Em 1917 a Irlanda já era uma colônia inglesa há séculos. Neste mesmo ano, os banqueiros ingleses declararam apoio ao projeto sionista de colonização da Palestina pela Declaração de Balfour. Os ingleses, com o conhecimento adquirido na colonização irlandesa, utilizaram da mesma tática para colonizar a Palestina.
Em 1801 os reinos da Irlanda e da Grã-Bretanha – antes uma união pessoal, ou seja, dominados pelo mesmo rei, ainda que independentes – foram unificados no Reino da Grã-Bretanha e Irlanda. Desde antes disso os ingleses passaram a migrar para o território irlandês, principalmente para a provincia do norte, a Ulster. Favoráveis a dominação inglesa, essa população da Ulster foi utilizada desde o século XVII para colonizar as terras irlandesas através de um sistema chamado Plantation dos Ulster, em que terras irlandesas eram entregues ao Ulster em troca da sua lealdade aos colonizadores ingleses.
Em 1916 ocorre o grande levante irlandês contra a colonização inglesa, o Levante da Páscoa. Apesar de reprimido e fracassado, ele dá o pontapé para o movimento de independência irlandês. A Guerra de Independência da Irlanda durou de 1919 até 1921, culminando na independência da Irlanda, com exceção justamente da Ulster. Durante o conflito, os ingleses usaram uma força paramilitar chamada “Black and Tans” – devido ao seu uniforme caqui e preto. Os “Black and Tans” era composta de ex-soldados britânicos que lutaram na Primeira Guerra Mundial, o batalhão ficou famoso pela sua brutalidade contra os irlandeses. O episódio mais famoso foi o Massacre do Parque Croke, em que o grupo abriu fogo indiscriminadamente contra uma multidão durante uma partida de futebol, matando 14 pessoas.
A colonização britânica da Palestina
Paralelamente, em 1917, os ingleses iniciavam seu projeto de colonização da Palestina. Já nos últimos anos da Primeira Guerra Mundial, os ingleses colaboravam com os sionistas para dominar a Palestina e ocupar o território de influência do Império Turco Otomano. Empregando o mesmo método utilizado na Irlanda, os ingleses apoiaram a ocupação da Palestina pelos sionistas europeus.
Neste mesmo ano, o secretário de relações exteriores da Grã-Bretanha, Arthur James Balfour, escreveu a Declaração de Balfour. Esta carta dava o aval e total apoio do império britânico para a ocupação sionista na Palestina, marcando o início da colonização da Palestina. O documento declarava que o “governo de sua majestade vê com bons olhos o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu, e farão seus melhores esforços para facilitar o alcance deste objetivo”.
Segundo Ronald Storrs, governador britânico de Jerusalém entre 1917 e 1926, o objetivo da Declaração Balfour era formar um “pequeno Ulster judeu leal em um mar de arabismo potencialmente hostil”. De acordo com Storrs, este seria “o primeiro governador militar da Palestina desde Pôncio Pilatos”.
Não apenas os métodos de colonização da Palestina e da Irlanda foram os mesmos, mas as figuras atuantes também. O próprio Balfour também atuou na colonização e repressão da Irlanda, sendo responsável pelo assassinato de manifestantes contra a reforma agrária, cunhando-o o apelido de Balfour Sangrento.
Herbert Samuel, secretário do Interior em 1916, foi responsável pela prisão de 2.000 pessoas durante o Levante da Páscoa. Samuel tornou-se o primeiro alto comissário da Palestina quando a Grã-Bretanha assumiu a administração do país. Em 1921, Samuel ordenou um bombardeio aéreo na Palestina para combater o levante contra a ocupação.
Nesta época Winston Churchill era secretário colonial e defendeu a criação de uma “força selecionada de gendarmaria [força de repressão de civis e militares] branca” para a Palestina, segundo os registros oficiais. Churchill defendia que esta fosse composta por combatentes que serviram a coroa inglesa na Guerra de Independência da Irlanda.
A partir deste plano, Henry Hugh Tudor, comandante dos Auxiliares na Irlanda, disponibilizou 800 soldados ingleses, os quais haviam ocupado a Irlanda, para a Palestina. Ao lado dos homens de Tudor, Churchill alocou os “Black and Tans”. Ambos despachados para a Palestina quando sua presença não foi mais necessária para a opressão irlandesa. A combinação destas forças de Churchill deram origem, segundo documentos oficiais do exército inglês, a “uma eficiência militar, combinada com uma certa crueldade”.
Outra figura marcante na colonização palestina e na opressão da Irlanda foi Raymond Cafferata, o qual fez parte dos Auxiliares durante a Guerra da Independência da Irlanda. Na Palestina, Cafferata liderou a repressão de uma manifestação palestina em Jafa, principal cidade do país, hoje chamada de Telavive. A violência extrema utilizada pelo inglês, causando a morte de diversos de palestinos, foi elogiada pela administração britânica em Jerusalém como “magnificamente executada”.
Douglas Duff, oficial da marinha britânica, havia trabalhado com os “Black and Tans” na Irlanda antes de se mudar para a Palestina. Em suas memórias traz a visão inglesa sobre o povo palestino, referindo-se aos palestinos de Haifa, escreveu: “A maioria de nós estava tão infectada pelo senso de nossa própria superioridade sobre essas ‘raças inferiores’ que mal considerávamos essas pessoas como seres humanos”.
Durante uma Revolução Palestina na década de 1930, os comandantes militares da Inglaterra receberam aval para utilizar “todas as medidas necessárias” contra os palestinos. A brutalidade dos ingleses resultou na demolição de grande parte da cidade velha de Jafa, a imposição de punição coletiva em vilarejos com rebeldes em seu meio e a detenção em massa em campos de trabalho.
A Inglaterra empregou, tanto na Palestina quanto na Irlanda, o mesmo método de opressão. A colonização por meio de um povo externo a região e a opressão sistemática da população local. Não à toa que nas duas localidades encontramos os mesmos atores, com os mesmos discursos. As plantations de Ulster na Irlanda e os assentamentos sionistas na Palestina são espelhos do método de ocupação e violência fascista dos ingleses.