Rompendo com o tédio dos debates eleitorais dominados pelos marqueteiros, em que os políticos repetem as mesmas promessas esfarrapadas feitas a cada dois anos sobre saúde, educação e emprego, o candidato a prefeito de São Paulo pelo Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB), José Luís Datena, resolveu arremessar uma cadeira contra o seu oponente Pablo Marçal, do Partido Renovador Trabalhista do Brasil (PRTB). A cena ocorreu no último domingo (15), enquanto os candidatos participavam do debate promovido pela TV Cultura.
O que aconteceu era previsível. Desde sua primeira aparição em um debate, Marçal vinha provocando os seus adversários, seja por meio de ofensas, seja por meio de mentiras absurdas. Grosseiro e de extrema direita, Marçal ganhou fama ao dispensar propostas acerca da administração municipal e se dedicar a acusar Guilherme Boulos (PSOL) de ser um “aspirador de pó”, de chamar o prefeito Ricardo Nunes (MDB) de “comunista” de insinuar que José Luís Datena seria um estuprador.
Ao mesmo tempo em que Marçal se mostrou um grande provocador, Datena vinha se mostrando como o candidato emocionalmente mais afetado pelo seu oponente. Em debate anterior, o candidato tucano chegou a quebrar o protocolo da emissora e se encaminhou em direção a Marçal, ameaçando-lhe dar um tapa.
Seja Marçal um provocador ou não, a atitude de Datena apenas reforça que Marçal, em essência, tinha razão: o político tucano não tem conteúdo. É um farsante enquanto político. A tal ponto que é incapaz de debater com um cidadão que visivelmente não tem nada de positivo a oferecer para o povo paulistano.
A cadeirada de Datena não é um ato de coragem, como vem sendo apontado por muitos. Não expressa uma vitória política contra as provocações de Marçal. É, acima de tudo, uma admissão de que o candidato tucano é incapaz de responder às críticas. É incapaz de dizer: eu, Datena, não sou parte do “sistema”. Eu, Datena, não sou ligado às máfias que governam São Paulo há décadas. Datena deu razão a tudo o que diz Marçal – inclusive às mentiras.
Qual seria a dificuldade de dizer que Marçal mente porque é um picareta que não fala abertamente o que defende para São Paulo? Qual a dificuldade de dizer que as provocações de Marçal visam esconder que ele defende uma política de arrocho contra a população? Qual a dificuldade de dizer que Marçal faz tanta pirotecnia porque é a favor das medidas antidemocráticas tomadas pelo Supremo Tribunal Federal? Ora, muito simples! Porque o programa de Datena e de Marçal são, substancialmente, os mesmos.
Em um debate político, raríssimas são as exceções nas quais a força é a melhor saída. Exceto em situações de ameaça e intimidação física por parte da extrema direita, partir para a agressão é perder o debate.
Embora a reação de Datena seja a reação de um fracassado, em sua defesa, é preciso dizer: dar uma cadeirada no adversário é muito mais honesto – e, digamos, mais democrático – do que processar os oponentes. Finalmente, uma briga é uma briga – um ataca, o outro se defende, e ali mesmo o conflito é resolvido. Processar o outro, além de ser uma atitude covarde, pois visa se valer das arbitrariedades de um juiz para se defender, contribui para que se estabeleça uma ditadura contra a liberdade de expressão no País. Os processos são, no final das contas, uma forma de eliminar o debate e, assim, suprimir a discussão política no interior da sociedade.
O mais curioso de tudo, no entanto, foi ver um setor da esquerda alçando Datena ao posto de seu mais novo herói. O portal Brasil 247, que tanto fala em “democracia”, ao ponto de aplaudir as barbaridades praticadas por Alexandre de Moraes, em nome desse “bem”, agora aplaude uma cadeirada contra um candidato por… falar. Fosse Marçal quem tivesse agredido alguém, com a mais absoluta certeza o portal estaria exigindo a sua prisão perpétua.
A cadeirada em Marçal, na medida em que é um ataque a um inimigo político – e, mais ainda, um inimigo que é pintado como vilão pela Rede Globo -, forneceu à esquerda a oportunidade de exaltar mais um delinquente político. Após desenterrar o defunto de Reinaldo Azevedo, descartado pela grande burguesia após seus serviços prestados no golpe de 2016 e após virar fã do youtuber Felipe Neto, que abandonou Jair Bolsonaro (PL) quando percebeu que a Terceira Via dava mais dinheiro, a esquerda agora mergulha na lama onde vive José Luís Datena, o homem do “bandido bom é bandido morto”.