No artigo Acelerar as punições – o saldo do ato pela democracia, publicado pelo Brasil 247, a articulista Tereza Cruvinel demonstra seu otimismo com as celebrações ocorridas em 8 de janeiro de 2024, em alusão a uma suposta vitória da “democracia” após a invasão das sedes dos Três Poderes, ocorrida no dia 8 de janeiro de 2023.
A articulista inicia seu texto falando que “o 8 de janeiro deveria tornar-se o Dia da Defesa da Democracia” e que “os seis oradores do ato no Congresso enfatizaram a importância de recordar a tentativa de golpe para que ela não se repita”. Já deste ponto, é preciso destacar a contradição: Cruvinel quer chamar de “dia da democracia” um dia em que os “oradores” eram, quase em sua totalidade, verdadeiros golpistas – e, portanto, inimigo de qualquer “democracia”. O ato de 8 de janeiro contou com a presença de elementos como Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Ronaldo Pacheco e José Sarney, figuras diretamente ligadas ao golpe de Estado de 2016.
Apenas por esse dado, já fica claro que o que Cruvinel apresenta como “defesa da democracia” é, na verdade, a defesa de uma frente com a direita golpista.
A articulista, então, para não deixar dúvidas de que seu texto é um elogio aos golpistas, cita com entusiasmo Alexandre de Moraes, bem como sua fala de que “todos, absolutamente todos, que pactuaram covardemente com a quebra da democracia e a instauração de um Estado de exceção, serão devidamente investigados, processados e responderão na medida de suas culpabilidades”. Cruvinel citou ainda Paulo Gonet, um reacionário que despertou uma revolta dentro de setores do próprio Partido dos Trabalhadores por ter sido nomeado procurador-geral da República: “e também Gonet, ao dizer que todos serão punidos, ‘não importa o status social’”.
A articulista, assim, mostra que, não bastasse o fato de que está propondo esquecer completamente o golpe de 2016 e apresentar os golpistas como aliados da esquerda e do povo trabalhador, ainda revela um acordo com o programa político dessas figuras. Trata-se, portanto, de uma adaptação completa – e, portanto, de uma capitação – diante dos piores inimigos da esquerda.
Cruvinel segue:
“Em decorrência, devemos ter agora uma aceleração nos processos judiciais, a começar pelo julgamento dos comandantes da PM do Distrito Federal que estão presos e foram claramente omissos e coniventes com a bandalheira golpista. Punir, mas também vigiar, zelar pela democracia ‘todo santo dia’, como disse Lula. E o verbo vigiar, aqui, não vem no sentido usado por Michel Foucault em seu clássico Vigiar e Punir. No sentido de controlar e enquadrar. A vigilância democrática é o zelo constante, o aprimoramento, a tomada de providências para aprofundá-la e fortalecê-la”.
A necessidade da articulista de explicar o termo usado – “vigiar” – apenas demonstra o constrangimento com o que ela própria está propondo. No entanto, não importam as considerações feitas: a política de fortalecer a repressão do Estado é, necessariamente, uma política direitista. E é isso que está sendo proposto.
De 8 de janeiro de 2023 para cá, o “vigiar e punir” levado adiante pelo Supremo Tribunal Federal, com apoio do então ministro da Justiça, Flávio Dino, se traduziu no combate implacável aos direitos democráticos da população. Nada menos que 25 pessoas foram punidas por crimes abstratos, como “abolição do Estado democrático de direito”, pelo simples fato de ter invadido um prédio público. Pessoas simples, sem nenhuma ligação real com as instituições do Estado, estão sendo condenadas a mais de dez anos de cadeia por ter participado de uma manifestação em que ninguém sequer estava armado.
Não podemos dourar a pílula. Os elogios de Tereza Cruvinel são dirigidos a uma política de características fascistas: o esmagamento dos cidadãos por meio de um Estado que não respeita lei alguma. As medidas tomadas após o 8 de janeiro de 2023, além de serem verdadeiramente bárbaras, acabarão servindo, no final das contas, para abrir o caminho para novas leis ainda mais repressivas. E a repressão, por sua vez, não será apenas contra os manifestantes bolsoanristas, mas contra todo o povo brasileiro.