajadi, “este não é um governo que tem muito fôlego”. Enquanto isso, o Partido Conservador, liderado por Poilievre, aparece como favorito em pesquisas de intenção de voto, caso eleições fossem realizadas hoje.
A renúncia de Freeland também tem implicações para as relações bilaterais com os Estados Unidos. Durante visita a Mar-a-Lago em novembro, Trudeau tentou convencer Trump a reconsiderar as tarifas, mas não obteve sucesso. Trump aproveitou a ocasião para atacar Trudeau, chamando-o de “fraco”. A postura firme de Trump e a falta de avanço nas negociações só aumentaram as críticas ao governo canadense.
Essa situação reforça a profundidade da crise política que assola os países imperialistas. Após abalar governos como os da França e da Alemanha, a instabilidade agora atinge o Canadá, ameaçando derrubar o governo de Trudeau.