Caso Silvio Almeida

A presunção de inocência só vale para quem tem uma boa ficha?

Jornalista faz da ficha corrida de ex-ministro o critério para determinar a sua inocência

Nas últimas semanas, fomos inundados por declarações direitistas dentro da esquerda pequeno-burguesa após as acusações de assédio sexual envolvendo o ex-ministro Silvio Almeida se tornar conhecido da população. Isso porque boa parte da esquerda que antes idolatrava Silvio Almeida por sua carreira universitária sendo um homem negro, agora, atira pedras e se esquece da bajulação anterior com base em boatos e denuncias não comprovadas.

O clima de completa loucura que tomou a esquerda por conta do identitarismo, no entanto, não atingiu a todas as pessoas. É assim que vemos a coluna publicada por Eduardo Guimarães no sítio 247 no dia 13 de setembro, intitulada “Silvio Almeida, vilão ou herói?”. Isso porque Guimarães defende que o agora ex-ministro dos Direitos Humanos tenha o direito de presunção de inocência, previsto na Constituição do Brasil, artigo 5°, inciso LVII.

Eduardo Guimarães, porém, peca ao defender que Silvio Almeida tenha o direito previsto na Constituição por ser bom moço. Não entraremos aqui no caso de que os elogios ao ex-ministro são exagerados e sem base na política real, o qualificando como sendo uma personalidade de esquerda sem que haja real mérito para isso. No entanto, é preciso que fique claro que não são as supostas qualidades de Silvio Almeida que o fazem ter o direito à presunção de inocência, mas sim, todas as pessoas, tenham elas cometido crimes anteriormente ou não, tendo uma ideologia de esquerda ou direita, devem ter o direito inalienável à presunção de inocência. (Caso o leitor deseje saber a posição do PCO sobre o ex-ministro, clique neste link)

Em seu texto, Eduardo começa por apontar as origens e a família de Silvio Almeida, filho do ex-goleiro do Corinthians, Lourival, e casado com Ednéia Carvalho, além de ser pai recente de uma menina. Após isso, o artigo segue com o ponto central aqui discutido, o direito da presunção de inocência para pessoas com um bom histórico, como observamos a seguir:

“Dirão que nada importa — a história, a vida pessoal, a superação, as lutas renhidas que todos sabemos que os negros travam para ascender em qualquer atividade que não aquelas às quais são relegados em razão do talento natural dos afrodescendentes para a arte e os esportes, nos quais, em geral, são quase insuperáveis.

Discordo, porém, de que não importa: esses são detalhes vitais para discutir Almeida. Não para absolvê-lo por eventuais crimes, mas para entendermos que, enquanto a culpa não for provada, esse talento, essa força, essa luta épica que travou para se projetar como se projetou na defesa dos direitos humanos geram uma questão de fundo.”

Em seguida, o texto traz uma reflexão sobre o suposto crime cometido, o qual o autor acredita que, caso seja comprovado, deva ser punido com o maior rigor da lei e, na sequência, o texto dá mais detalhes da vida de Silvio Almeida, destacando seu papel como professor universitário.

“Advogado desde 2000, empreendeu atuação destacada no direito empresarial, econômico e tributário e na defesa dos direitos humanos.

Entre 2005 a 2019, lecionou filosofia do direito e introdução do estudo do direito na Universidade São Judas Tadeu.

É professor da graduação em direito e da pós-graduação stricto sensu em direito político e econômico na Universidade Presbiteriana Mackenzie; e professor da Escola de Administração de Empresas e da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, ambas em São Paulo.

Em 2020, foi professor visitante na Universidade Duke, onde lecionou nos cursos “Raça e Direito na América Latina” e “Black Lives Matter: Brasil e Estados Unidos”, este último em parceria com o professor John D. French.

Em 2022, foi selecionado como professor visitante da cadeira Edward Larocque Tinker da Universidade de Columbia na cidade de Nova Iorque, destinada a intelectuais de prestígio da América Latina — vaga foi ocupada em anos anteriores por intelectuais como o economista Raúl Prebisch, o geógrafo Milton Santos, o jornalista Elio Gaspari, o jurista Roberto Gargarella e a historiadora Lilia Schwarcz, dentre outros. E na mesma instituição ministrou o curso “Raça, Direito e Cultura na América Latina”.

Foi entrevistado pelo programa Roda Viva da TV Cultura em junho de 2020. A participação de Silvio Almeida no programa inspirou um “clube do livro” para jovens negros e carentes nas redes sociais.

Foi presidente do Instituto Luiz Gama, organização de direitos humanos voltada à defesa jurídica de minorias e causas populares. Atuou na formação da “Frente Pró-cotas” para negros nas universidades e foi um dos formuladores das políticas de ação afirmativa que vieram a ser implementadas no Estado de São Paulo — que, sob o PSDB, sempre resistiu às cotas “raciais”.

Em 2021 foi o relator da Comissão de Juristas instituído pela Câmara dos Deputados para a apresentação de propostas legislativas para o combate ao racismo institucional.

Em 2020 tornou-se colunista de política da Folha de S.Paulo, atuação que foi interrompida por conta de sua nomeação como um dos coordenadores da equipe de transição do presidente eleito Lula.

Depois disso, o texto passa a defender que seu histórico não o absolve de seus supostos crimes, mas desde que os crimes sejam realmente comprovados.

Fica, no entanto, a seguinte questão: é justo atribuir um direito que deveria ser de todos para um grupo seleto de pessoas por conta de seu currículo? Caso Silvio Almeida não fosse ex-ministro dos direitos humanos, não fosse escritor, não fosse professor universitário e não tivesse a ficha limpa antes das acusações, deveríamos condená-lo de antemão?

A resposta à pergunta acima demonstra o completo caos ideológico que permeia a esquerda na atual etapa da luta política no Brasil. O identitarismo conseguiu colocar a esquerda contra a parede de uma tal maneira que, hoje, sem perceber, a esquerda acaba por defender a antiga política da extrema direita brasileira de “direitos humanos para humanos direitos”, que condena de antemão toda a população que sofre nas mãos da polícia e do judiciário no país.

Não é admissível no meio da esquerda a política de meias medidas que inocenta somente aqueles com um comprovado histórico no meio da esquerda e faz vista grossa para o resto da população, ainda que essa parcela tenha posturas não louváveis e até desprezíveis, como são os posicionamentos da extrema direita, assim como não é admissível a política de condenação de todas as pessoas que passam pelas mãos do judiciário, a mesma que utiliza a direita quando diz “se não tivesse feito nada, não seria preso”.

“Ahh, mas se todos tiverem a presunção de inocência, passaremos pano para a extrema direita fascista, que é machista, homofóbica, racista, transfóbica e etc.”. Mais uma vez a política de direita do “tá defendendo bandido” de maneira disfarçada.

Imaginemos o seguinte: um homem branco, hétero, racista e com passagem pela polícia é acusado de estupro. Deveríamos acreditar fielmente na acusação, mesmo que não haja provas e nem mesmo um inquérito tenha sido aberto, e colocar o homem na cadeia, tirar seu emprego etc.? Devemos acreditar fielmente na Polícia Militar e no judiciário brasileiro, duas entidades conhecidas por crimes contra a população e que não são nem um pouco inocentes no que diz respeito a colocar a população pobre, principalmente negra, na cadeia? Ou devemos dar ao cidadão, seja ele quem for, o direito à presunção de inocência assim como Silvio Almeida?

A resposta é simples: devemos garantir o direito do homem no exemplo acima, assim como a esquerda sempre fez e defendeu como sendo o modelo de um estado democrático de direito.

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