Após décadas sem promover explicitamente um dos partidos nos Estados Unidos, Bill Gates, bilionário da tecnologia e um dos homens mais ricos do mundo, revelou ter feito recentemente uma doação de 50 milhões de dólares para uma organização sem fins lucrativos que apoia a candidatura presidencial da vice-presidente Kamala Harris, de acordo com reportagem publicada no jornal norte-americano New York Times.
Segundo o órgão, a doação foi feita para ser mantida em sigilo. Gates, um dos fundadores da Microsoft, não endossou publicamente Harris e sua doação representa uma mudança significativa em sua estratégia, que anteriormente o mantinha distante de contribuições desse tipo. Em ligações privadas neste ano com amigos e outros, o bilionário da tecnologia expressou preocupação sobre o que poderia ser uma segunda presidência de Donald Trump, embora tenha destacado que poderia trabalhar com qualquer um dos candidatos.
Bill Gates fez elogios ao trabalho do governo Biden-Harris em questões climáticas. Segundo fontes do New York Times, a fundação filantrópica de Gates, a Fundação Bill & Melinda Gates, estaria preocupada com potenciais cortes em programas de planejamento familiar e saúde global caso Trump seja eleito.
“Eu apoio candidatos que demonstram um claro compromisso com a melhoria da saúde, redução da pobreza e combate às mudanças climáticas nos EUA e ao redor do mundo”, disse Gates ao New York Times. “Tenho uma longa história de trabalho com líderes de todo o espectro político, mas esta eleição é diferente, com uma importância sem precedentes para os americanos e as pessoas mais vulneráveis do mundo.”
Nos últimos anos, o bilionário esteve ativamente envolvido com as questões de saúde global. No início de 2021, em meio à pandemia de Covid-19, foi um dos principais agentes no impedimento da quebra da patente da vacina, dificultando sua distribuição e acesso gratuito. Quando o diretor do Instituto Jenner de Oxford apresentou a ideia de colocar os direitos de sua candidata a vacina, apoiada pela COVAX, em domínio público, Gates interveio.
Ação entre bilionários
Gates disse que fez sua doação à Future Forward, o principal grupo de arrecadação de fundos externos que apoia Harris. Ele discutiu sua doação pró-Harris com seus pares, incluindo o também bilionário Mike Bloomberg, um importante apoiador da Future Forward, que considerou uma doação de valor semelhante.
Bloomberg e Gates são amigos de longa data, unidos por ONGs dedicadas a questões de saúde pública e mudanças climáticas. Gates, com uma fortuna estimada em 162 bilhões de dólares, tem sido incentivado por amigos e doadores democratas a se envolver na derrota de Trump.
O envolvimento de Gates surpreendeu executivos veteranos da Fundação Gates. O bilionário disse a um entrevistador, após a entrada de Harris na corrida presidencial neste verão, que “você talvez possa prever” quem ele apoiaria na eleição, mas que não era “um influenciador político”. “Eu não digo às pessoas como votar porque estou tão associado à fundação que trabalha com qualquer governo”, disse ele. “Acho ótimo ter alguém mais jovem que possa pensar em coisas como IA e como moldá-la da maneira correta.”
Dois dos filhos de Gates, Rory e Phoebe Gates, tornaram-se doadores democratas e desempenharam um papel importante em encorajar seus pais a levarem a sério as doações políticas, segundo três pessoas com conhecimento do assunto. Ambos estão na faixa dos 20 anos e naturalmente, os milhões de dólares que doam vêm em grande parte, de seus pais.
Gates é uma das pessoas mais destacadas no mundo da filantropia, com uma rede de doadores ricos que o respeitam profundamente. Muitas dessas pessoas fazem parte da comunidade Giving Pledge, um grupo de bilionários organizado por Gates e Melinda French Gates que promete doar pelo menos metade de seus bens para causas beneficentes.
Sua ex-esposa Melinda French Gates também se envolveu nas doações políticas neste ciclo, fazendo uma doação à organização sem fins lucrativos da Future Forward.
Financiar a campanha de Kamala Harris, sim! Fazer isso às claras, não!
A doação de Gates foi especificamente para o braço sem fins lucrativos da Future Forward, a Future Forward USA Action, que, como uma organização de dark money (“dinheiro obscuro”, em português), não divulga seus doadores, de acordo com as pessoas informadas. Portanto, qualquer contribuição de Gates nunca aparecerá em registros públicos.
Esses grupos de dark money são organizados como grupos de bem-estar social ou associações comerciais, ambas formas de organizações sem fins lucrativos que não são obrigadas pelo Serviço de Receita Federal a divulgar seus doadores.
Doar para um grupo de dark money oferece certa proteção: alguns doadores ricos que apoiam Harris estão nervosos em serem publicamente identificados com sua campanha, temendo que Trump busque vingança após novembro.
A Future Forward tem liderado a ofensiva publicitária contra Trump neste outono. A doação de Gates pode, mesmo no final da eleição, ajudar a financiar anúncios contra Trump. O braço sem fins lucrativos enfrenta algumas restrições quanto ao valor que pode gastar em mensagens explicitamente anti-Trump, mas doou mais de 170 milhões de dólares a Future Forward, que não enfrenta tais restrições.
A campanha de Kamala Harris tem uma grande vantagem sobre a campanha de Donald Trump em contribuições de super PACs provenientes de grupos sigilosos de tipo dark money. Dos 195,8 milhões de dólares arrecadados nesse formato de contribuição para a campanha de Kamala Harris, a Future Forward USA Action é a maior financiadora com 96,2 milhões de dólares. Valor muito superior aos 20,2 milhões de dólares colocados na campanha de Trump.
O suporte dos bilionários como Bill Gates, ligado ao ramo da tecnologia, e Mike Bloomberg, conhecido especulador do mercado financeiro, à campanha de Kamala Harris coloca à prova a imagem de que a candidata democrata representa uma alternativa à dominação da política americana por bilionários.