Em 1948, ano em que milícias fascistas do sionista expulsaram mais de 800 mil palestinos de suas terras para que fosse possível a fundação de “Israel”, dezenas de campos de refugiados foram erguidos em países próximos. Um deles foi o Líbano. E um dos principais campos de refugiados de palestinos no Líbano, o segundo maior especificamente, é o Campo de Rashidié.
É localizado no litoral sul do país, em uma localidade chamada Ras el Ain, próxima à cidade de Tiro, uma das cidades habitadas ininterruptamente mais antigas do mundo, a qual possui uma história milenar, que data à época em que o Líbano era a Fenícia, embora não cumpra se aprofundar nessa história aqui.
Quando a fundação de “Israel” foi proclamada por Davi Ben Gurion, em maio de 1948, e a ofensiva das tropas fascistas sionistas estava em seu auge, milhares de palestinos fugiram para a região de Ras el Ain, onde já existia o Campo de Rashidié, fundado em 1936 pelo Mandato Francês sobre o Líbano para abrigar refugiados do genocídio armênio.
A primeiro momento, os palestinos foram alocados em tendas na Municipalidade de Burj el-Shemali, município adjacente a Rashidié. Refugiados armênios continuaram vivendo na localidade. Em 1963, refugiados palestinos que estavam nos campo de El Bass e na cidade de Balbeque foram realocados pelo governo libanês para Rashidié, que foi expandido para acomodar os novos habitantes.
Em razão do Setembro Negro, isto é, acontecimento em que a monarquia jordaniana, impulsionada pelo imperialismo, utilizou as Forças Armadas da Jordânia para expulsar o Fatá, a OLP e toda a resistência palestina do país, com um banho de sangue, milhares de palestinos tiveram de se refugiar no Líbano, onde também a OLP se restabeleceu. E um dos campos onde grande parte dos refugiados se estabeleceram foi Rashidié.
Uma vez que a resistência palestina estava agora estabelecida no país dos cedros, e não mais na Jordânia, Rashidié (assim como outros campos), se tornou um dos focos de luta contra “Israel”, tornando-se progressivamente um local de recrutamento e treinamento para o braço armado do Fatá, al-Asifá.
Mas não bastava aos sionistas expulsar os palestinos de suas próprias terras. Precisava garantir que eles nunca retornassem. O que significava destruir a resistência. Então, a expulsão da OLP da Jordânia não foi suficiente, de forma que já em 1970 “Israel” começou a atacar as posições da resistência no Líbano. Mas não só os combatentes e seus quadros organizados. Também os civis. Em 19 de maio a marinha das forças de ocupação bombardeou Rashidié, assassinado 5 pessoas, e ferindo mais 11. Não bastando, outras 5 foram assassinadas e 21 feridas no dia 20 de junho, quando a força aérea israelense bombardeou o campo.
Em 1975, o imperialismo e “Israel” desencadearam uma guerra de agressão no Líbano para destruir a OLP e um crescente movimento nacionalista e antissionista libanês. A guerra assumiu a forma de guerra civil, pois parte da população libanesa, especificamente partidos e milícias fascistas de cristãos maronitas, foram impulsionados como serviçais do imperialismo e de “Israel”.
Nessa conjuntura, a cidade de Tiro, e também o campo de Rashidié, foi alvo de inúmeros bombardeios das forças israelenses de ocupação. Contudo, a partir do campo houve também resistência. Entre os anos de 1978 e 1981, a OLP, contando com cerca de 1.500 combatentes, realizou disparos frequentes de foguetes katiusha contra “Israel”, especificamente a Galileia.
Percebendo que não conseguiria acabar com a OLP apenas se utilizando das milícias fascistas do cristianismo maronita, “Israel” entra em guerra formalmente contra o Líbano em 1982. Este Diário já expôs em outras matérias as atrocidades que “Israel” cometeu durante essa guerra, a exemplo do Massacre de Sabra e Chátila, perpetrado na cidade de Beirute, região central do Líbano.
Atrocidades também foram cometidas no Sul, em Tiro e em Rashidié. À época, o campo abrigava cerca de 30 mil palestinos. Em 6 de junho, as forças israelenses de ocupação invadiram o sul do Líbano, sendo Rashidié um dos principais alvos. O pretexto utilizado para a invasão foi a tentativa de aniquilação do sionista Shlomo Argov, embaixador israelense em Londres. Utilizando-se de seu tradicional modus operandi, a invasão foi combinada com intenso bombardeio, no qual as forças de ocupação utilizaram bombas de fragmentação.
Segundo Noam Chomsky, analista político norte-americano, já no segundo dia da criminosa ofensiva sionista grande parte de Rashidié “havia se tornado um campo de escombros”.
Françoise Kesteman, uma enfermeira francesa, também membro do Partido Comunista Francês, deu, à época, o seguinte testemunho das atrocidades das forças israelenses de ocupação, expondo a política de assassinato proposital de civis, ao relatar a morte de uma mãe palestina:
“Quando Mouna deixou o abrigo antiaéreo para buscar comida para as crianças, os bombardeiros israelenses destroçaram seu corpo pequeno e esguio.”
A repressão sionista que Kesteman viu em Rashidié a fez pegar em armas e se juntar à resistência palestina. Após dois anos lutando contra o sionismo, ela seria martirizada, tornando-se a primeira francesa a se sacrificar em defesa do povo palestino.
Apesar de combates contra a resistência terem cessado após uma semana, as tropas sionistas permaneceram ocupando e cercando o campo, impedindo a entrada da Cruz Vermelha por cerca de cinco semanas. Utilizando-se escavadoras, exatamente como faz hoje na Cisjordânia e na Palestina, destruiu cerca de 60% das estruturas do Campo de Rashidié.
Em 1985, um conflito emergiu em meio à Primeira Guerra do Líbano. Esse conflito ficou conhecido como a Guerra dos Campos. Uma milícia xiita de nome Amal, que era apoiada pela Síria, liderou ataque contra posições da OLP, do Hesbolá e várias outras organizações antiimperialistas e antissionistas em vários campos de refugiados, um dos quais o de Rashidié. Neste confronto, mais de 6 mil pessoas morreram, graças ao estado de guerra que o imperialismo e “Israel” haviam provocado no Líbano.
Já nos anos 1990, mesmo com o fim formal da Primeira Guerra do Líbano, o Estado sionista continuou realizando bombardeios pontuais contra localidades no sul do país. Afinal, os sionistas continuavam ocupando parte do território, cujo nome cínico era Estado Livre do Líbano. Em 24 de outubro de 1990, Rashidié acabou sendo alvo de um dos bombardeios das forças de ocupação, resultando na destruição de uma escola e no assassinato de cinco pessoas.
A população do campo também foi alvo da agressão sionista quando da Guerra do Líbano de 2006, isto é, a guerra de agressão sionista contra o país. Em 8 de agosto, Rashidié foi alvo de bombardeio das forças de ocupação. Graças a ataques mais intensos em localidades mais ao sul do país, o campo, que inicialmente foi criado para receber armênios e depois palestinos, recebeu cerca de 1.000 refugiados libaneses, vindos do sul.
Vale lembrar que, nessa guerra, as forças israelenses de ocupação foram militarmente derrotadas pelo Hesbolá, falhando em sua tentativa de destruir o partido.
Ao contrário da maioria dos campos do Líbano, cuja maioria da população palestina é adepta do cristianismo, em Rashidié os palestinos são muçulmanos. Lá o nacionalismo palestino é forte, podendo ser constatado por toda parte, seja em murais, pôsteres, bandeiras, as quais retratam a luta palestina por sua libertação nacional e o retorno às terras que lhes foram roubadas por “Israel”.