No artigo Lula deve acatar fim da saidinha; aliados listam razões para não vetar, publicado pelo veículo Correio Brasiliense, são apresentados vários supostos argumentos de “aliados” do governo Lula que são favoráveis ao fim do direito democrático dos presos brasileiros às chamadas “saidinhas”. A matéria não cita exatamente quem seriam os interlocutores – no entanto, serve para expor alguns argumentos que circulam na esquerda acerca desse assunto.
Recorrer a um artigo obscuro da imprensa burguesa foi o que nos coube, uma vez que nenhum dos nobres deputados da esquerda nacional que decidiram votar a favor do fim das “saidinhas” se deu ao trabalho de apresentar, publicamente, suas justificativas. Somos obrigados, portanto, a, neste caso, concordar com a direitista Rosângela Moro, esposa do senador golpista Sergio Moro (União Brasil), que disse, em seu perfil nas redes sociais: “surreal os argumentos do governo e aliados que na tribuna defendem a saidinha de bandidos mas, que no voto, não tem coragem de deixar a digital“.
O primeiro argumento apresentado pelo Correio Brasiliense é o de que “o assunto é popular”. Isto é, a esmagadora maioria da população seria a favor de proibir as “saidinhas”. Não há, em primeiro lugar, nenhuma pesquisa séria que mostre isso. Mas o problema vai muito além. Dizer que é “popular” significaria dizer que a maioria da população seria contra que 800 mil pessoas miseráveis não tivessem sequer o direito de sair da cadeia meia dúzia de vezes ao ano. Seria dizer que a esmagadora maioria da população, que é pobre e, portanto, muito provavelmente tem algum conhecido na cadeia, defende que a população pobre mofe naquilo que é um verdadeiro inferno na Terra.
A cadeia, todo brasileiro sabe, não é um lugar para aprisionar “bandidos”. Não é à toa que os maiores criminosos do País estão todos livres. Criminosos que condenam a população à mais absoluta miséria, à fome, à falta de emprego. A cadeia é onde os poderosos amontoam a população pobre, que não tem como se defender das arbitrariedades do Estado. Quase 50% da população que hoje está presa sequer foi julgada! O que seria popular é uma política verdadeira para acabar com as mazelas sociais: emprego, saúde, educação, saneamento básico etc.
O segundo argumento é impressionante pelo seu caráter infantil. Segundo o artigo, se opor ao projeto de lei que visa acabar com as saidinhas seria “comprar uma briga com o segmento bolsonarista mais alarmista e ‘lacrador’, que é a bancada da bala”. Ora, coloquemos na balança. O que é mais importante: o sofrimento de 800 mil almas ou o medo da esquerda da gritaria de alguns deputados que são tão desprezíveis que apoiam o assassinato de crianças na Faixa de Gaza? Alguém realmente acha que é uma justificativa séria ignorar a vida de centenas de milhares de brasileiros apenas para não se indispor contra os deputados bolsonaristas?
Tal indisposição, por sua vez, não seria real. Se a esquerda tomasse a iniciativa de não apenas defender os direitos democráticos dos presos, mas também de denunciar a extrema direita como sádicos inimigos do povo, quem sairia perdendo era a direita.
Indo no mesmo sentido do argumento anterior, Correio Brasiliense também especula que, caso a esquerda votasse contra o projeto, “com o resultado exibido no painel, os oposicionistas vão produzir imagem de celebração, o que não ocorreu na quarta-feira, quando se deu uma votação simbólica“. É um argumento de um verdadeiro idiota. Sendo assim, toda vez em que a esquerda estiver em desvantagem em uma disputa no parlamento, ela deverá apoiar a política de direita! Não haveria então porque a esquerda existir como tal.
O parlamento sempre será um ambiente desfavorável para a esquerda. É uma instituição dominada pelo que há de mais reacionário na sociedade. Basta lembrar que, há oito anos, essa mesma quadrilha se reuniu para depor a presidenta da República eleita pelo povo brasileiro, em meio a uma das conspirações mais grotescas já vistas. Se a única política da esquerda for torcer para chegar o dia em que haja uma votação que lhe seja favorável, é melhor decretar falência.
O parlamento, na medida em que franqueia aos deputados e senadores o uso da tribuna, bem como uma série de direitos democráticos, deve ser utilizado não para negociatas com aqueles que nada querem para o povo brasileiro, mas sim para denunciar quem são os inimigos do povo e mostrar quem são seus verdadeiros aliados. Ao votar com a direita, a esquerda acabou por desperdiçar mais uma oportunidade de culpar a direita pela desgraça em que se encontra a população. Quem ganha com tudo isso é a direita, que não só aprova seus projetos, como ainda arrasta aqueles que deveriam ser oposição para o seu lado.