O Governo Federal, por meio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, propôs uma alteração significativa no abono salarial, uma medida que faz parte do Pacote Fiscal (Plano Haddad) em discussão no Congresso Nacional. Segundo a Proposta de Emenda à Constituição (PEC), o benefício, que atualmente contempla trabalhadores que ganham até dois salários mínimos, com a inflação intencionalmente sem reajuste, conforme o texto da proposta, sofrerá uma redução gradativa. A partir de 2026, ano eleitoral, o limite começará a cair até atingir um máximo de 1,5 salário mínimo em 2035.
De acordo com Haddad, a medida visa ajustar os custos do programa, que vem aumentando nos últimos anos – de R$25,6 bilhões em 2023 para R$28 bilhões em 2024, com projeções de ultrapassar R$30 bilhões em 2025. A economia prevista é de R$18,1 bilhões até 2030, mas o impacto direto será sentido por uma parcela significativa da população.
Atualmente, o abono salarial beneficia trabalhadores que recebem até dois salários mínimos por mês, ou seja, cerca de R$2.640 em valores de 2023. O governo estima que a nova regra reduzirá gradativamente o número de trabalhadores elegíveis, supostamente acompanhando um aumento real do Salário Mínimo. O que não é totalmente verdadeiro, pois a taxa de inflação é uma média, que quase sempre é inferior ao aumento real do custo de vida, de maneira que o reajuste com aumento real (acima da inflação) não deve considerar a inflação do custo de vida. A partir de 2026, por exemplo, o limite será de 1,95 salário mínimo, excluindo imediatamente centenas de milhares (pode chegar a um milhão a depender da projeção) de pessoas.
Estudos indicam que, ao longo da transição, entre 7 e 11 milhões de trabalhadores deixarão de receber o benefício. Para muitas famílias, esse valor é extremamente necessário para complementar a renda e arcar com despesas essenciais.
Viver com dois salários mínimos no Brasil é um desafio. Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o salário mínimo ideal para suprir as necessidades básicas de uma família de quatro pessoas – incluindo alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência – deveria ser de aproximadamente R$ 6.500. Com dois salários mínimos, muitas famílias mal conseguem cobrir custos como aluguel, contas de energia e água, e alimentação básica, sendo obrigadas a viver em insegurança alimentar e, muitas vezes, em sublocações.
O corte no abono salarial vem em um cenário de pressões inflacionárias que atingem principalmente os insumos básicos e os aluguéis, encarecendo, de forma desproporcional a qualquer reajuste, o custo de vida médio. Além disso, para trabalhadores em setores de baixa remuneração, o benefício representa uma fração considerável da renda anual. A redução do alcance do programa pode aprofundar as desigualdades e prejudicar ainda mais as populações mais vulneráveis.
Apesar de o governo argumentar que o abono salarial continuará existindo, a progressiva diminuição no teto para recebimento na prática exclui uma parcela significativa da população. A justificativa é que programas sociais como o Bolsa Família têm maior alcance e impacto. Contudo, esses programas possuem perfis diferentes e não substituem completamente o papel do abono salarial no orçamento dos trabalhadores formais e, fundamentalmente, nenhum deles compensa o suficiente para sustentar uma vida digna. Dessa forma, ao retirar uma das medidas compensatórias da exploração, os trabalhadores terão suas condições já precárias pioradas.