“De vez em quando o jurista Miguel Reale Jr. tem boas ideias.” Com essas palavras, o colunista do portal Brasil 247, Alex Solnik, abre seu artigo intitulado Uma tornozeleira cairia bem para Bolsonaro.
Como o título deixa claro, Solnik se empolgou com a posição defendida por Reale Jr., em entrevista ao Uol News na última sexta (22). Para o jurista, haveria razões para pedir prisão domiciliar a Bolsonaro ou o uso de tornozeleira eletrônica. O colunista não consegue esconder sua felicidade com a inventividade do “homem da lei”.
Miguel Reale Jr., vale recordar, é figura ligada há tempos ao PSDB. Foi Ministro da Justiça do criminoso governo Fernando Henrique Cardoso. Em tempos recentes, ao lado de Hélio Bicudo e Janaína Paschoal, foi um dos juristas que protocolaram o pedido de impeachment contra a presidente do PT, Dilma Rousseff. É, um suma, um homem ligado à direita golpista e pró-imperialista.
A Operação Contragolpe, a cargo da Polícia Federal, voltou a lançar o estratagema da “trama golpista” para pressionar Bolsonaro. E pela milésima vez, setores da esquerda tornaram a ficar excitados com a possibilidade (longínqua e quase irreal, diga-se) de ver Bolsonaro colocado para fora política pela via policial e repressiva. Solnik é um representante marcante desses setores.
Para ele, contra Bolsonaro vale tudo. Vale, especialmente, destruir os frágeis direitos e liberdades democráticas garantidos, em alguma medida, pelo regime político. “Há muito tempo ele [Bolsonaro] já deveria ter sido impedido de realizar comícios, e se manifestar politicamente por redes sociais”, pontua o jornalista. Ou seja: Bolsonaro deveria ter suas liberdades de expressão e manifestação cassadas.
Solnik é um defensor do combate ao bolsonarismo por meio de arbitrariedades policiais e judiciais. Ele defende os métodos da direita, os métodos pelos quais a burguesia sempre combateu as organizações operárias e populares. É por isso que ele chega a posições tão direitistas quanto esta:
“Embora não haja muitos frutos a colher para o processo em razão da tornozeleira, seria um símbolo forte para o país de que ele não tem o direito de ir e vir como os demais brasileiros por ser suspeito de cometer o maior crime de todos contra o estado brasileiro”.
É importante explicar essa posição do colunista. A tornozeleira, como medida cautelar, só seria cabível, juridicamente, se trouxesse algum benefício para o processo, se impedisse o investigado, por exemplo, de atrapalhar as investigações. Solnik, no entanto, reconhece que o recurso à tornozeleira não traria “frutos” ao processo. Nesse sentido, a rigor, ela não seria necessária e cabível do ponto de vista. Mas Solnik ainda assim a defende, sob o argumento de que seria “símbolo forte para o país de que ele não tem o direito de ir e vir”. Ainda que não o diga com todas as palavras, Solnik defende conscientemente a via do abuso judicial, do ataque às liberdades democráticas, em nome do combate ao bolsonarismo.
O último parágrafo de sua coluna deixa isso ainda mais evidente. Ele diz:
“Tenho a impressão que Moraes quer tocar o processo dentro do mais estrito trâmite legal, dentro da mais estrita obediência ao conceito de presunção da inocência, para mostrar a Bolsonaro e ao país que só o regime democrático garante o direito de defesa a todos os cidadãos, mesmo àqueles que tentam destruí-lo.”
Solnik faz essa colocação para justificar as razões pelas quais Bolsonaro ainda não está preso ou com uma tornozeleira eletrônica. Solnik quer Bolsonaro preso aqui e agora; ou, pelo menos, em prisão domiciliar; ou, ainda, no mínimo, com o aparelho de monitoramento em seu tornozelo. Mas, caso o “mais estrito trâmite legal” seja seguido, então há de se concluir que as hipóteses legais para prisão ou qualquer medida cautelar contra Bolsonaro ainda não estão presentes. Solnik deixa de certa forma explícito que sua posição é a defesa de ilegalidades contra Bolsonaro.
A grande questão por detrás das colocações de Solnik é a forma pela qual se deve combater o bolsonarismo. Solnik e os setores majoritários da esquerda nacional aderiram aos métodos históricos que a direita sempre usou contra os trabalhadores e suas organizações. Perseguições judiciais, pedidos de prisão, operações policiais, censura, ataques ao devido processo legal ― esses seriam os meios para derrotar, no momento atual, Bolsonaro.
Não é por outro motivo que Alexandre de Moraes, tucano e participante do golpe de Estado de 2016, é tido, por Solnik e grupos próximos dele, como herói da luta contra Bolsonaro. Não é por outro motivo que Miguel Reale Jr., outro golpista e participante do golpe contra Dilma Rousseff e o PT, aparece agora como portador de “boas ideias”.
As eleições municipais deste ano já demonstraram: tais métodos de enfrentamento contra Bolsonaro se mostraram um tremendo fracasso. O bolsonarismo foi, sem dúvida, o principal vencedor do pleito municipal.
Além de ineficientes, os métodos que Solnik defende são extremamente perigosos para a esquerda, para a classe operária, seus partidos e organizações. O acúmulo de arbitrariedades judiciais, apoiadas por essa esquerda, vai remodelando o regime político brasileiro no sentido de uma verdadeira ditadura. Uma ditadura que, fatalmente, recairá sobre a cabeça da própria esquerda de conjunto.
Para Solnik, a esquerda deve ficar a reboque da política da direita tradicional, capitaneada, entre outros, por figuras como Alexandre de Moraes e Miguel Reale Jr. É, ao fim e ao cabo, o caminho da derrota; é o caminho do fortalecimento do bolsonarismo e da desmoralização da esquerda.