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São Paulo

Calamidade: mais da metade dos paulistanos sofrem com a fome

Defasagem entre os salários e o custo de vida leva fome a mais da metade dos domicílios da cidade mais rica do País, provando que a política econômica precisa mudar com urgência

Mais de 5,8 milhões de pessoas vivendo em um estado no qual podem não conseguir se alimentar, tiveram de reduzir a variedade de alimentos, as porções ou pular refeições, ou então passaram um dia inteiro sem comer nada entre os meses de maio e julho de 2024. O cenário de tamanha catástrofe não foi o semiárido nordestino ou estados do Norte do País, mas a cidade de São Paulo. Os dados foram divulgados na última sexta-feira (19) e fazem parte do 1º Inquérito sobre a Situação Alimentar no Município de São Paulo, pesquisa inédita sobre o tema na cidade mais rica do País e uma das mais ricas do mundo.

Com esse dado, mais da metade (50,5%) dos paulistanos estão submetidos a algum grau de “insegurança alimentar”, eufemismo criado para unir as famílias atingidas pelo flagelo da fome e as que vivem sob ameaça de não comerem. Na capital paulista, essa situação castiga um percentual equivalente a quase o dobro da média nacional: 27,6% dos brasileiros, segundo a pesquisa Pnad Contínua do IBGE, referente ao ano de 2023. Segundo o estudo, as diferentes escalas são caracterizadas da seguinte forma:

“Insegurança Alimentar (IA) Leve – Há preocupação ou incerteza quanto ao acesso do alimento no futuro; qualidade inadequada dos alimentos resultante de estratégias que visam não comprometer a quantidade dos alimentos.

Insegurança Alimentar (IA) Moderada – Há redução na quantidade de alimentos e/ou ruptura nos padrões alimentares de alimentação resultante da falta de alimentos.

Insegurança Alimentar (IA) Grave ou fome – Há redução quantitativa de alimentos, ruptura dos padrões de alimentação resultante da falta de alimentos entre todos os moradores. Nessa situação, a fome passa a ser uma experiência vivida no domicílio.”

O Inquérito, ainda que 1,4 milhão de habitantes da cidade de São Paulo (12,5%, equivalente a toda a população de Goiânia) residiam em domicílios onde a fome era uma realidade, “ou seja, em que foi constatada a ruptura nos padrões de alimentação devido a falta de dinheiro para adquirir alimentos (insegurança alimentar grave)”, diz o estudo. “Outras 1,5 milhões de pessoas (13,5%) viviam em residências nas quais foi constatada a redução quantitativa de alimentos (insegurança alimentar moderada)”, o que é um eufemismo para a situação famélica em que se encontra um contingente maior do que a maioria das cidades brasileiras. “Por fim, em uma situação menos grave, mas ainda assim muito preocupante, cerca de 2,8 milhões de pessoas (24,5%) residiam em domicílios nos quais foi constatada a preocupação ou incerteza quanto ao acesso aos alimentos no futuro próximo (insegurança alimentar leve)”, conclui o estudo.

No que diz respeito à distribuição espacial do flagelo, o estudo coloca a Zona Leste como a regiçao mais atingida, seguida pela Zona Sul. Constataram os pesquisadores:

“Aproximadamente 72% das pessoas em insegurança alimentar grave (fome) residiam nas áreas mais periféricas do município: 446 mil na ‘Leste 2’, 297 mil na ‘Sul 2’, 205 mil na ‘Norte 2’ e 86 mil na ‘Oeste 2’. Ao mesmo tempo, mesmo em áreas centrais em que a proporção de domicílios em segurança alimentar é maior, muitos domicílios estão submetidos à insegurança alimentar grave (fome): é o caso da área ‘Oeste 1 e Sul1’, na qual 185 mil pessoas residem em domicílios nesta situação.”

A região Leste 2 compreende os distritos de Ermelino Matarazzo, Ponte Rasa, Itaquera, Cidade Líder, José Bonifácio, Parque do Carmo, São Mateus, Iguatemi, São Rafael, São Miguel, Jardim Helena, Vila Jacuí, Itaim Paulista, Vila Curuçá, Guaianases, Lajeado e Cidade Tiradentes. Já a Sul 2 abrange Cidade Ademar, Pedreira, Campo Limpo, Capão Redondo, Vila Andrade, Jardim Ângela, Jardim São Luís, Socorro, Cidade Dutra, Grajaú, Parelheiros, Marsilac, Santo Amaro e Campo Grande. “Ao mesmo tempo”, destacam os responsáveis, “mesmo em áreas centrais em que a proporção de domicílios em segurança alimentar é maior, muitos domicílios estão submetidos à insegurança alimentar grave (fome): é o caso da área ‘Oeste 1 e Sul1’, na qual 185 mil pessoas residem em domicílios nesta situação”, concluem.

Por fim, a pesquisa destaca que apenas 55,7% dos domicílios paulistanos habitados por brancos encontram-se em situação de segurança alimentar, isto é, não têm preocupações com a aquisição de alimentos, o que implica em 44,3% da população branca da cidade em estado famélico, ou na iminência de ser atingida pelo flagelo. Entre os domicílios habitados por famílias negras, o percentual de segurança alimentar cai para 39,3%.

Quando o recorte é feito com base na ocupação, um indicativo eloquente da gravidade da crise social brasileira é exposta: apenas 57,8% dos trabalhadores com carteira de trabalho assinada encontram-se em situação de segurança alimentar. 9,7% sofrem a versão mais atenuada da fome, enquanto 6,9% experimentam a forma mais grave do flagelo. Outro dado chocante é que 47,8% dos aposentados são atingidos pela fome, com 21,2% sofrendo as formas moderada ou grave disso.

A pesquisa é resultado de uma parceria entre o Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional de São Paulo (COMUSAN-SP), o Observatório de Segurança Alimentar e Nutricional da Cidade de São Paulo (OBSANPA) e pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e da Universidade Federal do ABC (UFABC). Em busca da reeleição, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) criticou a divulgação da pesquisa, acusando-a de “uso irresponsável e eleitoral de um assunto tão sério como a segurança alimentar e combate à fome”, contestando também os dados divulgados, nitidamente, mais preocupado com as consequências eleitorais do flagelo do que o fenômeno em si.

Finalmente, a pesquisa desmente a propaganda dos setores da esquerda que insistem em dizer que a economia vai bem, sendo uma demonstração eloquente do contrário. Que um direitista golpista como Ricardo Nunes tergiverse a respeito é esperado, embora desumano, mas de qualquer forma coerente com a escória social que representa. O governo federal não pode ter a mesma política.

A defasagem dos salários em relação ao custo de vida real dos trabalhadores é um problema que precisa de solução urgente, o que, necessariamente, implica em reajustes contundentes no salário mínimo. No mês de agosto, o valor médio da cesta básica de alimentos medida pelo DIEESE ficou em R$786,35, fazendo com que uma única cesta consumisse 60% do salário mínimo de R$1.412. 

Para o tamanho médio das famílias trabalhadoras, com dois adultos e duas crianças (consumindo meia cesta cada), não há outro resultado possível além da fome. O governo deve mudar urgente e drasticamente sua política de salários para que as necessidades fundamentais dos trabalhadores, como alimentar a si e suas famílias, seja atendida.

Da mesma forma, é urgente uma mudança completa na política econômica, para que a economia cresça de maneira a acomodar a imensa massa de trabalhadores desempregados, o que inclui desalentados e os que sobrevivem de bicos, que não estão efetivamente trabalhando, mas sobrevivendo a duras penas em meio a um cenário cada vez mais ameaçador. A situação dos trabalhadores brasileiros é insustentável e sem uma reversão total dessa política, a única consequência é a desmoralização do governo do presidente Lula junto a sua base de apoio, abrindo caminho para aventuras golpistas como as que se manifestam em toda a América Latina e no resto do mundo.

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