O Cinturão da Ferrugem, conhecido em inglês como “Rust Belt”, é uma região dos Estados Unidos que ganhou esse nome devido à sua forte associação com a indústria pesada e a produção manufatureira, setores que, a partir das décadas de 1970 e 1980, enfrentaram um declínio acentuado. Trata-se da região mais operária do país, abrangendo, principalmente, estados do Nordeste e Centro-Oeste, incluindo Michigan, Ohio, Pensilvânia, Indiana, Illinois e Wisconsin, entre outros.
Historicamente, o cinturão da ferrugem foi o motor industrial dos Estados Unidos, sustentando a economia do país com a produção de automóveis, aço, máquinas e outros produtos manufaturados. Grandes centros industriais, como Detroit em Michigan e Pittsburgh na Pensilvânia, prosperaram devido às indústrias automotiva e siderúrgica, atraindo uma grande quantidade de trabalhadores e consolidando uma cultura operária forte e bem organizada.
A importância do Cinturão da Ferrugem não é apenas econômica, mas também política. Durante grande parte do século XX, os estados dessa região foram considerados redutos democratas, uma vez que as políticas do partido costumavam alinhar-se, mesmo que demagogicamente, com as necessidades da classe trabalhadora, oferecendo suporte aos sindicatos e promovendo medidas que visavam garantir empregos.
Contudo, com o processo de desindustrialização que se intensificou nas últimas décadas, muitas dessas cidades e estados enfrentaram uma perda massiva de empregos, fechamento de fábricas e um declínio populacional significativo. A indústria automobilística em Detroit, por exemplo, que já foi um símbolo de prosperidade norte-americana, passou por crises que levaram à falência de grandes montadoras e ao colapso econômico da cidade.
Esse declínio econômico causou uma transformação no panorama político do Cinturão da Ferrugem. Muitos eleitores que antes apoiavam o Partido Democrata começaram a sentir que suas demandas por empregos e estabilidade econômica não eram mais atendidas pelas propostas democratas. A insatisfação crescente entre a população operária levou à ascensão de um novo perfil de eleitorado mais propenso a apoiar candidatos que prometessem a revitalização da indústria, como Donald Trump em 2016 e 2020.
Durante as eleições presidenciais de 2024, o Partido Democrata, liderado por Kamala Harris, sofreu derrotas expressivas nos estados do Cinturão da Ferrugem, destacando a mudança no apoio da classe trabalhadora. Em Michigan, Trump obteve 52% dos votos contra 46% de Harris, revertendo uma vantagem democrata de eleições passadas. Ohio viu uma vitória ainda mais expressiva de Trump, com 54% dos votos comparados aos 44% de Harris, consolidando um distanciamento significativo dos democratas. Na Pensilvânia, um estado tradicionalmente disputado, Trump venceu por uma margem de 50,5% a 48,5%.
Indiana continuou a ser um bastião republicano, com Trump conquistando 58% dos votos, enquanto Harris obteve apenas 40%, uma diferença de 18 pontos percentuais. Illinois, por outro lado, resistiu à onda republicana e permaneceu fiel aos democratas, com Harris alcançando 55% dos votos contra 43% de Trump. Wisconsin, outro estado crucial, mostrou um resultado de 51% para Trump e 47% para Harris, uma virada em relação ao histórico de vitórias democratas na região.
Esses resultados refletem uma tendência de fortalecimento do trumpismo no Cinturão da Ferrugem, impulsionada pela percepção de que os democratas não atenderam às necessidades concretas da classe trabalhadora. Embora o Partido Republicano tenha se beneficiado eleitoralmente, é o movimento trumpista, com sua política anti-regime e suas promessas de revitalização econômica, que efetivamente mobilizou os eleitores. Essa distinção é importante, pois há uma ala dentro do Partido Republicano tão comprometida com o neoliberalismo quanto os democratas, o que torna o crescimento do partido mais atribuído ao apelo de Trump e suas ideias do que à política republicana em si.
O identitarismo, promovido como principal política por setores do Partido Democrata, não é apenas insuficiente – é uma política reacionária que serve aos interesses do imperialismo. Essa ideologia, na verdade, age como uma distração que mascara as verdadeiras políticas de austeridade e repressão. Ao tentar substituir a luta por direitos concretos e condições de vida melhores por reivindicações superficiais e individualistas, os democratas perderam uma parte significativa do eleitorado.
A rejeição à política identitária não se dá apenas porque elas falharam em trazer resultados concretos, mas porque são vistas como parte do regime de arrocho promovido pelo neoliberalismo. Enquanto a classe trabalhadora enfrenta desafios como desemprego, queda nos salários e falta de segurança econômica, a insistência em uma ideologia que ignora essa realidade afasta a população do Partido Democrata.
O eleitorado do Cinturão da Ferrugem deixou claro que não está disposto a seguir o partido que é o principal responsável pela destruição econômica dos Estados Unidos, nem mesmo pintado de rosa. A rejeição ao identitarismo é, portanto, uma expressão direta da rejeição ao neoliberalismo que ele representa.